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O Rei Leproso - Balduíno IV de Jerusalém um lendário guerreiro das cruzadas?



Balduíno IV foi rei de Jerusalém de 1174 até 1185.


Nascido em 1161 em Jerusalém, Balduíno era filho do conde de Jaffa e Ascalon. Mais tarde, ele e sua irmã Sibila foram declarados filhos legítimos do rei Balduíno III, que, na verdade, era tio de ambos, para manter uma ordem de sucessão. Aos nove anos de idade, Balduíno passou a ser educado pelo historiador Guilherme de Tiro. Foi seu tutor que descobriu que o jovem garoto sofria de lepra, o que levou a uma intensa procura por tratamentos. Até médicos muçulmanos foram consultados, mas nada seria suficiente.

Amalrico I, então Rei de Jerusalém, morreu em 1174, quando Balduíno tinha apenas 13 anos de idade. Na época, a maioridade era considerada aos 15 anos de idade, mas Balduíno foi imediatamente coroado e passou a ser Balduíno IV. Entretanto seu governo foi mantido sob a regência do senescal Miles de Plancy, um bom guerreiro, mas mediano político. Mas, pouco tempo depois, Raimundo III de Trípoli chegou a Jerusalém exigindo que fosse nomeado regente por se tratar do parente mais próximo do falecido rei Amalrico I, e foi o que aconteceu. Miles de Plancy foi acusado de abuso de poder e assassinado.




Durante o período em que Raimundo permaneceu como regente, o grande desafio do reino era contra o exército que Saladino estava organizando para os muçulmanos. Foram travados alguns combates, Raimundo chegou a ser feito prisioneiro e só foi liberado mediante pagamento de resgate e, depois, estabeleceu-se uma trégua entre cristãos e muçulmanos.


Balduíno IV ganhou a alcunha de rei leproso, ninguém esperava que ele permanecesse muito tempo no poder ou gerasse herdeiros por conta de sua condição de saúde. Sua doença determinou grande parte de seu reinado porque sempre teve de se preocupar com a questão da sucessão. Sua irmã Sibila já tinha um filho com Raimundo III, o qual oferecia uma boa condição para ser seu sucessor, entretanto permitia concorrência. Balduíno IV planejou casar sua irmã com Hugo III da Borgonha, mas acabou casando-a apressadamente com Guy de Luisignan. O casamento foi fundamental para conquistar ajuda militar para o Reino de Jerusalém.

Balduíno IV não manteve a paz com Saladino e investiu em uma série de conflitos. Seu governo seguiu entre várias questões políticas e combates com o exército de Saladino. O Rei de Jerusalém mandou construir fortalezas para proteger seu reino e contou com a ajuda dos Templários. Porém o exército muçulmano montado por Saladino era muito numeroso e bem preparado, venceu conflitos seguidos. Em 1180, finalmente, Balduíno IV e Saladino concordaram em estabelecer um novo período de tréguas que duraria dois anos em função de seus recursos que estavam se esgotando. O Rei de Jerusalém estava cada vez mais doente e não foi capaz de impedir decisões que seriam desastrosas para seu reino. Seus súditos não respeitaram a paz estabelecida com Saladino e promoveram uma série de atentados, o que enfureceu os muçulmanos. Balduíno IV associou seu sobrinho Balduíno V ao trono e definiu de uma vez por todas a questão sucessória. Para além disso já não poderia fazer mais nada, pois a resposta do exército de Saladino seria muito poderosa.

Balduíno IV sucumbiu à lepra com apenas 24 anos de idade. Faleceu no dia 16 de março de 1185, pouco antes do exército de Saladino massacrar o exército cristão e tomar definitivamente a cidade de Jerusalém.




Se, porém, pouco se fala da existência estável de um extenso reino católico na Palestina, menos ainda se realça os gloriosos fatos que lá se passaram.

E quase não se menciona a figura de um homem excepcional, intrépido guerreiro até o holocausto por amor à Religião católica, Balduíno IV (1160 - 1185), o rei leproso de Jerusalém, que subiu ao trono aos 14 anos de idade.

No momento em que as maiores adversidades se acumulavam naquele Reino, a Providência divina parece ter querido suscitar um homem – melhor diríamos, uma chama de fé e coragem – para mostrar que tudo ainda poderia ser salvo se o quisessem seguir e imitar.

