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Num cantinho qualquer...

Tags: praacute


Aconteceu mais ou menos um ano atrás - mais prá mais, que prá menos - e mesmo sendo algo que já se resolveu, não posso deixar de achar pontos em comum com o que acontece agora e que parece que nem com ajuda vai se resolver...

Tia Joanita - que não é mesmo tia minha, mas sim tia do meu marido (me apropriei de todas elas, prá falar a verdade...) - ligou prá minha casa e falou assim prá minha Lola:

" - Ó, minha menina, me diga cá uma coisinha... você se importa de me passar todos os dados da tua mãe, o nome, os números dos documentos?..."

"-Prá quê que é, tia? Olha, eu chamo a minha mãe, ela tá no tanque..." - falou a minha Lola.

"- Chame não, minha filha - é surpresa. Me passa os dados que eu já tô com o papel e a caneta...".

A Lola, desconfiada, ficou insistindo, insistindo... Até que a Tia Joanita falou que queria meus dados prá deixar suas casinhas de herança prá mim... 

Minha filha, então - me conhecendo muito bem, por sinal... - falou prá tia que era melhor ela falar comigo, que esse tipo de coisa não podia ser feito assim, de surpresa. Antes da tia ter tempo de desligar ela já tava gritando meu nome, me mandando atender o telefone...

Tia Joanita tinha passado uns meses bem adoentada - ela, que se cuida tão direitinho, não tem nem pressão alta nem diabetes, nunca bebeu nem fumou - pela primeira vez na vida vislumbrou a possibilidade de partir deste mundo sem dispor ela mesma dos seus próprios bens... Viúva, nunca teve filhos...

Bom, depois que ela me explicou prá quê queria meus dados, toda ansiosa, toda feliz (por achar que eu, do outro lado da linha, ia dar pulinhos de alegria...), recebeu de mim uma resposta que não esperava...

" - Puxa, tia, que linda... Fico feliz da senhora ter pensado em mim, fico mesmo... Mas eu não quero herdar casa nenhuma, tia... Já tenho a minha casinha, graças a Deus, já conseguimos até um sítio prá deixar de herança pros filhos... As casinhas da senhora... "

E ela nem me deixou terminar de falar... Falou que então tava tudo bem, que outra hora a gente se falava e praticamente desligou na minha cara.

Tentei falar com ela, liguei várias vezes, toda hora ela dizia que tava ocupada, que falava comigo depois... Percebi que ela tava chateada...

Mais de uma semana depois disso ela me ligou, com aquela voz de quem quer falar somente o necessário, toda fechada e me disse que tava muito decepcionada comigo, pois eu estava sendo soberba e orgulhosa. Que eu tava desdenhando das casinhas dela, por me achar "rica demais para herdá-las"... Eu tentava me fazer ouvir, tentava interromper - mas ela não deixava, só ela falava...

Quando o "Marildo" chegou em casa, naquela noite, eu finalmente contei prá ele. Nem tinha me ocorrido contar no dia que aconteceu - acho que fiquei meio encabulada de contar, afinal o sobrinho é ele e a tia queria deixar as casas especificamente prá mim... Ele ficou bravo comigo e disse que a gente tinha que ir visitá-la no fim de semana, prá esclarecer tudo...

Lá chegamos - a tia de cara fechada... Meu marido, prá nos deixar conversar sozinhas, foi fazer um tour pela casa, brincar com a cachorrinha...

Me cortou o coração a carinha magoada dela ... Pensar que, na cabeça dela, eu tava renegando seu ato de carinho, desprezando as casinhas que com tanto trabalho ela conseguiu comprar... 

Sentei do lado dela e disse assim:

"- Lembra, tia, quando a senhora me contou de como fica triste porque os parentes só se lembram que a senhora tá viva prá pedir dinheiro emprestado? Da sua tristeza pelo dinheiro que o Tonho, o filho do Géo, o Tiago, o Júlio - o dinheiro que a senhora tirou da poupança prá emprestar prá eles e que nunca vai ver de volta? Que nem obrigado esse povo fala - e que voltam a pedir e pedir de novo e de novo... E quando a senhora não tem eles ficam bravos, dizem que a senhora é egoísta, que o dinheiro tá parado no banco, que não lhe custa nada emprestar prá eles? Eu não quero herdar coisa nenhuma da senhora, tia, por vários motivos: primeiro porque eu quero que a senhora saiba que eu a amo e não quero absolutamente nada em troca. Segundo: porque eu quero que a senhora viva até os cem anos de idade, cheia de saúde e de lucidez e que aproveite finalmente as coisas boas da vida. Sabe, eu acho que a senhora devia vender uma das casas e torrar o dinheiro, viajando, passeando prá lugares lindos, indo comer em restaurantes, sem se preocupar em deixar nada prá ninguém. 

