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Os doces diplomas da nódoa









Com a campanha presidencial a entrar na sua période vache, não quereria deixar de vir regar aqui, com um pouco mais de gasolina, esta triste fogueira branda. Tem a eleição de 24 de janeiro o mérito de ser aquela que menos me aquece e arrefece, por ser uma eleição reprise, um triste bis das legislativas de outubro, dado que, tal como, há três meses, quando toda a gente desejava que o Coelho perdesse, sem que o Costa ganhasse, este domingo será marcado pelo mesmo vorrei e non vorrei, onde toda a gente normal, no fundo, deseja que o Marcelo perca mas o Nódoa também não ganhe.

Pronto, eu já sei que toquei no nervo da coisa, mas a ideia era mesmo tocar nesse nervo da coisa, pelo que vou continuar a sofismar, sempre orientado pelo tempo novo. Um dos sinais do tempo novo, como outubro demonstrou, é que se podia ganhar, mesmo quando se perdia. Há umas vozes negativas que defendem que o Costa já tinha a golpada toda combinada com os seus parceiros da "esquerda", e que ganharia sempre, mesmo que perdesse. Há uma certa melancolia nesta análise, é certo, mas eu vou acreditar em que também temos o direito de ser melancólicos, e tentar perceber como é que este tempo novo poderá permitir que o grande perdedor de 24 de janeiro, lá para a madrugada de 25, já se possa apresentar como vencedor.

Por uma redução ab absurdo, temos de tentar entender quem poderia ganhar, caso o Marcelo de Rans perdesse, e há uma certa frieza lógica que nos leva imediatamente a excluir os candidatos da coisa coitada, e vou agora à página da Comissão Nacional de Eleições, muito bem comportadinho, para lhes tentar retirar os nomes, já que estou como a História, que brevemente os vai devorar, e os não sei sequer de cor. Risquemos, pois, aqueles que o tempo novo já declarou como vencidos: Paulo Morais, Henrique Neto, o Tino de Rans, Jorge Ferreira e Cândido Ferreira. Se não me engano, já despachei cinco, pelo que agora já só me falta despachar os restantes.

Edgar Silva é um caso à parte, já que, mesmo num tempo novo, e ganhando sempre o PCP, independentemente do resultado, Edgar Silva já ganhou, e dou-lhe por isso os parabéns, posto que isso me facilita a tarefa de me debruçar sobre os restantes quatro. A Marisa não me é antipática, como já deverão ter percebido, e tem a virtude de ter, na juventude, andado a pastar cabras. O texto é tão mau que se permite ter a assinatura da Câncio, e por isso aqui o evoco, com algum carinho, e pela simples oportunidade de me ter sido útil, neste tempo novo. Não creio ser um requisito, para a Presidência da República, que se tenha andado a pastar cabras, mas também não se deve excluir, por um princípio de paridade democrática, a virtude de as ter pastado, agora, ou num tempo novo. Consuetudinariamente, também Aníbal de Boliqueime o fez, no seu tempo velho, isso, e muito mais, e lá chegou, hirto e firme, pelo que Marisa Matias também já tinha direito ao seu precedente. Registamo-lo com algum brio, e fazemos o reparo de que tal se insere numa longa linhagem de políticos que vieram das brenhas e se acercaram da cidade. Marisa Matias distingue-se deles, pelo facto simples que, num tempo certo, deixou as cabras e se fez à urbe, e cansada da urbe, partiu para a Europa. Muitos fizeram menos, e limitaram-se a vir pastar cabras para a capital, quando não as continuaram, num tempo novo, a calmamente pastar numa desgastada Europa.

