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Tunda Mu Njila: Impeachment para dessacralização do Poder - Luzia Moniz


Acossada à esquerda e à direita por ter-se aliado ao MPLA na votação por mais regalias para os deputados (subsídios de instalação), a UNITA tirou da cartola uma bomba política: a proposta de destituição do Presidente João Lourenço.

O partido de Adalberto Costa Júnior afirma estar a defender o "Estado Democrático e de Direito, o resgate da soberania popular e o regular funcionamento das instituições por meio da efectiva separação de poderes e interdependência de funções do Estado".

Acusa o Presidente da República de ter transformado o País num "regime autoritário que atenta contra a paz e contra os direitos fundamentais dos angolanos", em que "não há pluralismo nem igualdade de oportunidades e de tratamento das diversas correntes de opinião política no espaço público".

Por outro lado, responsabiliza João Lourenço pela captura do Estado "por uma oligarquia" que tem promovido a destruição do sistema de educação e pelo "empobrecimento das maiorias", para além de "interferir, controlar, instrumentalizar e manipular os juízes dos Tribunais Superiores".

Quando a UNITA anuncia a sua intenção de apresentar o impeachment do Presidente da República, apesar do ineditismo da situação, o MPLA-Lourenço responde como, habitualmente, de forma truculenta de diabolização do seu adversário.

Esta reacção demonstra uma profunda incapacidade de análise por parte do Poder que, no mesmo dia, continuou e continua a praticar actos que, na opinião do "Galo Negro", podem levar à destituição do Presidente, nomeadamente em matéria de desigualdade de acesso aos media de capitais públicos.

Os órgãos de comunicação social tutelados pelo Executivo, cujas chefias são nomeadas pelo Presidente da República, ignoraram a proposta de impeachment, acabando por dar razão à UNITA e provando que "não há pluralismo nem igualdade de oportunidades e de tratamento das diversas correntes de opinião política no espaço público".

Sem qualquer decoro, no dia seguinte, os mesmos media deram destaque à reacção do MPLA-Lourenço, cujo Bureau Político, em comunicado, acusou o "Galo Negro" de pretender "tomar o poder fora do quadro institucional e formal".

O partido no Poder, ignorando que o pedido de destituição do Presidente está consagrado na Constituição, orientou o seu grupo parlamentar a travar o avanço dessa intenção da UNITA, tomando "todas as providências para que o Parlamento angolano não venha a ser instrumentalizado para a concretização de desígnios assentes numa clara agenda subversiva, imatura e de total irresponsabilidade política".

No seu Artigo 129.º, a lei magna angolana estipula "a violação da Constituição que atente gravemente contra: o Estado Democrático e de Direito, a segurança do Estado e o regular funcionamento das instituições" como situações passiveis de levar à destituição do Presidente da República.

Com o actual figurino constitucional e prática política do Poder angolano, o Presidente da República transformou-se numa entidade infalível, inquestionável e inescrutável, figura de quem não se pode duvidar nem ser posta em causa, uma espécie de divindade esculpida em mármore.

Por isso, a proposta de impeachment, que significa levar para dentro de uma instituição do Estado a discussão da rua sobre os fracassos da governação do Presidente e tirar daí consequências, equivale à profanação do único Poder político sacralizado no País.

Significa, também, mostrar ao Presidente como um político comum que comete erros, violações ou crimes que põem em causa a existência do Estado, tal como está definido pelas leis e normas nacionais. Um Presidente que, desta forma, legitima a patológica incompetência.

A referida iniciativa vem destapar as fragilidades de dirigentes sem retórica nem dimensão política, bem como a sua total incapacidade para "resolver os problemas do Povo". Por isso, a sacralização do Poder foi a fórmula encontrada para simularem uma força inteligente inexistente.

Neste contexto, um processo dessa natureza, certamente longo e desgastante e de consequências imprevisíveis que iria por a nu os defeitos, incapacidades e limitações políticas do titular do Poder executivo, significaria o desmoronamento dos poderes divinos do Presidente, ou seja, a dessacralização do Poder.

Sem essa intocabilidade, o Presidente e o seu partido, cujas estruturas são meras coreografias de sustentação do único Poder real, o Presidencial, ficariam despidos e muito vulneráveis, sujeitos a reprovação pública e oficial.