Balduíno IV lutou contra a lepra, doença então incurável, que nele se manifestou desde criança e o foi pragressivamente transformando num morto-vivo, quase um fantasma chagado, até levá-lo ao túmulo aos 25 anos de idade.

Lutou continuamente, com grande inteligência e firmeza, para resolver os graves problemas resultantes das desavenças entre os senhores feudais, as quais lhe causavam as maiores preocupações.

E teve de lutar, sobretudo contra numerosíssimos muçulmanos, nunca antes tão fortes e tão unidos sob a égide do terrível sultão Saladino, que atacava freqüentemente o Reino católico para desmantelá-lo.

A todos esses fatores altamente adversos, Balduíno IV soube sobrepor-se com fé e abnegação tais, que até hoje deixam boquiabertos os historiadores que dele se ocupam.

Nos últimos anos de sua vida, fisicamente inutilizado pela doença, fazia-se conduzir ao campo de batalha em liteira.

E sua presença incutia tal ânimo em seu exército e tal pavor no inimigo que, leproso e imóvel, ganhava para Cristo batalhas contra exércitos poderosíssimos.


“Sou um verme e não um homem” (Sl. 21, 7)


Eis seu retrato, em agosto de 1183:


“Do belo menino louro que nove anos antes havia recebido com fasto a coroa, não restava senão um inválido, um ser decaido, repugnante.

“O belo rosto não era mais que placas de carne marrom, fechando três quartas partes das órbitas, das quais todo olhar fugira para sempre, cortando-o do mundo, mergulhando-o numa noite eterna.


“Suas mãos elegantes estavam reduzidas ao estado de cotos. Seus dedos amortecidos haviam caído uns após outros, putrefatos.

“Seus pés haviam tido a mesma sorte e estavam como encolhidos pelo mais cruel dos torcionários chineses.

“Coberto de placas e bolhas, o resto do corpo não estava diferente para se ver. Este homem que perdia pouco toda semelhança com um ser humano comunicava-se ainda com o mundo através de uma boca deformada.

“Pois se o corpo era pouco a pouco destruído, o espírito permanecia firme. Ao preço de esforços por vezes espantosos, ele continuava a assumir seu papel de rei.

“Jamais ele havia faltado a um combate, jamais fugido a uma responsabilidade. Agora, entretanto, que a febre fazia tremer seu infeliz corpo, no sufocante calor do mês de agosto, pela primeira vez ele se sentia sem possibilidades de empreender a menor coisa...

“A crise foi mesmo tão forte que ele teve medo de morrer. Não de comparecer diante de seu Criador, pois para isso ele estava há muito tempo preparado, mas de privar bruscamente seu Reino, seu exército, de um chefe”.* (Dominique Paladilhe, Le Roi lépreux, Paris, 1984).



Saladino foge


Em novembro desse mesmo ano, Saladino cerca com grandes contingentes armados uma estratégica fortaleza católica, o Crac de Moab.


“O exército cristão preparava-se para acorrer em auxílio dos sitiados, infelizmente, porém, minado por divisões internas:

“Então se produziu um acontecimento impressionante, escreve Paladilhe. Balduíno, a quem se imaginava agonizante, horrível e totalmente enfermo, já mergulhado nas trevas da eternidade, parecendo cortado do mundo, levantou-se de seu leito de mártir como um miraculado e manifestou sua intenção de seguir o exército.


“Animado por uma energia fora do comum, ele não renunciou. A todos ele iria mostrar o que era ser rei... Com ele a união se refez em torno de sua liteira de cortinas cuidadosamente baixadas”

“À aproximação do exército cristão, os muçulmanos se retiram: “O grande Saladino fugia diante de um fantasma... encerrado atrás das cortinas de sua liteira”. A simples presença do rei leproso tudo salvara.

No ano seguinte, nova tentativa dos muçulmanos: “Os defensores do Crac viram com estupor chegar a multidão infinita de seus agressores. Saladino tinha praticamente dobrado suas forças”.

“Vem, por fim, o exército cristão “pronto a enfrentar em combate desigual as forças de Saladino. O que lhe dava este ardor, esta coragem, era uma presença no meio dele, a de seu rei Balduíno.

“Havia da parte dele uma espécie de deliberação, de obsessão de seu dever, à qual não faltava grandeza. Até o fim ele queria ser um exemplo para todos de força de vontade e de sacrifício. Ante tanta nobreza, tanto desprendimento, as divisões internas entre os cristãos desapareciam em torno dele.