Maria de Belém Roseira é infinitamente mais patética, por que se insere na longa linhagem daquelas balconistas, cerzideiras e espartilheiras, do tempo antigo da minha avó, que acharam que, bastando trepar para cima do balcão e mostrar as ligas e a combinação chegavam a um patamar qualquer do vaudeville, e chegam, já que o país inteiro ora se degradou numa gigantesca palhaçada. Maria de Belém é o último Sonho de Gerôncio de Manuel Alegre, e depois disto cremos que começará a eternidade etílica. Toda ela é marcada pelo pietismo e toda ela se rege pelo princípio do à justinha, pequena, maneirinha e com algumas potencialidades. Cremos que o momento mais alto deste campanha tenha sido a sua visitação aos embaixadores, muito semelhante à chegada dos Três Reis Magos, mas em minúsculo, em que, durante alguns memoráveis minutos, enquanto o camerlengo dela repetia o erro de protocolo de dizer "o senhor embaixador de aqui, e o senhor embaixador de ali, e o senhor embaixador de acoli", em de vez de "o senhor ministro do estado tal, etc", a nossa miniatura do coração teve os ventrículos apontados para outro lugar, com todos os olhares a dirigirem-se para uma filha, muito grávida, muito empandeirada num canto da sala, onde, espojada, acariciava as curvas de uma barriga muito curva, muito inchada, de onde irá sair uma ínclita geração, para provar que, nós cá, Portugueses, num tempo novo, ainda sabemos emprenhar, e não precisamos de "refugiados" de burka alheia, para aqui virem aumentar as emissões de CO2 da atmosfera. O vídeo é memorável, e só não tem a assinatura do Manoel de Oliveira e a medalha de cavaleiro das artes do Tony Carreira, por que não calhou, e por já estarem ambos, por esta altura, demasiado mortos. Vejam, por que vale a pena. A Maria de Belém, 24 de janeiro dará um digno lugar, nalguma junta de freguesia de Lisboa, e todos nós, ela, e o Manel, ficaremos, num tempo novo, satisfeitos, com um tão generoso bem haja, e um voo tão raso dos aventais femininos.

Afastados estes horrores, ficam o Bucha e o Estica desta triste paródia. O Marcelo já levou a sua dose, e mais dose vai levar, no dia 24. Há certas correntes que defendem que o catavento está apenas a submeter-se a este vexame por vazio e vaidade, ou para provar que o país chegou a tal estado de degradação que lhe permite uma pista de aceleração, para "só ver no que dá", e, se, no dia 24 for eleito, resta-lhe ainda a oportunidade de dizer que agradece muito e não aceita. Para quem conheça o Marcelo, ele é capaz disso e até de muito mais, como se irá ver neste curioso ciclo negativo, à porta do qual, num tempo novo, estamos, e pelo qual ansiosamente esperamos.

Não por acaso, mas por premeditação, deixei para o fim o fenómeno das reitorias. Para quem pensava que tudo o que era mau, em termos dos "interesses", em Portugal, se tinha acotovelado atrás de Marcelo, ainda não tinha visto o rasto de Nóvoa: a sinistra Pilar del Rio, a par com a miserável Inês de Medeiros e o lúgubre Zé que faz falta. Não vou enumerar mais, por que já fiquei com vontade de vomitar. Gente desesperada e capaz de tudo, e de potenciar o clima, nem que, para tanto, tenham de matar o Almeida Santos, ou o Soares velho. Tanto quanto reza a sua biografia não oficial, Sampaio da Nódoa, filho da da Dona Saladina, veio de Cabeçudos, e pareceu cair dos céus, crente, cremos, de ser um novo Saladino, e creio que quem de lá o atirou de pára quedas ficou à espera de que o engolíssemos, já que nós costumamos engolir tudo e não resmungamos. Dizem que começou a instrução primária em Caminha, mas só a acabou em Nova Oeiras, pelo que ela se deve considerar extensa, não na duração, mas, porventura, na distância. É fundamental, para o país do Mourinho e do Ronaldo, que tenha passado a infância e a juventude com uma bola nos pés. Eu passei-a com Proust, Júlio Verne e Suetónio, mas creio que deve ter sido por isso que nunca me candidatarei a Presidente, nem a coisa nenhuma parecida. A parte seguinte não deixa de ser interessante, já que, em Coimbra, e matriculado em Matemática, passou o tempo entre os campos de futebol e os palcos de teatro. Quanto a estudar, omite-se o estudo e a palavra estudo... A fase seguinte já inclui os cafés, e as noitadas, e os relvados são trocados por uma bolsa da Fundação Calouste Gulbenkian, que dá razão àquelas línguas compridas que dizem que por lá passou tudo, até os elétricos.