Esta casa que a senhora mora, tia, vale mais do que a minha, sabia? Tá num bairro melhor, tá mais bem conservada... A senhora achou que eu tava sendo orgulhosa em não querer herdar nada? Pois eu também não quero herdar nada da minha mãe, tia. Já falei pros meus irmãos que, como eu já tenho casa, não quero herdar nada...".

E a tia entendeu perfeitamente - e ficou feliz, graças a Deus...

Meu marido ficou um tantinho balançado - afinal, trabalhamos tanto prá comprar nossa casinha e o destino, pelas mãos da tia, queria nos dar duas casinhas de mão beijada, assim do nada... Até eu - não vou mentir - senti uma mordidinha do bichinho da ambição: já pensou? Podia deixar pros meus filhinhos, facilitar o futuro deles... 

Mas o que é certo, é certo.

Se minha mãe falecer eu tenho direito a 1/6 de tudo, de acordo com a lei - mas eu não quero. Não me importa se seria legal, se estaria totalmente de conformidade com a lei e coisa e tal... No meu coração tem uma lei que me importa mais seguir do que a qualquer outra: nenhum dos meus irmãos tem casa própria, EU TENHO. Deus me deu, a vida me deu, eu trabalhei prá comprar - tanto faz: eu tenho, eles não. Se eu abrir mão eles vão ter um tantinho a mais prá eles, que vai facilitar um pouco - então, claro como o sol no céu, eu não tenho direito a nada e fim de papo. 

Assim também não quero nada da tia, pois ela tem duas dúzias de sobrinhos mais precisados de sorte na vida do que eu, que já fui muito premiada.

Minha mãe - quando soube disso, ficou chocada. Me achou uma burra, uma idiota, pois não se abre mão de uma casa - quanto mais de duas... Nem adiantou eu explicar prá ela o que eu penso, ela não entendeu mesmo...

"E prá quê, Dona Rosa, tanto tempo desaparecida, prá quê aparecer agora (depois de tanto tempo...) com uma história velha dessas prá contar?" - alguém pode estar se perguntando...

Essa história tão passada tem uma sombra grande que alcança o hoje da minha vida... Porque a gente pensa que, porque fala uma coisa, porque age de uma determinada forma, quem tá ouvindo ou testemunhando deveria se lembrar - pelo menos se lembrar...

Minha mãe tinha cirurgia marcada prá dia 18 deste mês. Andei com ela por meses, levando prá todo lado, em todos os especialistas, fazendo todos os exames... Nenhum dos meus irmãos - em nenhum momento - parou prá pensar que podia ir no meu lugar (eu, andando prá todo lado de bengala, o quadril em petição de miséria...). 

Quando todos os exames estão prontos, quando o cardiologista e o anestesista já deram o OK prá cirurgia ser realizada, quando o ginecologista nos atendeu e marcou na sua agenda o dia e a hora do procedimento... Quando eu já fui no setor de internação e reservei o quarto, assinei toda a papelada... Quando já recortei os moldes prá fazer camisolas prá ela usar no hospital e planejei na minha alma como eu iria concatenar os cuidados com a minha família e passar as noites com ela no hospital...

Bem aí ela me liga e diz que mudou de ideia, que não quer mais operar nada, que vai sarar sozinha (como se o útero fosse voltar sozinho prá dentro dela e as infecções se curassem apenas com novenas...).

Como eu achei absurdo e disse que ia na casa dela, conversar com meus irmãos e irmãs, prá fazê-los ver como era importante ela fazer a cirurgia - ela mais que depressa me aparece em casa, prá me explicar as razões dela...

Que ela tinha o pressentimento que ia morrer na mesa de cirurgia... Que os médicos operam as pessoas velhas de qualquer jeito, prá elas morrerem e não darem mais gastos pro governo...Que se ela morrer faz muita falta pros meus irmãos solteiros...

