Um novo estudo do Fred Hutchinson Cancer Center estima que quase 2 milhões de mortes em excesso ocorreram na China nos dois meses após o país suspender suas rígidas políticas de zero-COVID em dezembro de 2022. Os resultados sugerem que o número real de mortes por COVID-19 após a reabertura foi muito maior do que o relatado anteriormente pelas autoridades chinesas.

O estudo, publicado no JAMA Network Open, analisou dados de mecanismos de busca, obituários e crematórios na China. Os pesquisadores estimam que houve 1,87 milhão de mortes em excesso na população adulta durante dezembro de 2022 e janeiro de 2023, logo depois que as restrições da política de zero-COVID foram suspensas.

Anteriormente, o governo chinês havia informado cerca de 60 mil mortes por COVID-19 após o fim das medidas restritivas. No entanto, imagens de satélite e o aumento da procura por serviços funerários e termos como "cremação" na internet chinesa indicam que o número real de mortes foi muito maior.

A China manteve uma rígida política de zero-COVID entre 2020 e 2022, com lockdowns extensos, testagem em massa e outras medidas. Isso manteve os casos e mortes baixos, mas também impediu que a população desenvolvesse imunidade natural ao vírus.

Quando as restrições foram suspensas repentinamente, o vírus se espalhou numa população majoritariamente suscetível, provocando um grande surto. Como muitos idosos não estavam totalmente vacinados, foram os mais afetados.

De acordo com o pesquisador Joseph Unger, a introdução súbita da COVID-19 numa população sem imunidade teve um impacto devastador. Os dados de excesso de mortalidade corroboram essa avaliação e contradizem a narrativa oficial chinesa de uma transição suave após o fim da política de zero-COVID.

Especialistas em saúde pública consideram os achados importantes para compreender os riscos de se suspender abruptamente medidas restritivas numa população ingênua ao vírus. Embora a política de zero-COVID tenha claras desvantagens, sua interrupção súbita também precisa ser bem planejada e gradual.

O governo chinês relutou em divulgar dados confiáveis sobre a real dimensão do surto de COVID-19 no país. Estudos independentes como este são essenciais para preencher as lacunas e entender o verdadeiro impacto da pandemia na China. Apenas com dados transparentes e fidedignos é possível tirar lições valiosas para políticas de saúde pública no futuro.

Apesar de limitações metodológicas, os autores enfatizam que esta é uma tentativa objetiva de estimar o excesso de mortalidade na China após a reabertura. Os achados questionam números oficiais e destacam os riscos de se abandonar as restrições da COVID-19 sem um planejamento cuidadoso para proteger populações suscetíveis.