Assim, temendo o avanço inevitável do referido processo, o MPLA-Lourenço, de olhos vendados, aposta no vale tudo, para impedir que a proposta de destituição do Presidente vá a debate no Parlamento.

Esta inquietação do Poder mostra que, há 10 anos, quando, a pedido do MPLA, o Tribunal Constitucional considerou inconstitucionais as normas que permitiam à Assembleia Nacional fiscalizar o Governo, inquerindo e chamando ao Parlamento ministros e outros auxiliares presidenciais, a posição do partido no Poder foi destituída de reflexão séria.

Prova, igualmente, que as cabeças pensantes do Partido, que já foi marxista e que hoje se assume como social-democrata, ignoraram a hipótese de um dia perderem a maioria qualificada, bloqueadora do debate político e facilitadora de extremismos.

Impedidos de fiscalizar o Executivo, por determinação do tristemente célebre acórdão do TC 319, de Outubro de 2013, os deputados da UNITA, com esta acção, recorrem ao único expediente que a Constituição lhes oferece para suscitar o debate sobre a governação do País e o Estado da Nação.

E assim retiram ao Presidente da República a exclusividade de anualmente, em Outubro, debitar no Parlamento o seu Estado da Nação sem ser confrontado com inverdades dos dados que apresenta.

Igualmente, fragilizam um Poder sem cultura nem capacidade políticas para o confronto e o contraditório, como ficou nítido nas últimas eleições.

A UNITA e outros meios políticos nacionais sabem que a proposta em causa dificilmente levaria à destituição do Presidente que, para tal, necessitaria que dois terços dos deputados em efectividade de funções votassem a favor da perda do mandato presidencial.

Com medo da votação secreta, o MPLA-Lourenço quer precaver-se da eventualidade de 51 a 57 dos seus deputados votarem em sintonia com a oposição para viabilizar a destituição do seu líder.

Quer também evitar que essa hipotética votação contrária à disciplina de voto, mesmo que de meia dúzia, desvende as fissuras internas, deixando cair o mito da união e coesão partidárias, contribuindo, assim, para o agudizar da crise interna, pondo em causa a sobrevivência do próprio regime.

Na actual crise económico-financeira e social, sem solução à vista, se a liderança do Parlamento aceitasse debater a proposta de destituição de João Lourenço, a UNITA poderia transformar esse preceito constitucional num ritual anual de confrontação do Presidente até ao final da legislatura.

Com essa perspectiva, o MPLA-Lourenço orienta os seus deputados, incluindo a presidente da Assembleia Nacional, membro do seu Bureau Político, para que façam de tudo legal ou ilegalmente para "cortar o mal pela raiz" e impedir que a decisão de confrontar o Presidente com os seus fracassos se torne uma prática comum.

E só pode fazer isso porque, apesar de enfrentar os mais baixos índices de popularidade e uma diminuta capacidade para chantagear politicamente as populações que vivem num nível de miséria abjecta, o partido no Poder continua a controlar todas as instituições do Estado, incluindo os tribunais superiores, dirigidos por seus membros.

O anúncio bombástico da UNITA, para além de determinar a agenda política e a bolha mediática sobre Angola, internamente e no estrangeiro, tem o condão de pôr a sociedade a discutir os fracassos da actual governação, assim como as dificuldades do País em acabar com um regime autocrático, por via de preceitos legais.

Coloca o partido no poder perante os seus medos e entala os críticos internos de João Lourenço que crescem como cogumelos, apesar de ainda actuarem de forma individual.

A jogada aperta Bornito de Sousa, anterior Vice-Presidente da República, Higino Carneiro, proto-candidato à liderança do MPLA, Dino Matross e Boavida Neto, antigos secretários-gerais e outros dirigentes do partido que têm defendido publicamente uma mudança do rumo político.

Vão os críticos do MPLA-Lourenço, partido em que a cobardia e o medo têm estatuto institucional, juntar as suas vozes às dos quase 700 membros do Comité Central, uma espécie de bibelôs, e ajudar a prolongar artificialmente a vida política do Presidente? NJ


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