“Há aí um caso excepcional, único na História. O sultão ficou vivamente impressionado pela chegada heróica de Balduíno”, e acabou por retirar-se.


Seu biógrafo conclui: em face de Balduíno IV, “como não ficar tomado de admiração, de veneração mesmo... Em vão se procurará, através dos milenários a quem compará-lo. Jamais se viu reunidos num príncipe tanta coragem e espírito de sacrifício.

“É tempo que sua face perfurada pela lepra, mas resplandecente de uma luz interior, entre por sua vez na legenda com Godofredo de Bouillon e São Luís”.


(Autor: Gregório Vivanco Lopes, "Catolicismo", abril de 1992






O rei de fábula cheia de luz sobrenatural



Esse jovem monarca, quase desconhecido na História, foi entretanto dos mais heróicos cruzados e protótipo de soberano virtuoso, comparável a São Luís IX.

Balduíno, filho de Amaury I de Jerusalém e de Inês de Courtenay, nasceu no ano de 1160 na Cidade Santa, Jerusalém. Apesar de o casamento de Amaury ter sido anulado por questão de parentesco, os filhos dele nascidos, isto é, Amauri e Sibila, foram considerados legítimos herdeiros da Coroa.

Um dia em que Balduíno brincava de guerra com outros meninos de sua idade, seu preceptor notou que, enquanto os demais gritavam quando eram atingidos, ele parecia nada sentir.

Perguntando-lhe a razão disso, o menino respondeu que os outros não o feriam, e por isso não manifestava dor e não gritava. Mas, reparando o preceptor em suas mãos e braços, percebeu que estavam adormecidos.



O rei foi informado e mandou vir os melhores médicos, que ministraram emplastros, ungüentos e outras medicinas à criança, sem alcançar entretanto resultado algum. Era o começo de uma doença que iria progredir à medida que Balduíno fosse crescendo.

Em suma, esse menino tão belo, tão ajuizado e já tão sábio fora atingido por um mal terrível, que se revelou logo: a lepra, que lhe valerá o trágico cognome de o Leproso.


Dificuldades: doença, divisão interna e Islã


Com a morte prematura de Amaury, Balduíno foi aclamado rei aos 13 anos. Nessa época ele era um adolescente encantador, o mais cultivado dos príncipes de sua família, “dotado de uma grande vivacidade de espírito, se bem que gaguejando ligeiramente como seu pai, e de uma excelente memória”, escreve seu historiador e preceptor, Guilherme de Tiro(1).





“O reino desse infeliz jovem, de 1174 a 1185, não foi senão uma longa agonia. Mas uma agonia a cavalo, face ao inimigo, toda enrijecida no sentimento da dignidade real, do dever cristão e das responsabilidades da coroa nessas horas trágicas em que o drama do rei correspondia ao drama do reino”(2).


Com efeito, o clima deste era de insubordinação, muitos procurando seguir apenas seus interesses pessoais. Foi essa funesta divisão entre os cristãos que levou, pouco depois, à perda de todos os reinos que haviam sido conquistados pelos cruzados na Palestina.


Já aos 15 anos e leproso, derrota islamitas


De 26 de junho a 29 de julho do ano de 1176, o sultão Saladino assediou a cidade de Alepo. Balduíno IV, que na ocasião contava apenas 15 anos e a lepra não havia ainda minado suas energias, partiu em socorro daquele bastião cristão, coadjuvado pelo Conde de Trípoli, Raimundo III.


Juntos, conquistaram grande vitória sobre os muçulmanos.


“Assim, mesmo sob o reino do pobre adolescente leproso, mesmo em presença da unidade muçulmana quase inteiramente reconstituída, a dinastia franca da Síria manteve os inimigos em cheque. Apesar de sua enfermidade — logo ele não viajará mais senão em liteira —, Balduíno IV, precocemente amadurecido pela dor, demonstrou uma força de alma diante da qual a História deve se inclinar com respeito”(3).

Progredindo a lepra, Balduíno viu a necessidade de assegurar sua sucessão. Para isso só havia suas duas irmãs, Sibila e Isabel. Esta última era filha do segundo casamento de seu pai.

Sobre Sibila, a mais velha, repousava em particular o futuro da dinastia, pois, segundo o costume do país, seu esposo seria rei de Jerusalém.



