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Mais uma da fábrica de mentiras da apologética católica: Henrique VIII era protestante?


Decidi tirar essas semanas apenas para desmascarar as fraudes da apologética católica no campo histórico, já que no campo bíblico chega a ser covardia e até já perdeu a graça. Mas são tantas mentiras grosseiras pra desmascarar, que sinto que meu objetivo só irá se consumar em anos ou décadas – se tiver sorte. Estive relendo o que os principais sites de apologética católica escreveram sobre a Reforma e, com o conhecimento histórico mais profundo que tenho hoje em relação ao que tinha antes, me assustei de verdade com a quantidade gigantesca e assombrosa de mitos, mentiras e distorções grotescas dos mais variados tipos. O nível da coisa é simplesmente surreal. E olha que para alguém que lida com catolicismo há tantos anos como eu, e ainda me assustar com alguma coisa neste meio, é porque a coisa é feia mesmo.

Teve gente enaltecendo comunistas, transformando monstros psicopatas em heróis, atribuindo aos protestantes crimes católicos como o já mostrado Saque de Roma, inventando “genocídios protestantes” que nunca existiram e, é claro, caluniando Lutero (que novidade). Mas aqui eu não vou refutar tudo, o que exigiria um trabalho monstruoso de milhares de páginas para lidar com tantos embustes de forma adequada. Escolhi para este artigo começar com o mito de que o rei Henrique VIII era um protestante malvadão que fez uso de uma “Inquisição protestante” (sic) na Inglaterra. É um dos episódios mais usados pelos papistas junto com a Guerra dos Camponeses e o Saque de Roma para afirmarem a existência de uma terrível “Inquisição protestante”, totalmente ausente nos escritos de qualquer historiador que já pisou neste planeta, mas onipresente nos blogs de apologética católica.

Aliás, abrindo um parêntesis, se pesquisarmos sobre a “Inquisição protestante” no Google, o resultado será esse:


É isso mesmo: nenhum historiador, nenhuma fonte acadêmica, nenhum livro de história, nenhum julgamento imparcial, nenhuma fonte primária, nada. Apenas blogs ridículos e tendenciosos de apologética católica, que fazem a única coisa que se propõem a fazer e que justifica a sua existência: mentir. Eu não printei todos os resultados por razões óbvias de limitações de espaço, mas se fosse até a página 1000, iria dar 1000 páginas de apologética católica. Um deles até tentou fazer uma gracinha citando um historiador protestante, mas desgraçadamente este mesmo historiador nunca falou de Inquisição protestante nem no trecho citado por ele (para verem a que nível a coisa chegou).

Agora vamos ao Google Acadêmico e vejamos a diferença:


Não preciso nem comentar nada. Quase todas as referências são para falar da perseguição que os protestantes sofreram pela Inquisição católica (ou seja, a que existiu), e o outro usa Inquisição assumidamente como um simbolismo para falar dos neopentecostais. Ou seja, os apologistas católicos são tão fracos e ruins que não conseguem nem mesmo fazer um único trabalho acadêmico, talvez porque nunca foram formados em porcaria nenhuma e apenas copiam tranqueira de outros blogs católicos citando fontes que nunca leram. Estes mesmos blogs católicos disseminaram o mito de que Henrique VIII era protestante, atribuindo seus crimes ao protestantismo. Inacreditavelmente TODOS os sites católicos que eu pesquisei propagaram essa mentira, sem exceção. Vamos um por um:

1) Associação “Cultural” Montfort, que diz que Henrique VIII “se aliou aos protestantes”:



2) “Astronautas Católicos”, que colocam os crimes de Henrique VIII na lista da “Inquisição protestante” do artigo deles:



3) Cris Macabesta, que assegura que Henrique VIII iniciou uma “perseguição protestante contra os católicos”:



4) Veritatis (Mentiratis), que alega que Henrique VIII encabeçou a Reforma Protestante na Inglaterra:



5) Fakenando Nascimento, que diz que Henrique VIII “abraçou os princípios da Reforma”, e mais assustadoramente ainda, que obrigou os católicos a assistirem os cultos protestantes!



Como vemos, essa não é uma mentira presente em um ou outro blog aleatório de fundo de quintal por apologistas amadores e inexperientes, mas uma mentira disseminada por TODOS ELES, até nos mais visitados e usados como fonte pelos debatedores católicos que se escondem corajosamente atrás de um computador. Talvez porque, de fato, não haja um único que não seja amador e inexperiente mesmo.

