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Hidrelétricas e a geopolítica das energias renováveis na Amazônia





Hidrelétricas e a geopolítica das energias renováveis na Amazônia

Carlos Potiara Castro

Abstract

This article aims to reflect on the strategic importance of hydroelectric energy generated in the Amazon region for the interconnected Brazilian system. Its quantification shows a regional potential for higher energy generation compared to the current production of pre-salt oil. We consider this issue from the perspective of the geopolitics of renewable energy that brings new and relevant elements. In this article, the analytical framework focuses on path-dependence, smart-grids and energy-intensive societies and their energy security policies. As a result, we observe that in the current configuration, the advent of renewable energies can be an additional element of a long-term economic specialization of the Amazon, with worrying consequences from a socio-environmental perspective.

Keywords:
Path dependence; Energy security policies; Energy-intensive societies; Amazonia

Resumen

Este artículo tiene como objetivo reflexionar sobre la importancia estratégica de la energía hidroeléctrica generada en la región amazónica para el sistema nacional interconectado. Su cuantificación muestra que existe un potencial regional de generación de energía superior a la producción actual de petróleo pre-sal. En este estudio, el tema es considerado desde la perspectiva de la geopolítica de las energías renovables, lo que aporta un conjunto de elementos nuevos y relevantes al tema. El marco analítico de este artículo se centra en la dependencia de la trayectoria, las redes inteligentes y las sociedades intensivas en energía y sus políticas de seguridad energética. Se concluye que, en la configuración actual, el advenimiento de las energías renovables puede constituir un elemento adicional de especialización económica a largo plazo en la Amazonía, con preocupantes consecuencias en la perspectiva socioambiental.

Palabras-clave:
Dependencia de la trayectoria; Políticas de seguridad energética; Sociedades intensivas en energía; Región amazónica

Resumo

Este artigo objetiva realizar uma reflexão em torno importância estratégica da energia hidrelétrica gerada na região amazônica para o sistema nacional interligado. Sua quantificação mostra que há um potencial regional de geração de energia superior em importância à produção atual de petróleo do pré-sal. Neste estudo, considera-se a questão sob a ótica da geopolítica das energias renováveis, que traz um conjunto de elementos novos e relevantes para o tema. O quadro analítico deste artigo centra na dependência de trajetória, nas redes inteligentes e nas sociedades energo-intensivas e suas políticas de segurança energética. Conclui-se que, na configuração atual, o advento das energias renováveis pode constituir elemento adicional de uma especialização econômica de longo prazo da Amazônia, com consequências preocupantes na perspectiva socioambiental.

Palavras-chave:
Dependência de trajetória; Políticas de segurança energética; Sociedades energo-intensivas; Região amazônica

1 - Introdução

Há uma ampla gama de motivos pelos quais a discussão sobre a energia se coloca historicamente para a geopolítica. O mais recente deles se relaciona ao processo de transição para as novas energias renováveis1. São as consequências dessa transição que são relevantes para as relações de poder entre estados e para a economia, pois ela levará a uma redução da dependência de energia de origem fóssil e dos conflitos potenciais que a acompanham (MATUTINOVIĆ, 2009, p. 4252). Área de interesse crescente, a geopolítica das energias renováveis se estabelece na academia sobretudo a partir da década de 2010, com um aumento expressivo de publicações científicas sobre o tema. Parte de seus autores afirmam que a necessidade de independência energética foi um dos motivos principais para o financiamento das pesquisas tecnológicas que tornaram as novas fontes renováveis viáveis. Por outro lado, é lembrado que a dependência não desaparece por completo, mas ela é reduzida em intensidade e transicionada para a oferta de outras commodities, como as terras raras.

A transformação acelerada da matriz elétrica do país, em que a produção eólica se torna a segunda maior fonte de fornecimento, ultrapassando em posição as termelétricas, e que vê a fonte solar crescer a taxas de três dígitos ao ano, é um exemplo de um fenômeno extenso e global. Com as novas fontes de energia renováveis, geralmente estabelecidas mais próximas das regiões consumidoras, a gestão do sistema integrado de transmissão de eletricidade cresce em importância. Nessa configuração, a geração hidrelétrica, assim como a própria termelétrica, se torna estratégica pois atua como fonte de energia firme e bateria do sistema, complementando o fornecimento das renováveis que mostram diferenças horárias de geração, assim como sazonalidade anual específica.

O Amazonas é o maior dos rios existentes e sua bacia de drenagem é uma das mais importantes, situando-se em termos territoriais logo abaixo da do Golfo de México e Caribe (WRI, 2005). Ela possui a característica única de ter o seu desenvolvimento econômico configurado sem coerência com seu curso principal. As ações coordenadas e as estratégias de desenvolvimento são oriundas de uma sociedade sudestina, de ethos essencialmente platino. Guardando traços exógenos, essas ações são marcadas pelo estranhamento, que levou a um pensamento geopolítico que se traduz, também, em uma política de segurança energética e em uma especialização econômica.