Jesus Cristo à testa dos cruzados


A escolha do esposo recaiu sobre o príncipe piemontês Guilherme Longa-Espada, um dos mais nobres da Cristandade, primo do Imperador Frederico Barbarroxa e do Rei da França, Luís VII.

Tal casamento, que se realizou em 1177, foi efêmero, pois Guilherme faleceu três meses depois, deixando sua jovem esposa à espera de um herdeiro, o futuro Balduíno V. Esse nascimento póstumo, trazendo como conseqüência para o reino uma nova regência, só poderia enfraquecê-lo ainda mais.

Enquanto isso, Balduíno IV apressou-se em renovar a aliança com o Imperador bizantino Manuel Comeno para, juntos, invadirem o Egito.

As circunstâncias pareciam favoráveis, em virtude das hostilidades que Saladino estava sofrendo na Síria naquela ocasião. Entretanto, como a lepra impedia Balduíno de comandar a expedição, ele ofereceu o comando ao Conde Felipe de Alsácia, que se encontrava em Jerusalém com seus homens.

Mas este, para surpresa geral, não aceitou o convite. Julga-se que Felipe queria suceder ao rei leproso, sendo seu primo. Sua recusa fez fracassar a aliança e comprometer ainda mais os interesses cristãos na Terra Santa.


Fé e heroísmo: causas de vitória inimaginável


Em 1177 Balduíno, cedendo às instâncias do Conde de Flandres, emprestou-lhe grande parte de suas tropas para que este tentasse uma expedição contra Hamas. Sabendo que Jerusalém estava assim desguarnecida, Saladino reuniu todas suas tropas para invadir o reino cristão.

A situação neste era trágica. Balduíno não dispunha senão de 500 cavaleiros. Por outro lado, o Condestável Onfroi de Toron, que o podia ajudar na direção da defesa, caiu gravemente doente.

Nessas circunstâncias quase desesperadas, o jovem rei leproso foi heróico. À aproximação do inimigo, reunindo tudo que podia encontrar de combatentes, saiu com a relíquia da Santa Cruz e chegou a Ascalon.

Mandou uma ordem a Jerusalém e a todo o reino, convocando todos os homens capazes de portar armas a reunirem-se a ele. Mas, quando o reforço se aproximava da Cidade Santa, foi capturado por Saladino.



Julgando-se já dono da situação, o sultão ismaelita permitiu que suas tropas se dispersassem, pilhando, matando, fazendo prisioneiros por toda parte.

Ébrio pelo sucesso, Saladino mostrou-se de uma crueldade inaudita. Mandou reunir os prisioneiros e lhes esmagou a cabeça.

Certo de que os francos estavam reduzidos à impotência, o sultão protegeu-se atrás das muralhas de Ascalon, quando viu aparecer subitamente o rei leproso e seu pequeno exército. Foi no dia 25 de novembro de 1177.

Tinham eles anteriormente perseguido os muçulmanos esparsos, derrotando-os.


Após a batalha, ação de graças no Santo Sepulcro


Os cruzados caíram como um raio sobre o exército de Saladino.


“Ágeis como lobos, ladrando como cães, atacaram em massa, ardentes como a chama”(4), com a relíquia da Santa Cruz à frente, portada pelo bispo de Belém.

Os cristãos tiveram a impressão de que a Cruz crescia até tocar o céu. O cronista siríaco Miguel, Patriarca da Igreja jacobita, contemporâneo dos acontecimentos, assim descreveu a milagrosa batalha de Montgisard:

“O Senhor teve piedade dos cristãos. Todo mundo tinha perdido a esperança, porque o mal da lepra começava a aparecer no jovem rei Balduíno, que enfraquecia, e desde então cada um tremia.

“Mas o Deus que fazia aparecer sua força nos fracos inspirou o rei doente. O resto de suas tropas reuniu-se em torno dele.

“Ele desceu de sua montaria, prosternou-se com a face contra a terra diante da Cruz e rezou com lágrimas. À vista disto, o coração de todos os soldados se enterneceu.

“Eles estenderam todos a mão sobre a verdadeira Cruz e juraram jamais fugir; e, em caso de derrota, olhar como traidor e apóstata quem fugisse em vez de morrer.

“Montaram de novo nos cavalos e avançaram contra os turcos, que se regozijavam, pensando já os ter derrotado.

“Vendo os turcos, de quem a força parecia um mar, os francos deram-se mutuamente a paz e pediram uns aos outros um mútuo perdão. Em seguida engajaram a batalha.