Neste artigo eu irei usar como fontes aqui a “História Universal” do historiador católico italiano Cesare Cantú, um dos maiores historiadores do século XIX, que escreveu dezenas de volumes de História Universal, cada qual com mais de quatrocentas páginas (e nem uma única delas lida por qualquer apologista católico). E também a melhor obra já produzida sobre a “História da Inglaterra”, por André Maurois, reconhecido e consagrado historiador francês do século passado. Portanto, o suficiente para que nenhum palhaço me apareça dizendo que isso é “deturpação protestante” ou mera “opinião pessoal” minha. Eu poderia usar ainda outras dezenas de livros de história reconhecidos, mas isso estenderia por demasiado este artigo, razão pela qual selecionei estes dois mais conceituados.

As referências são as seguintes (para daqui em diante eu citar apenas as páginas de cada livro):

MAUROIS, André. História da Inglaterra. Rio de Janeiro: Pongetti, 1959.

CANTÚ, Cesare. História Universal – Vigésimo Segundo Volume. São Paulo: Editora das Américas, 1954.

Henrique VIII, como os sites católicos ressaltam, foi reconhecido pelo papa como “defensor da fé”, pelos seus ataques a Lutero. O que os católicos esquecem de mencionar é que mesmo depois de sua separação com Roma ele queria continuar sendo o “defensor da fé” (católica), mas de um catolicismo-nacional (desvinculado de Roma), que não tinha nada de protestante. Assim escreve Maurois:

“Henrique pretendia continuar a ser o defensor da fé e o chefe de uma Igreja ‘católica’, queria-a, porém, católica nacional (o que parecia contraditório). Por isso, depois de ter perseguido os fieis da antiga fé, perseguiu não menos vigorosamente os protestantes. O impressor da primeira Bíblia inglesa, Tyndale, foi queimado; outros sofreram a mesma sorte por terem negado a transubstanciação. Depois de vários ensaios para definir uma religião anglicana, Henrique VIII fez votar pela Câmara dos Lords um Estatuto de seis artigos, a que se chamou também ‘Bill sanguinário’ ou ‘chicote de seis pontas’, ato que afirmava a transubstanciação, a inutilidade da comunhão sob as duas espécies, a validade dos votos de castidade, a excelência do celibato clerical, e que aprovava a confissão e as missas privadas. Toda violação flagrante desse estatuto devia ser punida com a fogueira, não podendo sequer a abjuração salvar o culpado. Os bispos protestantes, como Latimer, tiveram de dar a sua demissão. Cranmer que, desde antes da Reforma, se tinha casado secretamente e tinha sempre transportado consigo a mulher, numa mala perfurada, foi forçado a manda-la para a Alemanha”(p. 199)

Como vemos, a doutrina de Henrique VIII era inteiramente católica. Essa era a “Igreja da Inglaterra” dessa época – uma Igreja Católica, mas um catolicismo nacional em vez de um catolicismo vinculado ao papa romano, uma vez que eles já haviam rompido a comunhão após o divórcio do rei (questão essa que tratei mais adequadamente neste artigo). Em outras palavras, o que o rei Henrique fez foi deixar de reconhecer o papa como chefe supremo da Igreja, mas as doutrinas católicas permaneceram exatamente as mesmas de antes e não tinham nada de protestantes. Essa é a razão pela qual ele tanto perseguia protestantes:

“Henrique VIII mandou assassinar, por seus juízes, protestantes, católicos, a velha condessa de Salisbury; até Cranmer pôde julgar-se em perigo” (p. 200)

Em suas palavras, Henrique VIII adotava um «catolicismo-nacional», em vez de um protestantismo:

“Ora, se é verdade que a maioria da nação conservava a nostalgia das velhas cerimônias e anelava um regresso ao nacional-catolicismo do rei Henrique, essa mesma maioria guardava ódio a Roma” (p. 206)

Cantú também afirma:

“Henrique VIII combateu Lutero, perseguiu seus sectários e queimou os tradutores da Bíblia” (p. 120)

Essa citação é por demais esclarecedora:

“Henrique VIII pretendeu ao título de defensor da fé e queimou os luteranos e os católicos, os primeiros porque eram hereges, e os outros porque negavam a sua supremacia” (p. 120)

Note que o rei Henrique não perseguiu os católicos por ser “protestante”, como afirmam os apologistas mentirosos, mas sim porque negavam a sua supremacia acima do papa. Tanto a sua doutrina continuava católica que ele queimava luteranos por heresia da mesma forma que se fazia nos demais países católicos.