Este artigo objetiva discutir criticamente o papel exportador de energia hidrelétrica da região Amazônica. Para tanto, são desenvolvidas reflexões sustentadas em três campos do conhecimento: a geopolítica da energia; a transição para fontes renováveis e a política ambiental.

Ele está subdividido em quatro seções. Na primeira é abordado o advento das energias renováveis, o conceito de dependência de trajetória e as consequências econômicas e sociais do aprisionamento em uma determinada tecnologia, nos médio e longo prazos. Nela será discutido também a instabilidade de sistemas encerrados e as políticas de segurança energética.

Na segunda e terceira seções, será abordado o aporte teórico da geopolítica das renováveis, enquanto expressão de relações de interesse inter-territorial, que embora traga novas variáveis, não impede a formação de sociedades energo-intensivas, assim como um populismo energético, que justifica amplamente a projeção de força no exterior, através de instrumentos de comando e controle. Na última parte, será realizado um dimensionamento da energia planejada, atualmente produzida e exportada por usinas hidrelétricas localizadas na região amazônica, expresso em barril de petróleo equivalente, com vista a discutir seu papel estratégico. Resultados esses que se baseiam em um estudo extenso sobre 76 usinas individuais.

Na conclusão será realizada uma reflexão sobre cenários possíveis para uma região que se tornará crescentemente exportadora de recursos energéticos, articulando uma perspectiva geopolítica e socioambiental.
2 - Dependência de trajetória e a economia política da energia

O conceito de dependência de trajetória, que afirma que uma determinada característica institucional, como a forma de organização, o padrão técnico ou de desenvolvimento econômico não se baseia nas condições atuais, mas sim é formada por uma sequência de decisões anteriores, cada qual levando a um resultado distinto (DAVID, 1985, p. 338; BERNARDI, 2012, p. 143; BALAZ; WILLIAMS, 2007, p. 39), ressurge com vigor na literatura científica a partir das discussões sobre a transição da matriz energética para as novas fontes renováveis e a descarbonização das sociedades contemporâneas (FOUQUET, 2016, p. 2; FOXON et. al., 2013, p. 146). Ele traz a perspectiva de um encerramento dos sistemas energéticos (lock-in) e realça a importância do histórico de decisões e escolhas cumulativas tomadas no passado para a compreensão das dificuldades a serem superadas na transição para as renováveis. Trata-se de uma visão que compreende que os elementos constitutivos de um sistema coevoluem e que ajuda a explicar porque a transição se torna tão complexa e não é função apenas do advento de novas tecnologias (MOORE, 2003, p. 315). Por esse motivo Fouquet (2016, p. 2) argumenta que “encerramentos e dependência de trajetória precisam urgentemente ser melhor compreendidos, suas implicações identificadas, e estratégias para lidar com eles formulados”.

É que os sistemas de energia estão sujeitos a uma proeminente dependência de trajetória de longa duração, muitas vezes acima de 50 anos, devido a suas próprias características de infraestrutura, tecnologia e mercado. As decisões que levam à adoção de uma determinada fonte de energia têm uma origem complexa, cujo histórico se perde muitas vezes ao longo do tempo, legando, entretanto, formas concretas de organização da economia e da sociedade (RUTTAN, 1997, p. 1523; FOXON et. al., 2013, p. 147). Existem vários exemplos ilustrativos das dificuldades de escapar a um encerramento tecnológico. Pode-se lembrar do processo de superação do padrão de veículo automotor propulsionado por gasolina que se consolidou entre 1905 e 1920, pelo elétrico que surge como seu real competidor a partir dos anos 2000. A história da tecnologia mostra que entre 1885 e 1905 havia três padrões disputando o público. Em 1899 foram vendidos nos Estados Unidos 1.575 veículos elétricos, 1.681 carros a vapor e 936 a gasolina. Esse caso sugere uma situação complexa, em que “a interação de vários fatores econômicos e técnicos deu ao carro a gasolina uma vantagem decisiva” (COWAN; HULTEN, 1996, p. 66). São fatores, portanto, que não foram plenamente controlados pelos próprios agentes presentes nessa arena, mas se configurou de tal forma que apenas um século depois começa a se modificar. Outro caso complexo ocorreu quando da adoção de um padrão de tecnologia para a geração elétrica a partir de usinas nucleares. Os reatores que usam água leve para aproveitamento do urânio são considerados inferiores aos que adotam outras tecnologias, entretanto eles chegaram a dominar 80% do mercado de usinas construídas ao redor mundo, por motivos históricos anteriores (COWAN, 1990, p. 545; DAVID, 1985, p. 336; CAVALHO, 2014, p. 29).

