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O homem que não mora aqui

Image credit: Ales aka Dust To Ashes

Aquele que deixou para trás a terra natal e foi se procurar em outras bandas saberá do que estou falando.

Sim, você experimentou o que queria, conheceu lugares e pessoas, aprendeu o que não aprenderia em casa ou com a professora Celestina, entendeu melhor o mundo. Cresceu um tanto.

Com tais acréscimos, você deveria se sentir uma pessoa mais completa, não é?

Não é. 
Se há alguma coisa que você jamais vai saborear é a sensação de completude.

Você vive onde escolheu viver, trabalha no que deseja, tem os amigos que elegeu. Mas o que fazer com as lacunas deixadas pela vida antes vivida, pelas coisas que antes fazia e pelos amigos de outros tempos?

Você sente Saudade, é verdade, mas saudade está incorporada à rotina - espécie de dor acostumada.

Dizem que a dor é ainda pior para quem fica.


Tudo permanece igual, a paisagem é a mesma, o café está na mesa, o rádio ainda sintoniza a Tupanci - ladrão por ladrão vote em Tufy Salomão.

Mas alguém está faltando. Ele Sempre Esteve aqui. Não mais está.


Como lidar com a saudade que os outros sentem? Como aplacar a dor se a dor está em outro lugar?

Você começa a perceber que nas últimas visitas à mãe, ela não chorou na despedida. Ela não se sente mais a sua ausência?

Ao contrário. Sente do mesmo jeitinho que sentiu naquele dia que você, quase um menino, disse que era chegada a hora de voar.

Uma mãe sem lágrimas não significa ausência de dor, você sabe. As lágrimas da mãe distante correm por um rio retraído, lá dentro dela, a alimentar uma amargura.

É por isso que, naquele abraço, você já nem tem o que enxugar.

Acontece com outros que o viram crescer. Neles a saudade tende a permanecer desperta, com aquele agravante - o dos olhos secos. Eles testemunharam as primeiros passos da criança, as aflições do adolescente e viram o homem partir.

E o que dizer da saudade esquecida? Da saudade dos mais novos que ficaram, daqueles que o conheceram adulto, uns dos tantos adultos que os cercavam?

São os que sofrem menos. Na memória deles, você vai se tornando uma imagem opaca, alguém que só existe de vez em quando. Aquele que mora longe. Que sempre esteve onde eles não estavam.

Você, por ilusão ou descuido, pensou que os laços se mantivessem por si mesmos. Costumava guardá-los no travesseiro, lugar para acalantos e aflições. Ou em algum lugar mágico do futuro - lá onde todos os amores se encontram para apagar separações.

Por isso laços e amores ainda insistem em aparecer no meio da noite, naquela hora insone em que as distâncias se expandem.

São implacáveis as distâncias. Sinuosas. São elas que pavimentam essa rodovia para o intenso tráfego de novidades, descobertas, saberes e algumas culpas.

Sim, você não é completo. Nunca será.

O homem que se move pelas lonjuras vai deixando pedaços de si mesmo pelo acostamento.

Já é tarde para recolhê-los. Seus pedaços misturaram-se à paisagem sob os passos rápidos do tempo. São poeira do passado, pairam sobre as solidões.

Não há remorso.

As pontes estão queimadas.

Sem mais retorno para o comboio das ausências.

No permanecer e no partir, é incompleta a vida. Incompleto, assombrado por meus amores, eu escolhi caminhar.




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