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O problema de Alexandre Frota

Tags: frota
O problema de Frota não é o fato dele ter
construído sua carreira posando nu.
Na quarta-feira passada, o ministro interino da educação, Mendonça Filho, recebeu uma personalidade para lá de polêmica em seu gabinete: o ex-ator pornográfico, diretor, comediante, modelo e apresentador Alexandre Frota. A notícia causou um rebuliço nos blogs de esquerda e logo o passado dele — no qual consta participação em 20 filmes pornográficos e quatro ensaios para a finada revista de nu masculino G Magazine — veio à tona. Isso para mim é irrelevante e só reforça o quanto a esquerda nativa ainda é machista e precisa evoluir. O ator austro-americano Arnold Schwarzenegger também posou nu no início de sua carreira e isso não influenciou em sua eleição como 38° governador da Califórnia. O que o indivíduo faz com seu corpo, não é problema de ninguém além dele, a não ser que ele não prejudique outras pessoas. E é aí que reside o maior problema de Alexandre Frota.

Durante uma entrevista para o talk-show Agora é Tarde, exibida há pouco mais de um ano, Frota confessou ter estuprado uma mãe-de-santo. O apresentador do programa, Danilo Gentili — conhecido por suas piadas contra grupos socialmente marginalizados — em momento algum repreendeu o entrevistado. A plateia, por sua vez, riu do relato de Frota, que afirmou que a mãe-de-santo gritava para ele parar, mas que ele fez "tanta pressão na nuca dela que ela dormiu". Após a repercussão negativa da entrevista, Frota se defendeu dizendo que havia inventado a história, que era apenas uma "piada" que fazia parte do roteiro de seu show de stand-up. Quem é que ri de estupro? Não assisto Law & Order: SVU para rir. Justo pelo contrário, muitas vezes me emociono com as histórias das vítimas de estupro, embora elas sejam ficcionais. Sem falar que o relato de Frota representa o próprio estupro das religiões afro-brasileiras pela cultura branca.

O problema de Alexandre Frota não é ele ter sido um ator pornô entre 2004 e 2009. Isso não diz nada sobre o caráter de uma pessoa. Não estamos na Roma Antiga, onde os profissionais do sexo não eram cidadãos. A maioria deles deve até ser mais honesta do que nossos nobres deputados em Brasília. O problema de Frota é a petulância e o cinismo, tão característicos da direita brasileira. A petulância de narrar um estupro — mesmo que seja fictício, o que eu duvido — em rede nacional de televisão sem preocupação com a consequência de suas palavras num país onde uma mulher é estuprada a cada 10 minutos. A petulância de minimizar a importância dos crimes sexuais, tratados como piada. E o cinismo de, quando cobrado, responder "estava só brincado", frase esta tão característica da classe média brasileira quando colocada contra a parede por quem ela oprime. Como homem gay, sei bem disso. E aí é que reside o restante do cinismo de Frota.

O que será que Bolsonaro pensava de Frota nos anos 2000?
Quem cresceu como homossexual no final dos anos 1990 e início dos anos 2000 tinha na G Magazine uma grande referência. Nunca comprei a revista, mas sempre via os ensaios em sites especializados em vazar as imagens dos ensaios assim que a revista era lançada nas bancas. Existia — e ainda existe — um tabu muito grande em relação às revistas que publicam ensaios nu, como se ver uma mulher ou um homem pelado não fosse algo completamente natural. Comprar uma revista dessas é um atestado de homossexualidade e eu não iria arriscar revelar minha orientação sexual por causa da minha libido. Preferia esperar as imagens vazar online. (Para ler mais sobre a minha dificuldade em me assumir, clique aqui). Alexandre Frota era, ao lado de Mateus Carrieri, um dos modelos que eu mais gostava de ver, embora nos últimos ensaios ele já não estivesse mais tão bem quanto nos primeiros, devido ao abuso de esteroides. Era bonito, musculoso e bronzeado e, ao contrário dos demais ratos de academia, não via problema em ser desejado pelo público gay 

Em algum momento, no entanto, ele decidiu rechaçar esse passado que lhe deu muito dinheiro. Uma notícia da Folha Online de fevereiro de 2008 dá conta de que ele teria se convertido ao evangelicalismo e todos sabemos qual é a moral sexual das igrejas evangélicas e o que elas pensam sobre a homossexualidade. Agora regenerado, Frota é o típico macho brasileiro de classe média (embora sou inclinado a achar que ele nunca tenha deixado de ser e só fingia ser liberal devido ao pink money). Gaba-se de suas conquistas sexuais em público — "estupro" não é bem conquista, mas na mente de quem pensa como ele é — e odeia os homossexuais que lhe deram muito dinheiro e fizeram com que seus ensaios para a G Magazine estivessem entre os mais vendidos da história da revista. Não fosse a repercussão de seus ensaios e filmes pornográficos, já teria sido esquecido há muito tempo, como muitos atores que tiveram papéis secundários em novelas dos anos 1980. 

O problema de Alexandre Frota é querer ser aceito pelos mesmos que olhavam para ele com desprezo quando liam alguma notícia relacionada a um de seus ensaios. Como, por exemplo, o deputado federal Jair Bolsonaro (PSC-RJ), de quem espera ser companheiro de chapa na próxima eleição presidencial. Esse é um problema de muitos brasileiros pobres e de classe média: foram picados pela mosca azul e agora querem andar de braços dados com uma elite que os despreza. Não percebem que são apenas um peão no jogo de xadrez de quem é verdadeiramente rico e poderoso. Recordo-me, então, de Colby Keller, um dos maiores astros da indústria pornô dos Estados Unidos. Criado na Assembleia de Deus, descobriu o marxismo no curso de mestrado em belas artes que fez no Maryland Institute College of Art. Libertou-se das amarras sociais e ingressou na indústria pornográfica no mesmo ano que Frota. Sua popularidade é tão grande que participou de uma campanha da grife de Vivienne Westwood ao lado de modelos não-pornográficos.

Keller e as esculturas que fez de Lênin.
Keller, ao contrário de Frota, é consciente das contradições geradas pelo capitalismo e reconhece seu papel dentro desse sistema econômico. "Faço isso para sobreviver e não é um trabalho fácil. É um meio. Como marxista, essa é a minha força de trabalho", disse numa entrevista. "Não há como escapar do sistema", afirmou em outra. Reconhecer sua força de trabalho ou — em palavras cristãs — seu propósito nesse mundo é algo que todos nós precisamos fazer. Alexandre Frota, aos 52 anos de idade e já tendo tentado uma série de ocupações, parece ainda não saber qual é a sua. Entrou na crista da onda do conservadorismo político, adaptou-se a ele e espera ser essa sua verdadeira vocação. Como afirmei no início desse texto, ser um profissional do sexo não determina o caráter de ninguém. O problema de Frota é querer usar a fama advinda da pornografia para foder a sociedade, seja através de falas (como a "piada" do estupro) ou de ações (como a proposta que apresentou ao MEC).


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