“No mesmo instante o Senhor fez cair violenta tempestade, que levantava a poeira do lado dos francos e a lançava no rosto dos turcos.

“Então os francos, compreendendo que o Senhor havia aceito seu arrependimento, tomaram coragem, enquanto os turcos deram meia-volta e fugiram. Os francos os perseguiram, matando e massacrando durante o dia todo”(5).



Somente a fidelidade dos mamelucos salvou Saladino de morte certa.


Balduíno IV retornou a Jerusalém como triunfador e foi render graças ao Deus dos Exércitos na igreja do Santo Sepulcro.


“Jamais vitória cristã mais bela tinha sido infligida ao Levante, e todo o mérito voltava-se ao heroísmo do rei, cuja juventude [tinha então 17 anos], triunfando por um instante do mal que corroía o corpo, igualou-se em maturidade a um Godofredo de Bouillon ou a um Tancredo”(6).




Coragem e resignação ante a devastação da lepra


Balduíno continuou a infligir derrotas aos islamitas, embora não pudesse vencer a luta que se travava em seu próprio corpo entre a lepra e as partes sãs. Aquela o deformava de tal maneira, que assim é descrito por um historiador, em 1183:


“Do belo menino louro, que nove anos antes havia recebido com fausto a coroa, não restava senão um inválido, um ser decaído, repugnante.

O belo rosto não era senão placas de carne marrom, fechando três quartas partes das órbitas, das quais todo olhar fugira para sempre, cortando-o do mundo, mergulhando-o numa noite eterna.

Suas mãos elegantes estavam reduzidas ao estado de cotos. Seus dedos amortecidos haviam caído uns após outros, putrefatos. Seus pés haviam tido a mesma sorte e estavam como encolhidos pelo mais cruel dos torcionários chineses.

Coberto de placas e bolhas, o resto do corpo não estava diferente para se ver. [...]

Ao preço de esforços por vezes espantosos, ele continuava a assumir seu papel de rei.

Jamais havia faltado a um combate, jamais fugido a uma responsabilidade”(7).


Balduíno IV, o rei heróico e virtuoso, semelhante ao admirável monarca francês São Luís IX, e cuja vida não foi senão uma lenta agonia, entregou a Deus sua alma pura no mês de março de 1185, aos 24 anos de idade.


“Tendo mantido até seu último suspiro a autoridade monárquica e a integridade do reino, soube também morrer como rei”.(8)


* * *
Notas:
(1) René Grousset, Histoire des Croisades et du Royaume Franc de Jérusalem, Paris, Librairie Plon, Les Petits-Fils de Plon et Nourrit, 1935, p. 610.
(2) Id., ib., pp. 610-611.
(3) Id. ib., pp. 632-633.
(4) Id. ib., p. 658.
(5) Michel le Syrien, III, p. 375. apud René Grousset, op. cit., p. 657.
(6) René Grousset, op. cit., p. 663.
(7) Dominique Paladilhe, Le Roi Lépreux, Perrin, Paris, 1984, apud Gregório Lopes, Catolicismo, abril/1992.
(8) René Grousset, op. cit., p. 744.


(Fonte: Lepanto)







O rei católico que venceu Saladino e o Islã








Vitral do rei Balduíno na Basílica de Saint-Denis, França


Balduíno IV (1161 – 1185) foi o último rei de Jerusalém com espírito de Cruzada. Guy de Lusignan, seu sucessor, foi um interesseiro, sob cujo reinado a Civilização Cristã perdeu a posse da Cidade Santa.

Na história das Cruzadas, nada é mais emocionante que o reinado doloroso de Balduíno IV.

Nada, entre os vários exemplos famosos, pode atestar melhor o império de um espírito de ferro sobre uma carne débil.

Foi um rei sublime, que os historiadores tratam só de passagem, o que faz perguntar por que até aqui nenhum escritor se inspirou nele, exceto talvez o velho poeta alemão Wolfram von Eschenbach.

Nem o romance nem o teatro o evocam, entretanto sua breve existência cheia de acontecimentos coloridos forma uma apaixonante e dilacerante tragédia.

O destino sorria à sua infância. Robusto e belo, ele era dotado da inteligência aguçada de sua raça angevina (de Anjou).