Diante do desafio aportado pela transição energética e pela descarbonização das sociedades em resposta às mudanças climáticas, compreende-se melhor que as decisões tomadas no passado, relativas a tecnologias e fontes de energia, possuem uma considerável força de inércia, que impede que sejam transformadas rapidamente e sem complexidade (RAMAN, 2013, p. 173; RUOTSALAINEN, 2017, p. 232). Por esse motivo, a combinação de opções de geração de energia, na era da transição para as renováveis, precisa ser definida ao mesmo tempo que o modelo de desenvolvimento desejado na longa duração, ainda mais que há implicações humanas tangíveis, como a necessária conexão à rede de 850 milhões de pessoas que ainda vivem sem acesso a ela (IRENA, 2019; CASTRO, 2017, p. 5, 2019a).

A produção e oferta de energia, ao longo do século XX, foi devedora da construção de um conjunto de obras de grande vulto com as quais coevoluíram a tecnologia do setor, a formação de capacidades humanas, a estruturação de burocracias de gestão e com um mercado de transação (FOXON et al., 2013, p. 148; ANSAR et al., 2014, p. 43). Nesse contexto, a construção de infraestruturas de geração de energia, como as hidrelétricas, promove um repentino aumento de oferta e por isso ela é acompanhada geralmente de planos de indução à demanda (ANSAR et al., 2014, p. 47), como a concessão de subsídios a setores produtivos que garantam o consumo do excedente de geração (NICOLINI; TAVONI, 2017, p. 413). O crescimento da renda das famílias, além das políticas de indução ao consumo leva, ao longo do tempo, a um aprisionamento do sistema, deixando poucas opções de mudança de trajetória (ver Gráfico 1). O Gráfico 1 abaixo ilustra isso ao realçar o papel de políticas de subsídios no consumo total de energia.




Gráfico 1
Relação entre consumo per capita (eixo y), expresso em toneladas de petróleo equivalente, por subsídio per capita (eixo x) em 50 países, em dólares




Cria-se desse modo uma vulnerabilidade sistêmica, que vai levar à institucionalização de políticas de segurança energética2. Essas políticas podem focar na oferta, na demanda ou em uma combinação das duas. A diminuição da demanda de energia pode ser atingida através da adoção de novas tecnologias, da atualização das unidades consumidoras existentes e da transformação dos modos de vida de uma sociedade (CAPELLÁN-PÉREZ et al., 2017, p. 761). Entretanto, a história do desenvolvimento econômico mostra que as sociedades humanas lidaram mais frequentemente com a escassez de recursos energéticos pelo aumento da oferta, através da exploração de novas reservas (FOUQUET, 2016, p. 2). Nesse ponto, Högselius e Kaijser afirmam que :



Os países dependentes de importação de energia têm historicamente adotado duas estratégias amplas para lidar com a dependência de energia e as vulnerabilidades que ela gera. O primeiro e mais óbvio foi o desenvolvimento de fontes domésticas. O segundo foi encontrar maneiras de gerenciar - em vez de reduzir - as importações de energia (2019, p. 440).

É nessa configuração que se pode entender a atuação dos países que são os polos mais dinâmicos do capitalismo global, enquanto fiadores do fluxo internacional de commodities energéticas (MOHAPATRA, 2016, p. 684). Caso mais visível por sua extensão, as operações geopolíticas no Oriente Médio para assegurar a oferta contínua de petróleo para o mercado internacional são políticas oficiais muito concretas de segurança energética. E como tal, elas foram objeto de reflexão e receberam fundos orçamentários para sua execução (DELUCCHI; MURPHY, 2008, p. 22543).

A energia se tornou no século XIX, pela primeira vez na história, uma questão geoestratégica para os governos nacionais, para importantes atores econômicos como as grandes corporações, assim como para sociedades inteiras (MATUTINOVIĆ, 2009, p. 4251). É no engessamento das formas de uso dos recursos energéticos que surge o sentimento de escassez eminente, gerador de violência, em sociedades fordistas energo-intensivas (HUBER, 2013, p. 181). E é no imbricamento entre dependência de trajetória e vulnerabilidade sistêmica que aparecem políticas de comando e controle, que constituem um dos motivos pelos quais a transição para as renováveis se tornou tão desejável para vários atores na arena geopolítica, compreendida enquanto política de potência no “fenômeno do espaço” (CORREIA, 2018, p. 95; HÖGSELIUS; KAIJSER, 2019, p. 443).
3 - Geopolítica das renováveis, smart grids e armazenamento de energia cinética

Campo analítico em formação, a geopolítica das energias renováveis vai se definir rapidamente a partir da década de 2010, com o estabelecimento dos principais elementos de um corpo de saber e de suas principais dimensões estratégicas (OVERLAND, 2019, p. 37). É um campo que desde seu início é liderado por autores e autoras advindos de instituições de pesquisa de países desenvolvidos, porém de menor peso geopolítico. Em particular os escandinavos, os Países Baixos e a Espanha. Isso é o reflexo dos fortes investimentos em pesquisa que eles realizaram em áreas afetas à segurança energética, um tema de interesse vital para esses países que possuem pouca capacidade de influência em um multilateralismo marcado pelo poder nuclear (HÖGSELIUS; KAIJSER, 2019, p. 443).