Estes eram os artigos de fé da Igreja da Inglaterra nos tempos de Henrique VIII. Leia e veja se encontra alguma doutrina protestante anticatólica, ou se parece mais com catolicismo romano:

“Henrique VIII, afinal, promulgou seis artigos de fé em que eram aceitas as Santas Escrituras, o símbolo dos apóstolos, com os de Niceia e de Santo Atanásio, o batismo, a penitência, a eucaristia, a presença real, a necessidade das boas obras, a invocação dos santos, as imagens, os hábitos pontificais, as cerimônias das cinzas, dos ramos, da sexta-feira da paixão, as orações pelos defuntos. Cromwell, seu vigário geral, ordenou que esses artigos fossem lidos sem comentários em todas as igrejas, e o clero obedeceu; era crime de Estado recusar-se a isso” (p. 121-122)

Seu catolicismo era tão forte e ferrenho que até a doutrina de “não haver salvação fora da Igreja Católica” permanecia de pé, mudando-se apenas quem detinha a supremacia na Igreja (ou seja, ele mesmo em vez do papa):

“Cromwell mandou depois publicar Divina e piedosa instituição do Cristão, destinada ao uso do povo, em que ele declarava que não havia salvação fora da Igreja Católica, negava a supremacia do papa, e impunha a do rei” (p. 122)

Até a rotineira perseguição à Bíblia presente nos países católicos continuou na Inglaterra de Henrique VIII (ao contrário dos protestantes, que faziam questão de traduzir a Bíblia na língua do povo para que este tivesse acesso às verdades bíblicas), o qual queimava quem discordava da transubstanciação:

“Henrique VIII mandou rever a tradução da Bíblia, e proibiu a qualquer outro que não fossem os chefes de família de a abrirem, sob pena de um mês de prisão. Além disso, entrou a discutir em pessoa com os reformados, e sustentou numa discussão de cinco homens a presença real, contra Lambert Simmel; como último argumento, ele lhe deu a escolher entre crer e morrer, e o fez expirar a fogo lento” (p. 122)

Até Cromwell, um braço-direito do rei, quando se tornou alvo da aversão deste, foi executado a pretexto do “crime de luteranismo”:

“O rei afinal tomou-lhe também aversão como o fator deste casamento; intentou-se-lhe portanto ação por causa de luteranismo, e tendo sido condenado, mediante o bil de convicção que ele tinha intentado, foi mandado matar sem inspirar dó a ninguém” (p. 124)

E uma de suas esposas quase foi morta pelo mesmo motivo:

“Henrique VIII tomou então por mulher Catarina Parr (1543), que, tendo sido reconhecida luterana, escapou a custo ao suplício” (p. 125)

E o próprio sujeito que introduziu o luteranismo no país, foi morto:

“Patrício Hamilton introduziu no país o luteranismo, e veio a ser, com muitos outros, um dos mártires da nova religião” (p. 126)

Chega a ser assustador ver os apologistas católicos como Fakenando Nascimento alegando que Henrique VIII “obrigava os católicos a assistir os cultos protestantes”, quando ele perseguia e matava os protestantes sem permitir que eles próprios assistissem seus cultos! Quer dizer: na lógica desse animal, o mesmo rei que não permitia os protestantes de assistirem os seus próprios cultos (senão os matava), obrigava os católicos a assistir os cultos protestantes. É realmente assustador. Eles literalmente não têm mais para onde descer em escala moral.