Tinha sido dado a ele por preceptor Guilherme de Tiro, que se tomou de “uma grande preocupação e dedicação, como é conveniente a um filho de rei”. O pequeno Balduíno tinha muito boa memória, conhecia suficientemente as letras, retinha muitas histórias e as contava com prazer.

Um dia em que brincava de batalha com os filhos dos barões de Jerusalém, descobriu-se que tinha os membros insensíveis:


“Os outros meninos gritavam quando eram feridos, porém Balduíno não se queixava. Este fato se repetiu em muitas ocasiões, a tal ponto que o arquidiácono Guilherme alarmou-se.


“Primeiro pensou que o menino fazia uma proeza para não se queixar.

“Então perguntou-lhe por que sofria aquelas machucaduras sem queixar-se.

“O pequeno respondeu que as crianças não o feriam, e ele não sentia em nada os arranhões.

“ Então o mestre examinou seu braço e sua mão, e certificou-se de que estavam adormecidos” (L’Eraclès).

Saladino incendeia cidade, Chroniques de Guilhaum de Tyr, BNF, Mss fr 68



Era o sinal evidente da lepra, doença terrível e incurável naquele tempo.

Os médicos aos quais foi confiado não podiam sustar a infecção, nem mesmo retardar a lenta decomposição que afetaria suas carnes.

Toda sua vida não foi senão uma luta contra o mal irremissível.

Mais ainda, muito mais: foi testemunho dos poderes de um homem sobre si mesmo e da encarnação assombrosa dos mais altos deveres.

Balduíno IV foi um rei digno de São Luís, um santo, um homem enfim — e é isso, sobretudo, que importa à nossa admiração sem reticências — a quem nenhuma desgraça chegou a destruir o vigor de alma, as convicções, a altivez, as qualidades de coração, o senso das responsabilidades, dos quais ele hauria o revigoramento da coragem.

No fim de 1174, Saladino, senhor do Egito e de Damasco, veio sitiar Alepo. Os descendentes de Noradin pediram socorro aos francos.

Raimundo de Trípoli atacou a praça forte de Homs e Balduíno IV empreendeu uma avançada vitoriosa sobre Damasco. Estas iniciativas fizeram com que Saladino abandonasse seu desejo inicial.

Em 1176 o sultão voltou à carga, e a mesma manobra frustrou seus planos. Balduíno venceu seu exército de Damasco, em Andjar, e trouxe um belo lucro da expedição. Nesta ocasião ele tinha quinze anos.

Apesar de sua doença, cavalgava como um homem de armas, empunhando eximiamente a lança.

Nenhum de seus predecessores teve tão cedo semelhante noção da dignidade real de que estava investido, e de sua própria utilidade.



Balduíno IV na batalha de Montgisard, detalhe.
Charles Philippe Larivière (1798-1876)


Percebendo as rivalidades existentes entre os que o cercavam, compreendeu quão necessária era sua presença à cabeça dos exércitos católicos.

Mas que calvário deveria ser o seu!

Aos sofrimentos físicos juntava-se a angústia moral: seu estado impedia-o de se casar, de ter um descendente.

Ele não era senão um morto-vivo, um morto coroado, cujas pústulas e purulências se disfarçavam sob o ferro e a seda, mas que se mantinha de pé e se lançava à ação, movido não se sabe por que sopro milagroso, por que alta e devoradora chama de sacrifício.

Um novo cruzado — Filipe de Alsácia, conde de Flandres e parente próximo de Balduíno IV — acabava de desembarcar. O pequeno rei Balduíno esperava muito desse apoio.

Estava claro que era necessário ferir Saladino no coração de seu poderio — isto é, no Egito — se se quisesse abalar a unidade muçulmana. Era isso, precisamente, o que propunha o basileus, imperador de Bizâncio.

O Egito, uma vez conquistado em parte, Damasco não poderia deixar de subtrair-se ao poder cambaleante de Saladino.

Mas Filipe de Alsácia opinava de outra forma. Ninguém poderia impedi-lo de ir guerrear na Síria do Norte, e, o que era mais grave, de levar consigo parte do exército franco.



Vale de Montgisard


Saladino respondeu invadindo a Síria do Sul. Balduíno reuniu o que lhe restava da tropa, desguarneceu audaciosamente Jerusalém e partiu para Ascalon, onde Saladino investia. Este, logo que foi informado, subestimou seu adversário. Ele acreditava que a queda de Ascalon era uma questão de dias, e marchou sobre Jerusalém com o grosso de seu exército.