Refletindo as transformações econômicas e sociais que ainda não estão sendo plenamente vividas, esse campo produz uma literatura prospectiva e comparativa, no sentido de que seu objeto é em realidade uma transição histórica de largas consequências humanas (RUOTSALAINEN et al., 2017, p. 231). A civilização do petróleo transformou a geografia do mundo (HUBER, 2008, p. 106), suas cidades, os modos de vida das pessoas e propiciou o surgimento de novos e amplos setores econômicos, como o de serviços e o de consumo de massa. Essas transformações informam o quadro inicial de atuação da geopolítica das renováveis (SCHOLTEN; BOSMAN, 2016, p. 273).

Em uma revisão bibliográfica abrangente da literatura científica do campo, realizada por Vakulchuk et al. (2020, p. 2), foram identificados a emergência de cinco temas principais. O primeiro, que é mais frequentemente abordado, apresenta uma discussão sobre o potencial de redução dos conflitos atuais advindos de pautas energéticas, com a transição para as renováveis. O segundo sublinha quais os países e as regiões do mundo que ganharão e perderão e os cenários, positivos ou negativos, que deverão ser enfrentados. O terceiro discute as consequências da propagação das renováveis para as relações internacionais como um todo, sabendo-se da centralidade da pauta energética. E os dois últimos temas apontados por esses autores, se referem a novas áreas estratégicas: os materiais críticos para a construção de equipamentos necessários à geração de energia limpa, assim como a possível cartelização de setores de mineração desses elementos (HACHE, 2016, p. 42) e a segurança cibernética do sistema elétrico, que deverá ser cada vez mais automatizado e, portanto, passível de ataques advindos do exterior (SULLIVAN et al., 2017, p. 23).

A maioria dos autores concorda que os conflitos tendem a ser reduzidos com a transição para as renováveis, mas existem vários fatores em jogo que precisam ser levados em consideração. O primeiro é que o petróleo não deixará de ser a fonte primária de energia no médio prazo. Hoje as renováveis representam apenas 4,05% do total de energia consumida e não deverão ultrapassar a casa do 28% em 2050 (BP, 2019; IRENA, 2019). Logo, as questões territoriais relacionadas ao petróleo permanecem (MOHAPATRA, 2016, p. 690; AUGÉ, 2014, p. 24). Além disso, a segurança territorial para o trânsito de energia se aplica igualmente às energias renováveis. Nessa perspectiva, Sullivan et al. afirmam que “ na situação de produção e transporte de energia renovável em larga escala sob a forma de eletricidade, o princípio do controle territorial será semelhante ao dos oleodutos e dos gasodutos” (2017, p. 41). No mesmo sentido, Paltsev afirma que:



assim como no caso dos combustíveis fósseis, os países de trânsito no comércio de eletricidade são cruciais (…). Pois a maioria das questões geopolíticas que envolvem gás natural (na Europa) não ocorre entre comprador e vendedor, mas entre um vendedor e um país de trânsito. (2016, p. 392).

Por outro lado, Raman chega a falar de “fossilização das renováveis”, questionando o otimismo dos que afirmam que as renováveis são intrinsecamente democráticas e igualitárias e dizendo que elas “ não oferecem almoço grátis, mas sim um conjunto de opções que são muito superiores ao combustível fóssil ou às alternativas nucleares” (RAMAN, 2013, p. 178). Já Capellán-Perez et al. (2017, p. 774) afirmam que existe o perigo, caso mantidas as mesmas características sociais de uso de energia, de se “intensificar uma geopolítica imperialista para conquistar terras e apreender recursos de outros países”. Há, portanto um consenso de que o território continuará a ser um importante fator de poder, mesmo com o crescimento da oferta de energias de fontes renováveis.

Do ponto de vista tecnológico, a introdução em larga escala das renováveis vai acarretar transformações profundas no mercado de energia e nas relações entre produtor e consumidor (PHUANGPORMPITAK; TIA, 2013, p. 286). Elas vão exigir a implementação de uma rede elétrica distribuída, com novos mecanismos de equilíbrio sistêmico, uma transformação que vai ser chamada de “infraestrutura energética com sistemas sociotécnicos complexos e adaptativos” (SCHOLTEN; BOSMAN, 2016, p. 275). Além das grandes geradoras, os próprios consumidores se tornam também produtores e os preços da energia flutuam em tempo real, para refletir os picos de oferta e demanda (PALTSEV, 2016, p. 392). Nessa perspectiva será o gerenciamento da rede que determinará por um lado, o preço final da energia e por outro, o próprio sucesso da adoção das renováveis em maior escala (HACHE, p. 39, 2016). Para responder às necessidades de gerenciamento da rede, será necessário a adoção de redes inteligentes (smart grids), em substituição de um sistema inflexível, usando a tecnologia digital para a automação do controle, monitoramento contínuo e otimização do sistema de distribuição (ARCIA-GARIBALDI et al., 2018, p. 298; PHUANGPORMPITAK; TIA, 2013, p. 284).