Para resumir toda a história: foi só no reinado de Eduardo que a Igreja da Inglaterra se tornou de fato protestante. O problema é que esse Eduardo começou a reinar com 9 anos e morreu com 11, e quem o sucedeu foi nada a menos que Maria a Sanguinária, a psicopata católica adorada em certos círculos apologéticos, que restaurou o catolicismo romano como a religião oficial da Inglaterra, inclusive com a submissão ao papa. Nessa ocasião, o próprio papa enviou seu legado para receber de volta a submissão dos ingleses, como escreve Maurois:

“O papa, sondado, anunciou que enviaria o Cardial Pole como seu legado, para receber a submissão dos ingleses. As barras de ferro, depositadas na Torre pelos espanhois ajudaram a preparar as almas das famílias nobres para esse grande evento (...) O Parlamento reuniu-se em Whitehall a fim de receber o legado. Ali, com um grande discurso, recordou o Cardial a história do cisma e prometeu absolvição plenária para o passado. As duas Câmaras receberam de joelhos essa absolvição. A Inglaterra estava purificada” (p. 208)

Foi só no reinado de sua sucessora, a rainha Isabel, que o protestantismo veio a se consolidar de fato, ocasião na qual os famosos 39 artigos da Igreja Anglicana foram elaborados. E sim, também inventaram um monte de mitos e distorções em torno dela, mas isso será assunto para um próximo artigo.


Conclusão

Claramente, Henrique VIII defendia todas as doutrinas católicas tal como qualquer outro católico, com a única diferença de não reconhecer o papa como o chefe supremo da Igreja. Ele nunca foi um “reformador”, apenas tinha uma inimizade pessoal com o papa por este não ter aceitado o seu divórcio e, por isso, ganhado um ódio ao papado – mas não ao catolicismo em si. Ele queria fazer da Inglaterra um catolicismo sem papa, ou melhor, com um papa: ele mesmo. Suas doutrinas católicas típicas, seu ódio ao protestantismo, seu empenho em favor de queimar “hereges” protestantes, nunca mudou. Só os protestantes eram queimados como hereges; os católicos não eram queimados por heresia mas sim como traidores do rei, por não o reconhecerem como o chefe supremo.

A mente de Henrique VIII, sua igreja, seu credo, seus artigos de fé, seguiam sendo ferrenhamente católicos. Sua “nova religião”, se é que pode ser assim chamada, era um catolicismo separado de Roma, tal como os veterocatólicos e os sedevacantistas de hoje, e nunca um protestantismo. Não houve qualquer “perseguição protestante” no reinado deste rei, e muito menos uma “Inquisição protestante”. Talvez os apologistas católicos não vão aceitar que se coloque Henrique VIII e sua igreja recém separada de Roma no rol de católicos legítimos, já que muitos deles também não aceitam os veterocatólicos e sedevacantistas como católicos “de fato”, por não reconhecerem o papa ou sua autoridade suprema e infalível. Mesmo assim, isso ainda o deixaria muito, muito longe de ser um “protestante”. Ser protestante nunca consistiu em só “não reconhecer o papa” (se fosse assim, até muçulmanos, judeus e budistas seriam protestantes), mas principalmente em aderir às Cinco Solas, aos princípios mais primordiais da Reforma, nenhum dos quais Henrique defendia – na verdade, ele assassinava quem defendia essas coisas!

Portanto, imputar ao protestantismo os crimes desse rei católico e ferrenhamente antiprotestante não é apenas anti-histórico, mas uma aberração imoral e canalha. Só dissemina tal lenda quem não tem o menor compromisso com a verdade e nenhuma dignidade, o que não é de se surpreender vindo de apologistas católicos que comprovadamente só tem compromisso com o pai deles, o único que é chamado de «pai da mentira» na Bíblia: o diabo (Jo 8:44). E o mais impressionante de tudo é, repito, o fato de que tais mitos, mentiras e distorções grosseiras não estão presentes em um ou outro blog católico de forma isolada, mas em TODOS eles, inclusive (e principalmente) nos mais conhecidos. Há um verdadeiro compromisso pela mentira neste meio – mentiras essas que serão cada vez mais demolidas uma a uma, até não terem mais para onde correr.

P.S: eu já havia terminado o artigo por aqui, quando descobri mais uma pérola dantesca no artigo do Macabesta, tão divertida que de modo algum poderia ficar de fora, mostrando de forma clara como funciona a artimanha e a malandragem na apologética católica:


É, só faltaram lhe avisar que essa Maria era conhecida como "Maria, a Católica"  aquela mesma rainha sanguinária que o papa aprovou maravilhado. Mas quando lhes convém, ela deixa de ser "Maria, a Católica", e vira "a filha do PROTESTANTE rei Henrique VIII". Piada? Não. Apenas apologética católica. Como se houvesse diferença... 

Paz a todos vocês que estão em Cristo.

Por Cristo e por Seu Reino,
Lucas Banzoli (www.facebook.com/lucasbanzoli1)


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