Entre 1973 e 1976, como reza essa generosa biografia, e omitindo que houve uma revolução pelo meio, fala-se de muita animação cultural, dinamizações de cidadãos e "expressões dramáticas" (!). Curso é que não, mas curso para quê, já que se abalançou diretamente à "formação de professores"?... Percebemos, e continuamos, para 77, onde, dessa formação de professores chega às aulas de moto próprio, em Aveiro. Cansado da academia, embarca num Fiat 127, e ruma à Suíça. Ao contrário do seu padrinho Cavaco, que rumou à Figueira da Foz, no célebre Citroen que o conduziria à ruína do país, Sampaio da Nódoa vai somente a Genebra, de onde sai com um curso (?) e um pegar de empurrão para o doutoramento (!), generosamente sobre a história de (certos) professores em Portugal.

Cumpre aqui fazer uma pausa, para nos debruçarmos sobre o princípio da bola de neve, que começa do tamanho de uma noz e acaba a engolir cidades. Não nos espantará que, em 85, já alguém o tenha convidado para ser professor convidado num instituto de educação física, e que depois aterre nas famigeradas Ciências da Educação, que estão para o séc. XX como as Profecias de Nostradamus para o Nicolao Maquiavel. A partir de aí, são todos os fogos de artifício previsíveis, a agregação, a cátedra e a Sorbonne, para fazer um segundo doutoramento que tirasse as dúvidas sobre o primeiro. Sarastro empurra-o para a Reitoria, mas o Tamino só se contenta, como Carrilho, com a Unesco. 

Não sei quem redigiu esta biografia, mas é um texto notável do estilo do volátil e do generoso. Não chega a ser comovente, já que introduz os patamares do costume: há nisto uma mistura de Harry Potter com as equivalências de Miguel Relvas, e espera-se que ninguém se lembre de escrever as linhas seguintes, que, de acordo com a lógica do Avental, deverão incluir uma Presidência da República e o Bispado de Roma, para lá venerar um Ente Supremo.

Não me apetece alongar mais sobre esta evidências. Nos tempos áureos da irmandade honesta, fez-se um exercício de estilo de oferecer um Imperador aos Franceses. Os tempos são, agora, infinitamente mais modestos, entre napoleões de goa e os cavacos de fancaria. Há muita gente espantada com os novos casamentos, também chamados "ménage à trois", que incluiriam, para lá da filiação base, núpcias espúrias entre comunistas e maçonaria, entre opus deístas e estalinismo, e, mais curioso do que tudo, entre seguidores do Balaguer e seguidores do Aventalinho. Se bem pensarem, a coisa nada tem de estranho, e explicaria muitos entroncamentos, como o par Constâncio, pai e filho, mas o mais estranho assenta numa espécie de balanço da revolução de abril, onde, muito mais importante do que as descolonizações, das transformações económicas, de mentalidade, no aumento da esperança de vida ou na liberalização do costumes, o grande aggiornamento tivesse sobretudo assentado naquela coisa estranha, que foi, não o acesso de todos aos estudos, mas a democratização da concessão de diplomas, de que Sócrates e Relvas são apenas os cumes cómicos de um curioso icebergue. Na realidade, o lado mais perverso da abrilada foi a proliferação destes faz de conta académicos, que se instalaram, num tempo novo, por toda a parte e de qualquer modo. Não voltaremos a falar desta "geologia das licenciaturas", já que ela espelha e traduz toda a inquietação profunda desta sociedade doente, que, num tempo novo, vai votar no dia 24.

O 25 de abril foi o tempo novo dos diplomas de secretaria.

A pena residual que tenho pela derrota de Sampaio da Nódoa é do custo que ela vai significar, em vésperas do retorno da Troika, e do desgosto que vai provocar, naqueles que tanto apostaram neste derradeiro naufrágio. Na falta de números concretos, apenas poderei dizer que os aventais ficarão um pouco mais pobres, num tempo velho, o que, curiosamente, não acontecerá com os cilícios, já que os últimos, ao contrário dos primeiros, não costumam pagar, nem sequer num tempo novo, as derrotas, sobretudo quando perdem. Temos pena: arrivederci :-)



(Quarteto das núpcias falhadas do tempo novo do cilício e do avental, no "Arrebenta-SOL", no "Democracia em Portugal", no "Klandestino" e em "The Braganza Mothers")


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