A questão que justifica a implementação de smart grids é a intermitência da produção de energia renovável, a cada momento do dia (FOXON, 2013, p. 155). A geração eólica, solar ou de maré possuem essa característica inerente, de não conseguir prover energia firme consistentemente, e a gerada a partir de biomassa, em sua maior parte, conhece uma sazonalidade anual (OVERLAND, 2019, p. 38). Por isso, para acomodar uma porcentagem mais alta de energia renovável, a rede elétrica precisará de grandes quantidades de energia convencional de reserva e de uma enorme capacidade de armazenamento de energia (BARBOSA et al., 2016, p.100). Serão na maior parte das vezes as próprias usinas convencionais termelétricas ou nucleares, além das baterias de lítio de grande porte, que ajudarão a responder à intermitência no fornecimento de energia pelas renováveis.

A opção de backup limpo, que viabilize o uso das renováveis, é a energia gerada por usinas hidrelétricas (PÉREZ-ARRIAGA et al., 2016, p. 766; ANSAR et al., 2014, p. 48). Seus reservatórios funcionam como armazenamento de energia cinética em larga escala (HUNT, 2020, p. 2; IMMENDOERFER et al., 2017, p. 231), que pode ser transformada em eletricidade rapidamente, alimentando o sistema integrado com energia firme. É nesse quadro que surge o projeto norueguês de prover serviço de armazenamento, se tornando a “bateria verde” da Europa, com a previsão de transporte por cabos submarinos de parte de sua produção nacional de hidreletricidade, uma das maiores do mundo (GULLBERG, 2013, p. 616). Caso implementado, esse projeto modificará o status geopolítico desse país, em nível regional, aumentando o seu poder de barganha na agenda energética (SCHOLTEN et al., 2014, p. 279).

As hidrelétricas amazônicas em operação, assim como o seu imenso potencial a ser aproveitado, passarão a desempenhar um papel ainda mais central na geopolítica energética brasileira (TAVARES et al., 2006, p. 109). As barragens localizadas na Amazônia possuem um forte passivo ambiental (FEARNSIDE, 2015b, p. 16; CORRÊA, 2016, p. 234; FLEURY; ALMEIDA, 2013, p.142), que resulta em grande parte de uma relação petrificada com as regiões platinas do país, que direcionam as políticas regionais (BERMANN, 2012, p. 6). Sobre esses aspectos, Nascimento e Castro, abordando a construção da hidrelétrica de Belo Monte, chegam a falar da “criação de territórios de exceção” onde a norma jurídica não se aplica (2017, p. 141). Por paradoxal que seja, uma das principais fontes que viabilizará a implementação de projetos em larga escala de geração de renováveis será um conjunto de barramentos que submergirão florestas em pé, terras de povos originários e de populações tradicionais (FEARNSIDE, 2015a, p.42; CASTRO, 2004, 2008a, 2011).

Por detrás dos planos de implantação em larga escala de projetos de geração de energia renovável estão projetos de desenvolvimento desenhados para incrementar a demanda de um tipo de sociedade que usa de forma intensiva bens energéticos. Uma reflexão sobre essas sociedades se faz, portanto, necessária, assim como sobre suas instituições e políticas de segurança energética.
4 - Sociedades energo-intensivas e políticas nacionais de segurança energética

Historicamente, o crescimento da intensidade de emprego de energia ocorre em sistemas socio tecnológicos em que se observa uma coevolução dos conhecimentos sobre o aproveitamento das fontes disponíveis e da adaptação da sociedade ao seu uso (CARVALHO, 2014, p. 26; RUOTSALAINEN et al., 2017, p. 237). A era do petróleo se confunde com o século XX e com um processo de transformação acelerado das sociedades humanas em escala planetária. A adaptação social a uma nova realidade tecnológica ocorre junto à estruturação de pactuações sociopolíticas entre os diversos atores sociais, em um ambiente transformado.

A América do Norte foi vista em seu apogeu como um modelo para outras sociedades. O fordismo, que surge nesse país, tornou em bens de consumo os meios de transporte, mas foi pela coalizão pelo New Deal, que dominou o espaço político desse país até o final dos anos 1960, que foi dado ao trabalhador meios de bem-estar, baseado em grande parte no consumo de massa e de energia abundante. Sobre esse aspecto, Matthew Huber afirma que:



Ironicamente, embora o fordismo tenha sido institucionalizado por meio da solidariedade pública do liberalismo do New Deal, ele ajudou a produzir uma geografia bastante privatizada da reprodução social (…). Essa aparência de autonomia foi alimentada pelo consumo volumoso de derivados de petróleo (...). O papel crucial do petróleo foi de impulsionar uma extensa espacialidade do consumo de massa, que foi chamada de “privatização móvel”: automobilidade; habitação unifamiliar particular; espaçosos jardins e quintais; e extensas distâncias entre casa, trabalho, áreas comerciais e espaços de lazer (2013, p. 179).

