Quero pensar sobre mais um fio condutor de interpretação a se destacar no embate de Jesus com os mestres da Lei quanto a abordagem dos compromissos religiosos com Deus e de como eles precisam demostrar as verdadeiras intenções do fiel. De modo claro Jesus deixou transparecer que tratar da vida humana de modo individual e em sociedade a partir de apenas casuísmos jurídicos e espirituais, desconsiderando os valores em si, é incoerente.
Eu vou nomear isso de o princípio da intencionalidade.
No ocorrido citado em Mc 7 os fariseus mestres da lei argumentaram que, por terem consagrado o Corban ao Senhor, eles estariam assim desobrigados com outros aspectos legais, sociais e espirituais. Ou seja, nessa concepção, ao cumprirem o que julgavam ser o ponto principal da Lei os demais preceitos se tornaram dispensáveis.
A inversão de valores demonstrada pelos opositores de Jesus estava na aplicação das Leis a partir de apenas casuísmos e não na busca pelo princípio espiritual norteador do Mandamento.
E para não ficar apenas na citação de termo jurídico, veja como o dicionário define casuísmo: “argumento ou medida fundamentada em raciocínio enganador ou falso e baseada muitas vezes em casos concretos e não em princípios fortemente estabelecidos”.
Nessa prática farisaica a atenção se voltava para tratar de casos específicos – em geral exceções – e não levar em conta todo o princípio que fez gerar a Lei e que a rege. Fazendo assim, ficava demonstrado que a intenção não seria cumprir o que Deus determinou com sendo o bem, nem buscar um relacionamento sincero e construtivo com ele, mas tentar encontrar atalhos para burlar a própria lei e assim se ver livre para apenas deixar acontecer suas própria vontades e inclinações – e isso com uma cínica justificativa legal e espiritual.
Por isso estou chamando esse princípio de intencionalidade.
Ao trazer a discussão para o Corban, a questão a ser debatida passa de apenas um “estudo de caso” – por mais relevante que esse seja – mas que não reflete nem o padrão humano e nem muito menos o direcionamento divino, para as verdadeiras intenções. Assim, o que transparece ficar no foco é cuidar de picuinhas casuísticas para fugir das reais implicações da obediência a Deus e suas Leis.
O questionamento é direto: “Com que intenção vocês alegam estar querendo seguir as Palavras de Deus, para agradá-lo ou para disfarçar a intolerância, vontades e preconceitos próprios?”
‒ Este povo me honra com os lábios, mas o seu coração está longe de mim.
(em Mc 7:6 – Jesus citando o profeta Isaias em Is 29:13)
Pela lógica e argumento apresentados por Jesus, a intenção da fidelidade e observância da Lei de Deus tem que necessariamente refletir o princípio da intencionalidade que fez com que Deus estabelecesse seus preceitos e normas. E essa intenção divina sempre foi o bem de todos e de cada uma de suas criaturas e não atender a caprichos e de poucos que usurpam a autoridade para si.
E lembrando que Jesus foi certeiro em seu princípio da intencionalidade quando afirmou que a Lei – o sábado – foi estabelecido para servir o ser humano e não o contrário (conclusão apresentada em Mc 2:27).
Para o Mestre Jesus, a intenção do coração em reconhecer a vontade suprema de Deus e em seguir a sua Lei é realmente mais importante que apenas atentar e cumprir dispositivos legais e espirituais específicos.
Que o Senhor nos faça seguir suas Leis e Princípios para que nossa adoração também seja resultado de um coração que se volta na intenção do Altíssimo.
§ Leia toda a série de reflexões que escrevi sobre o tema do Corban – baseada na passagem de Mc 7.
+ Corban – JESUS E OS RELIGIOSOS – link
+ CORBAN E O PRINCÍPIO DA ABRANGÊNCIA – link
+ CORBAN E O PRINCÍPIO DA AUTORIDADE – link
+ CORBAN E O PRINCÍPIO DA COERÊNCIA – link
+ CORBAN E O PRINCÍPIO DA COMPAIXÃO – link
§ Se quiser ainda estudar mais sobre o termo Corban, eu fiz uma pequena análise exegética e ofereço no link:
+ CORBAN – SANCTUM DONUM DEI – link