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O BANQUEIRO E O PASTELEIRO

Um dia desses meu futuro genro me disse que o banco onde trabalha demitiu 60 funcionários da área de marketing. "Tá cortando da própria carne", foi com esta expressão que descreveu a gravidade da situação. Recebi esta notícia com indignação. "Mas como pode? Banco tá sempre lucrando bem!", foi o que disse na hora. Aí ele completou falando que o aumento do lucro não foi o esperado. Então eu continuei manifestando minha aversão a esta postura do setor bancário. "O que eles estão querendo? Se em um ano lucrou 20%, depois, no ano seguinte, quer lucrar mais? E depois mais, sempre mais? A coisa não pode ser assim! A economia tem um limite! Tem um teto!". Gesticulava, fazendo com a mão esquerda o tal teto, e a direita batendo neste limite. E o pensamento, revoltado, girava, e nem sei o quanto disse ou o quanto pensei de elementos do tipo: "Ganância! Exploração! Só eles querem lucrar assim? A economia não aguenta!".

Bom, vamos segurar esta primeira situação que vivi, porque, poucos dias depois, tive uma outra conversa, que serviu como perfeito contraponto. Mas antes é preciso contextualizar. Estava voltando a pé para casa e, ao me aproximar do viaduto em obras e ver os tapumes cobrindo quase toda a parte da passagem dos pedestres, pensei: "Será que o Manoel perdeu o ponto mesmo? Talvez a prefeitura o tenha mandado para outro lugar de São Caetano... Ou suspenderam a licença e ele está tirando uma folga...". Porém, logo após passar por baixo do viaduto, eis que vejo, do lado esquerdo, a Kombi dele, com várias abelhas em volta, atraídas pelo doce do caldo de cana. Percebo que está nas arrumações finais.

– E aí Manoel! Então você conseguiu continuar com o seu ponto aqui? Eu até pensei que, com toda essa obra do viaduto, cê tinha perdido...

E o papo continua, com comentários sobre o seu novo local de venda de pastéis, poucos metros distante de onde estava, afastando-se somente o suficiente para fugir da área em obras, porém mantendo-se ainda em região de passagem de grande fluxo de pessoas, perto da entrada do hipermercado e do ponto de ônibus. Ressalto estes pontos positivos e ele fala que lhe perguntaram de qual lado do viaduto queria ficar. Explica então que decidiu por este lado porque do outro poderia haver complicações envolvendo uma casa nas proximidades ou, em outras palavras, as abelhas poderiam causar transtornos àqueles moradores... Pois bem, este é o contexto que precisava colocar antes de partir para o que o Manoel me contou, em determinado ponto da conversa, e que caiu como uma luva, no sentido de fazer um perfeito contraste com o pensamento dos banqueiros. Veja se eu não tenho razão. Disse-me ele:

– Outro dia uma senhora veio falando comigo, ela quase nunca tinha passado por aqui. Então ela pediu um pastel e eu disse que tinha acabado. Aí a véia já foi reclamando que eu tinha que trazer mais pastéis, que eu não podia parar naquela hora e isso e aquilo. Então eu respondi que tenho uma meta, vendendo um tanto por dia, pra mim tá bom. Disse que não adianta eu já ir trazendo mais pastéis no dia seguinte, porque a coisa não funciona assim, tem dia que vende mais, mas tem dia que vende menos, e eu não quero voltar com massa pra casa. Mas ela foi insistindo, dizendo que se abrir uma outra banca aqui do lado aí é que eu ia ver, e tudo mais... Aí eu falei: “quero ver se ele vai colocar o pastel a cinco reais como eu e, se colocar, faço por quatro, e quero ver qualidade do dele...”. Então, como ela não parava, acabei falando assim: “Olha, minha senhora, quer saber de uma coisa? Porque eu faço assim? É porque eu não tenho ganância! Chegando na minha meta do dia, pra mim está bom, entendeu?”. Aí ela foi saindo, com um bico na cara e resmungando alguma coisa...

Desnecessário comentar, tampouco colocar uma moral nesta história. Esta parte pode, caso se queira, ficar a cargo de quem lê. De minha parte, só me resta colocar um título neste texto, que ainda não foi rotulado com nenhum nome. Acho que este cai bem: “O banqueiro e o pasteleiro”.



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O BANQUEIRO E O PASTELEIRO

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