Podemos nos referir, portanto, a um populismo energético em que a oferta farta de derivados do petróleo ajuda a sustentar uma pactuação social, que tem em um de seus vértices uma política externa de segurança energética (MOHAPATRA, 2016, p. 694). Pois se as pessoas comuns de uma tal sociedade não conseguem perceber as consequências das políticas de projeção de força no exterior, elas são, entretanto, amplamente beneficiárias delas. É como se, apesar da perda de liberdade individual em uma sociedade alienada e massificada (HUBER, 2008, p. 108), houvesse um bem-estar promovido pela abundância de energia disponível.

É nesse contexto de incorporação de um modelo societal ao redor do mundo (CASTRO; FERREIRA, 2013, p. 260; CASTRO, 2008b, 2019b), que o Brasil se torna igualmente energo-intensivo. Ao crescimento econômico ocorrido na década de 2000 até meados da de 2010 se acompanhou o aumento interno de demanda de energia, tanto elétrica como fóssil. Uma tendência que é observada globalmente, como mostra o Gráfico 2, abaixo. As descobertas de novas jazidas de petróleo e a construção de termelétricas responderam pela maior parte do aumento da demanda de energia. Mas no planejamento de fornecimento para o país, a hidreletricidade constitui um componente fundamental. A maior parte do acréscimo da eletricidade foi oriunda de barramentos na bacia amazônica.




Gráfico 2
Variação do PIB e do consumo de energia no mundo 1998-2007




Cabe lembrar aqui que as políticas energéticas e de ocupação da Amazônia contemporâneas foram delineadas sobretudo nos governos autoritários militares. Enquanto a geopolítica interna dos militares (PROST, 2000, p. 4) se referia à Amazônia enquanto Brasil marginal (CASTRO, 2014, p. 131, 2006), o planejamento de sua ocupação, delineado no 2o Plano Nacional de Desenvolvimento de 1974, “estabeleceu como objetivo prioritário reduzir em ritmo acelerado a dependência do país em relação a fontes externas de energia” (TAVARES et al., 2006, p. 106). Dessa forma, acompanhando os principais vetores de desmatamento, colocou-se como objetivo aproveitar o potencial hidrelétrico amazônico. O que gerou políticas de indução ao consumo, através de subsídios, para indústrias eletrointensivas, destinadas à exportação (FEARNSIDE, 2015b, p. 113), criando uma clara dependência de trajetória de longo prazo.

A geopolítica para a Amazônia é um componente do legado militar, cujo estudo ajuda a compreender o que ocorre hoje na região. Ela criou um estranhamento com o espaço local, já que verbalizou perspectivas platinas sobre um outro território (RAVENA et al., 2019, p. 141) e lhe definiu um papel econômico e energético (PROST, 2000, p. 28). Observa-se que os principais barramentos na Amazônia acompanham a mesma direção dos vetores do desmatamento seja, aqueles que destruíram as florestas próximas a Marabá e Tucuruí, seja no Xingu, na região da Transamazônica onde está Belo Monte, seja ainda aqueles que avançam na área cortada pela estrada BR-163, onde está planejada a construção de São Luiz do Tapajós (FEARNSIDE, 2015a, p. 428). É um conjunto de políticas públicas que surge “sob o estigma da segurança energética” (BERMANN, 2012, p. 7) e que geraram o estabelecimento de burocracias para operar instrumentos de comando e controle, específicos para a região amazônica, que se estabeleceram desde o início da ditadura militar (PROST, 2000, p. 5).

Essas políticas traduzem parte da ação do estado para a região, em um continuum, mesmo no período democrático. O Quadro 1 lista um conjunto de políticas com essas características. Nos oito últimos anos, quatro delas foram editadas ou atualizadas através de decretos presidenciais. Sob o governo Dilma Rousseff, foi instituído em 2013, durante os protestos sociais contra a construção da hidrelétrica de Belo Monte (RAVENA et al., 2019, p. 147), um Gabinete permanente que tinha por objeto atuar especificamente na Amazônia Legal, para, entre outros, “garantir a lei e da ordem” (BRASIL, 2013). Em 2019, o atual presidente lança o projeto Barão do Rio Branco (APIB, 2019; FERREIRA, 2010, p. 203) para a margem esquerda da bacia amazônica, retomando um plano da ditadura militar de replicar o padrão de ocupação da margem direita. Ato contínuo, o decreto de 2013 é substituído em 2019 por outro de teor impreciso e aberto a interpretações, mas que mantém os mesmos instrumentos de comando e controle. O governo atual modifica por fim o Conselho nacional para a Amazônia Legal (BRASIL, 2020b), que é atualmente coordenado por um general e que conta com nada menos que 23 oficiais militares como membros titulares e suplentes.


