Ora bom dia.

Viva, como vai?

Olhe, mal. Dói-me as costas, tenho mal na barriga, tenho uma unha negra, o ácido úrico tá alto, alto não, elevado, e o meu marido tem uma amante. E passo as noites em claro.

E chove, hã?

Chove, chove, e o Sócrates não faz nada.

Andamos a trabalhar e a pagar para esses chulos.

Só querem tacho.

É o mexilhão quem se lixa, sempre.

É. O Zé povinho é que alomba sempre.

É. É o mexilhão.

Já tinha dito.

Pois já.

Não somos nada.

Cá estamos.

É a vida.

É. É que é uma cruz, hã?

É. Uma cruz.

No totoloto é que não me sai nada.

Nem a mim. Só enterro dinheiro.

O meu tio é que foi a enterrar anteontem.

Ai sim? Aquele que esteve no ultramar?

Não, o que esteve em Angola.

Ah. Morreu de quê?

Mal ruim. Devia-me dinheiro. Agora fico a arder.

Agora ao menos não há disso. Há cheias.

É. Deus tira com uma mão e dá com outra. A Salete, aquele amiga da tia do primo do cunhado do marido da Arlinda é que tá cheia. 7 meses.

Ai tá?

Tá. Não sabe quem é o pai.

Ao menos sabe quem é a mãe, ahaah, ahaha, ahahah....

Atão se a mãe é ela.... Você tem cada uma....

Olhe, parou de chover. e o autocarro que nunca mais vem.


Faz-me espécie, isto.

Isto é uma vergonha.

Tá mal.

Male. Tá male.

É o mexilhão, sempre.

Isto tá fodido.

Faz cá falta o Salazar.

Esse sim, punha ordem nisto tudo.

Mandriões. Não querem trabalhar.

São todos doutores, agora.

É. Pegar numa enxada ou numa picareta, tá quieto.

Uiiii, faz foles nas mãos. Não sabem enxertar uma videira.

Pensam que as galinhas têm 4 patas.

Já reparou no que chove, vizinha?

É. Bem, vou fazer a sopa e acomodar o vivo.

E eu vou levantar a reforma aos correios, que desde que perdi uma unha nas vindimas nunca mais fui homem para trabalhar. Tenho que me desenrascar com 178 euros por mês. Só para a farmácia vão 200.

Então como é que vive, vizinho?

A minha mulher dá-se.

Também a minha filha.

Eu sei. Carita.

Acha?

Acho.

Tenho que lhe dizer.

Diga.

Então adeus e as melhoras.

Então as melhoras e adeus.