-"E a Cida, mãe? A senhora perguntou prá ela o que ela pensa? Porque ela trabalha na área médica, ela sabe como é perigoso ficar tendo uma infecção atrás da outra, como a senhora tem..." - eu disse, pensando que minha irmã, por ser professora na USP, cheia de mestrados e doutorados, iria ser uma voz da razão ao meu lado...

-"Ah, a Cida disse que eu faça o que quiser. Que se quiser operar, opere, que se não quiser, tudo bem, que quando eu morrer ela vira a página, igual fez com o pai..."

-"Mas eu não, mãe! Eu não sei virar a página! Eu vou chorar prá sempre a tua perda, como choro a da vó, a do pai...".

Mas minha mãe teve a falta de sensibilidade de ainda dizer que, se ela morrer, eu vou sofrer menos, pois tenho minha própria família prá me preocupar...

Meus irmãos disseram que, se ela morresse na cirurgia, jamais iriam me perdoar - e até deram a entender que achavam que eu queria que ela morresse, prá me apropriar logo da minha parte...

Fico pensando: como pode isso? As pessoas que mais deviam te conhecer, em quem você deu banho, que você ajudou a fazer a lição de casa, te julgarem tão mal?...

Durante esse tempo todo, apesar de tanta asneira que eu enfrentei, tentei fazer minha mãe ver a razão, que ia ser uma cirurgia tranquila, que ela ia ser bem tratada, ia ficar em apartamento com TV a cabo, frigobar...

Ontem eu fui no hospital fazer Holter e MAPA - que eu tinha adiado, prá me preocupar só com ela - e aproveitei prá ir desmarcar a cirurgia (pois ela vive prometendo que vai, mas empurra com a barriga - e alguém pode precisar da vaga dela, afinal de contas...).

Fui sozinha, de bengalinha (acho que nunca mais vou me ver livre dessa porcaria)... 

Emagreci quase 9 quilos prá ver se a dor no quadril melhora, mas ainda não vi resultado. 

Tenho andado muito triste - me sinto um cachorro ferido, encolhido num cantinho qualquer, lambendo minhas feridas. Eu sou muito parecida com um cachorro mesmo: adoro passear de carro (se minhas orelhas fossem grandes, iam balançar na janela, enquanto eu ponho a língua prá fora...), cada ano da minha vida parece que foram uns dois ou três, pelo menos (dizem que os anos dos cachorros equivalem a sete...) e, quando eu tô triste, tenho que sarar no meu cantinho.


Devia existir analgésico prá coração dolorido - não só prá quadril arruinado...

O computador andou ruim - e eu nem pedi pro filhinho arrumar, quem acabou pedindo foi a Naninha, que precisou dele... Eu nem me lembrava que existia internet, prá falar a verdade... A Lolinha também andou doente - a médica descobriu que ela tá produzindo oito vezes mais insulina que a quantidade máxima que alguém pode ter no sangue, acredita? Ainda bem que eu encontrei essa médica ótima prá cuidar dela..

Me perdoem as amigas que aqui compareceram e não encontraram nada de novo (Nina querida, Teresa, Doutora Cristiane, Fatinha...) - vamos ver se eu me animo a retomar o blog. Meus filhos estão cobrando, gostam que eu faça algo assim, fora do fogão, do ferro de passar roupa e da vassoura... eles gostam de ter uma mãezinha que escreve, meus lindos amores...

Estive triste, mas nunca ociosa; fiz blusinhas pro neto, prá Lolinha que fez aniversário ontem, fiz até uma peça prá minha máquina de tricô - um pente novo, usando durepox e grampos de cabelo (meu lado Magaiver nunca me abandona...).

Voltando do médico - de ônibus, mesmo tendo levado dinheiro pro táxi - levei muitas broncas da Lola e do Ike. Que tenho que voltar de táxi, que transporte público é muito sofrido na minha condição, que algo pode me acontecer...

Mas o que eu posso fazer? Cada troquinho que eu economizo eu ajunto prá comprar fraldas prá minha mãe... 

E aí a Lola fica brava e diz:

-"Que idiotice, mãe! É só pedir pro Ike que ele te dá o dinheiro prá comprar!!!"

Mas aí seria ele quem daria, não eu...

O coração da gente é tão engraçado, não é? Funciona de um jeito tão estranho, com uma lógica só dele...




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