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Quadro 1
Instrumentos de comando e controle específicas para a região amazônica


Percebe-se que, tal como ocorre em outras regiões produtoras de fontes de energia, há um pressionamento, a partir de instituições nacionais que representam melhor os centros consumidores do país, sobre a sociedade e o espaço amazônico.

Os sete maiores produtores de hidreletricidade no mundo4 - o Brasil é o terceiro maior - somam 61% da capacidade instalada mundial de 1.245,8 GW (EPE, 2019a, p. 31). A maior parte do potencial hidrelétrico ainda a explorar está nos países da América Latina e da Ásia. Nesse quadro, no Brasil está previsto que cerca de 50% da expansão da produção elétrica será proveniente de fonte hidrelétrica (EPE, 2019b, p. 184). E do potencial hidrelétrico a ser aproveitado, mais de 70% estão na bacia do Amazonas (ANEEL, 2008, p. 57). Isso se dará em um contexto em que, tal como ocorre em outras regiões produtoras de fontes de energia, continuará a haver um pressionamento das regiões consumidoras sobre a sociedade e o espaço amazônico. É o que nos mostra a história da geopolítica da energia do século XX.
5 - Dimensionamento dos recursos hidrelétricos

A quantificação da geração hidrelétrica amazônica em barris de petróleo equivalente, que é universalmente utilizada na literatura geopolítica, permite visualizar a relevância estratégica que essa desempenha para o sistema produtivo e para a sociedade nacional. Para realizar o cálculo é necessário definir uma tecnologia geradora que seja alimentada por combustível fóssil e equalizar os outputs. Pela sua flexibilidade de geração de energia firme, as termelétricas alimentadas a gás natural são aptas a desempenhar esse papel, mesmo que tenham um nível de eficiência maior que a média do parque gerador a combustível fóssil brasileiro.

A literatura sobre as usinas hidrelétricas possui uma terminologia própria, adequada à sua tecnologia. O potencial hidrelétrico de uma bacia hidrográfica é estabelecido oficialmente através de ato do governo, baseado em estudos técnicos (EPE, 2019b, p. 124). Ele possui dois componentes: o potencial inventariado, que mede com precisão os aproveitamentos disponíveis para futuras obras e o potencial aproveitado pelas usinas concluídas e em operação.

O potencial hidrelétrico indica a capacidade de geração máxima, em um momento teórico de pico. A energia assegurada por outro lado, corresponde à média daquela que é efetivamente gerada. É a quantidade de energia contratada, que uma usina hidrelétrica entrega ao sistema nacional interligado de distribuição, em uma média anual. Corresponde, portanto, a um percentual do potencial hidrelétrico.

É a diferença entre a energia assegurada produzida pelas hidrelétricas e o consumo médio da região amazônica que nos dará uma dimensão da capacidade de exportação de energia e do papel geoestratégico que desempenha.

A conversão da energia gerada em megawatts para a unidade barril de petróleo equivalente adota como parâmetro a média de eficiência térmica das usinas a gás natural estadunidenses, do ano de 2014 (EIA, 2019: 168). Dada a rápida evolução no nível de eficiência das termelétricas a gás através da adoção de novas tecnologias e da maior intensidade de investimentos financeiros nos setores energéticos daquele país, a eficiência de seu parque gerador a gás é certamente maior que a nacional. Desse modo, para evitar desvios por excesso5, foi adotado como parâmetro em nossos cálculos uma eficiência média de 43,2%, ou seja, de 7.907 Btus6 para cada kilowatt-hora gerado.

A metodologia adotada na pesquisa eliminou as pequenas centrais hidrelétricas e incluiu as usinas da bacia do Araguaia-Tocantins e as do norte do Mato Grosso, localizadas em tributários da bacia amazônica.

O potencial hidrelétrico da bacia amazônica está longe de ser estabelecido, pois, estão ausentes os inventários de tributários como os rios Negro, Trombetas, Purus, Acre e Juruá além da própria calha do Solimões - Amazonas. Os cálculos oficiais do potencial hidrelétrico acompanham o avanço dos principais vetores do desmatamento.

A Tabela 1, abaixo, mostra as totalizações do potencial e da produção diária das usinas hidrelétricas na Amazônia, expressas em MWh e em barris de petróleo equivalente.


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Tabela 1
Dimensionamento da produção hidrelétrica da bacia amazônica e conversão para barris de petróleo equivalente


Para efeito de comparação, a garantia física das usinas em operação, expressa em barris de petróleo equivalente, se equipara à produção diária de petróleo de um país como o Egito. Caso a totalidade do potencial hidrelétrico for aproveitado, a energia assegurada gerada, de 2.399.832,90 barris de petróleo, se aproximaria à produção do próprio Brasil, incluindo aquela oriunda do pré-sal, conforme mostra a Tabela 2. Mais expressivo ainda é o resultado do cálculo da energia disponível para ser exportada atualmente em barris de petróleo equivalente, que posiciona a região como a 15o maior exportadora do mundo, entre o Azerbaijão e a Argélia.