Balduíno compreendeu suas intenções. Saiu de Ascalon, fez um longo périplo e caiu repentinamente sobre as colunas de Saladino, em Montgisard.

O efeito da surpresa não compensava a desproporção dos efetivos em luta, e Balduíno sentiu a hesitação dos seus. Desceu do cavalo, prosternou-se com o rosto na areia, diante do madeiro da verdadeira Cruz, que era levada pelo Bispo de Belém, e orou com a voz banhada de lágrimas.

Com o coração convertido, seus soldados juraram não recuar, e considerariam traidor quem voltasse atrás. Rodeando o Santo Lenho, o esquadrão de trezentos cavaleiros se lançou impetuosamente.


“O vale entulhava-se com a bagagem do exército de Saladino — diz Le Livre des Deux Jardins — os cavaleiros francos surgiam ágeis como lobos, latindo como cães. Atacavam em massa, ardentes como uma chama”.


E puseram em fuga o invencível Saladino.

Se este salvou a pele, foi graças à rapidez de seu cavalo e ao devotamento de sua guarda. Retornou ao Egito, abandonando milhares de prisioneiros. Balduíno logrou, enfim, uma vitória sem precedentes.



Balduíno IV em Montgisard, Charles Philippe Larivière (1798-1876)


No ano seguinte Balduíno edificou o Gué-de-Jacob, fortaleza destinada a defender a Galiléia dos ataques de Damasco. Guilherme de Tiro pretende que isso tenha sido feito pelas prementes solicitações de Odon de Saint-Amand, grão-mestre do Templo.

Em todo caso, qualquer que tenha sido o inspirador da ideia, não há dúvida quanto à importância estratégica de Gué-de-Jacob.

Em 1179 Saladino invadiu a Galiléia. Balduíno foi ao seu encontro, tentando surpreendê-lo como tinha feito em Montgisard. Mas como os muçulmanos se contivessem, ele foi cercado e caiu prisioneiro.

Muitos foram mortos e presos nesse dia. Pouco depois Saladino tomou Gué-de-Jacob e fez executar todos os templários que a defendiam.

Sybila, irmã do rei, acabava de casar — contrariamente aos interesses de Estado — com Guy de Lusignan, homem de beleza discutível, sem fortuna e sem talento.

Balduíno, pressionado pelos seus, minado pela doença, tinha consentido nessa união e dado a Lusignan os condados de Jaffa e Ascalon.

Tão logo a insignificância do marido de Sybila se manifestou, atiçaram-se as esperanças dos senhores feudais. Contava-se que o irmão de Lusignan, comentando o casamento, disse: “Se Guy for Rei, eu deveria ser Deus!” Tal a mediocridade que lhe era atribuída.



Renaud de Chatillon, turbulento e belicoso vassalo


Nessa mesma ocasião, Isabel de Jerusalém desposava Anfroi de Toron, filho indigno de seu pai, o falecido condestável de Jerusalém, morto em defesa do rei.

O estado de Balduíno IV piorava dia a dia. Foi uma provação para sua mãe — que não tinha boa fama — e para a roda de seus cortesãos ambiciosos e amorais, ver a aproximação de Balduíno com Raimundo de Trípoli, único homem capaz de o aconselhar sabiamente.

Nesse momento reapareceu, libertado dos cárceres muçulmanos, o antigo príncipe de Antioquia, Renaud de Châtillon.

Logo recomeçou suas aventuras, assaltando uma importante caravana de peregrinos com destino a Meca.

Esse ato rompia a trégua assinada por Balduíno IV e Saladino e ofendia as convicções religiosas dos muçulmanos, a cujos olhos o atentado afigurava-se monstruoso.

Intimado pelo rei a devolver os prisioneiros e o produto da pilhagem, ele recusou-se com arrogância, tornando assim evidente a incapacidade do doente de se fazer obedecer.

Imediatamente Saladino acorreu do Egito e invadiu a Galiléia, incendiando e devastando as colheitas, capturando rebanhos e semeando pânico por toda parte.

Renaud de Châtillon suplicou ao rei que salvasse seus feudos. Balduíno concedeu, vencendo Saladino em julho de 1182.

Em agosto, o infatigável maometano tentou tomar Beyrouth por uma ação combinada por terra e mar.

Uma vez mais Balduíno afastou o perigo. Impediu Saladino de se apoderar de Alepo e conduziu uma expedição até os subúrbios de Damasco.




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