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Tabela 2
Maiores produtores globais de petróleo, incluindo a Amazônia


A fonte hídrica correspondeu a 80% da geração de eletricidade nacional em 2017 (EPE, 2018, p. 5). A hidreletricidade é considerada uma fonte renovável e não sofre com as previsões de esgotamento evidenciadas na curva de Hubbert para os recursos fósseis (MATUTINOVIĆ, 2009, p. 4255). E como afirma a EPE, “na atual conjuntura de inserção de fontes de energia renováveis variáveis, como as fontes eólica e solar, de natureza intermitente, aumenta a importância das usinas hidrelétricas com reservatório, para a operação e segurança do sistema” (2018, p. 14).

Nesse contexto, é de se esperar que a hidreletricidade gerada na região amazônica venha a caracterizá-la como uma grande exportadora interna de energia, advindo daí sua posição geoestratégica para o sistema produtivo e para a sociedade nacional.
5 - Conclusão

Buscou-se com este artigo realizar uma reflexão sobre a transição para as energias renováveis, focando em três elementos principais. Primeiramente, sobre a dificuldade de realização de uma transição tranquila das fontes fósseis para um conjunto amplo de novas formas de geração de eletricidade. Existem relações íntimas dificilmente elimináveis, entre tecnologia, setor produtivo, sociedade e sistema regulatório, em uma dependência de trajetória, cujo significado original muitas vezes se perdeu na história. Essa relação impõe igualmente uma redução da margem de manobra para modificações aprofundadas em um sistema energético, constituindo, portanto, um trancamento de opções.

Em uma segunda perspectiva, apresentou-se o campo de estudo da geopolítica das renováveis. Trata-se, como vimos, de um pensamento prospectivo sobre processos que ainda estão se consolidando ou que vão surgir em um futuro próximo. Dentre os vários elementos em discussão, há a perspectiva de redução de conflitos armados tidos como originados pelo uso intensivo de derivados de petróleo. Mas é a questão tecnológica, que esse campo discute, que é mais relevante para esta pesquisa. A geração de energia com as renováveis é disseminada em uma rede distribuída, em que centenas de unidades geradoras se interconectam para atender ao consumo local em um dado momento. A administração de uma rede inteligente se torna estratégica desse modo, sobretudo se houver trocas transfronteiriças. A gestão dessa rede deve prever a variação natural da geração pelas renováveis, com o uso de baterias, de termelétricas ou de hidrelétricas para garantir o aprovisionamento de energia firme e evitar interrupções de fornecimento. O armazenamento de energia em barragens para sustentar os sistemas interligados de outros países e regiões se torna dessa forma uma questão geoestratégica, segundo a literatura do campo da geopolítica das renováveis.

O terceiro elemento abordado é o do advento de sociedades que se constituem enquanto grandes usuárias de energia. Refletir sobre elas constitui uma questão relevante pelo fato de se prever que, sem a transformação de sua natureza, dificilmente os problemas já conhecidos gerados pelo uso de fontes fósseis, do ponto de vista geopolítico, serão superados. O surgimento daquilo que podemos chamar de um populismo energético tendeu a realizar projeções de força externas para garantir a abundância de energia interna e um tipo de bem-estar social que constituiu uma pactuação entre setor produtivo, trabalho e governo. Ora, é a lógica que se encontra por trás desse modelo de sociedade que gera políticas de segurança energética, através de instrumentos de comando e controle. A análise que se realiza é então em torno da posição que ocupará a região amazônica enquanto fornecedora de energia firme. Ainda mais sabendo que desde o início de sua ocupação contemporânea pela margem direita, planejada a partir de uma “geopolítica interna” dos militares no poder, instrumentos de comando e controle foram instituídos especificamente para essa região. Assim como, desde o início, a geração hidrelétrica amazônica foi percebida como um elemento geoestratégico.

Junto com esses temas, foi realizado um dimensionamento da produção hidrelétrica amazônica convertida em barris de petróleo equivalente, que é a unidade natural de discussão no campo da geopolítica da energia. Com esses números foi possível ter uma medida de quão importante é a exportação de energia para o resto do país, equivalendo à de importantes países exportadores.

Desse modo, este artigo buscou levantar questões para a realização de um debate circunstanciado sobre os impactos da transição energética, interpretados pelo campo da geopolítica das renováveis, sobre regiões com alta capacidade de armazenamento de energia. No caso amazônico em particular, poderá se constituir em mais um problema socioambiental. Que incentivará os principais vetores de transformação da cobertura vegetal e de destruição da floresta em pé. Algo em princípio inesperado, visto as promessas trazidas pelas renováveis, de transformação das sociedades contemporâneas.

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Hidrelétricas e a geopolítica das energias renováveis na Amazônia

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