| Duas semanas de silêncio. Trezentas e trinta e seis horas de mudez. Vinte mil e cento e sessenta minutos daquilo que não foi dito. Um milhão, duzentos e nove mil e seiscentos segundos entalados na garganta seca acumulando a tosse. Enfim, um escarro. Um som, uma qualquer cacofonia que represente o auto silenciamento. Por que não disse? Ora se por fim chegar a esta questão é preciso que eu mesmo me responda: Para quem não disse? Quem é você, ó leitore, que me acompanha e não me cobra! Sentes tu minha falta também no silêncio? Eis tua maneira de demonstrar que estás comigo? Dividindo a ceia pouca das palavras sem maiêutica. Ora! Que talvez tenha me faltado a textosterona. Que certamente me faltou o café e me sobrou o cansaço. A preguiça não precisou fazer morada no corpo esgarçado como a uma blusa a que tanto se puxou a gola. Semaninha filha da puta! Esta, e a outra. Puxo mais a gola, mas o que enforca também reforça o punho serrado. Abriu-se o pulso. A dor física é um anzol me rasgando a boca e o verbo, me puxando para fora de onde esse sêmen hiperbólico e colorido me fertiliza em letras cursivas. Que mentira! Há anos que não escrevo cursivamente, mas apenas em “letra |
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bastão”. Talvez por que há muito já não vejo a vida como um curso (Desculpa Heráclito, eu sou o fluxo, a vida não, foi estancada, ou secou como o sistema Cantereira), ou talvez por estar sitiado. Big Stick Politics em meus sentimentos profundos e profanos. Sinto na alma as cacetadas de não ter conseguido dizer. Parágrafos inteiros afogados em suspiros. Suspirar é assassinar.
Meus suspiros encerram assuntos jamais iniciados. Meus suspiros devolvem meus amores recebidos aos seus remetentes. Uma suspiração ininterrupta, uma suspiração fordista, fodida e funesta. Esses suspiros calamitosos, muito mais calantes do que calmantes, suspiros que reagendam as angústias para o próximo dia útil de ser inútil, suspiros que pedem para você ligar no horário comercial se quiser mesmo vender tua alma, se achar mesmo que ela vale alguma coisa a ponto de ser atraente no varejo.
Por que não rasga logo essa vida e se vende por atacado? A preços baixos! Faça degustação! Promoção, mas liquide todo esse estoque de você, de mim. Deixa o vazio sobrar. Encerra, suspirando, tua firma e baixe os portões. Desapareça. Quem lhe questionará sobre a falência? Falências dos verbos, da nostálgica arte de narrar apagada pelo índigo televisivo, tal extratos bancários que esvaem-se sobre prolongada luz. Não há nada que possa ser iluminado com dinheiro. Dinheiro é borracha de se apagar caráter.
E agora, o silêncio no que digo é audível, contudo, incompreensível. E de que me valeram as preces para Leminski, pedindo auxílio para que enfim eu pudesse ser reparado se reparassem naquilo que eu não digo? Mas as pessoas sequer param, por qual motivo re-parariam? Parariam duas vezes para ver o mesmo truque? Creio que não. Muitas vezes é só que eu creio: no não.
Não há abaixo assinado no supracitado. Não há citações que venham de baixo. Não há baixeza que se possa citar. Assina-se em baixo, para pouco se reparar no sujeito, que preferia ser oculto, mas esquece quando vem a narcísica rubrica.
Tome-se a mim como exemplo, ainda que seja mau exemplo, há por mim tantas rubricas em todas as minhas páginas de tantas gentes que me assinaram sem ler, que me ass-a-sinaram sem ver, que tenho lá meus motivos para não ser um digno livro, plasticamente moldado na mão de criterioso editor, mas de conservar a ignóbil originalidade de um rascunho.
Tudo o que tenho escrito ao longo deste tempo é sobre como minhas folhas foram confundidas com guardanapos, sobre como gentes diversas apenas limparam suas bocas em mim, quando deveriam inscrever-se em mim. É por isso que coleciono no corpo tantas lembranças de impressões digitais quanto santo de romaria. Todo mundo beijou, sim. Todo mundo passou a mão, sim. Mas por não ser eu estátua de caráter intocável, não me chamam de santo, me chamam de promíscuo.
A minha boca é suja sim! É suja, mas é doce. O meu estabelecimento é bagunçado sim, mas tem gerência! No entanto, por ser assim, fornecedor de amor com patentes de domínio público, confundiu-se que, logo, não pertenço a ninguém. Enganou-se. Pertenço-me a mim. Sou propriedade de mim. Esse coração de autarquia ainda responde aos ministérios das minhas próprias escolhas. Quando escolhi não dizer, fui esquecido.
Não sei o que dizer se não sei a quem digo, dito isso, dito pelo não dito, vai mais um dia que qual um balão a tarde se esvazia, perfurado pelos cílios de quem fecha o livro, adormece, porém antes, suspira.
Meus suspiros encerram assuntos jamais iniciados. Meus suspiros devolvem meus amores recebidos aos seus remetentes. Uma suspiração ininterrupta, uma suspiração fordista, fodida e funesta. Esses suspiros calamitosos, muito mais calantes do que calmantes, suspiros que reagendam as angústias para o próximo dia útil de ser inútil, suspiros que pedem para você ligar no horário comercial se quiser mesmo vender tua alma, se achar mesmo que ela vale alguma coisa a ponto de ser atraente no varejo.
Por que não rasga logo essa vida e se vende por atacado? A preços baixos! Faça degustação! Promoção, mas liquide todo esse estoque de você, de mim. Deixa o vazio sobrar. Encerra, suspirando, tua firma e baixe os portões. Desapareça. Quem lhe questionará sobre a falência? Falências dos verbos, da nostálgica arte de narrar apagada pelo índigo televisivo, tal extratos bancários que esvaem-se sobre prolongada luz. Não há nada que possa ser iluminado com dinheiro. Dinheiro é borracha de se apagar caráter.
E agora, o silêncio no que digo é audível, contudo, incompreensível. E de que me valeram as preces para Leminski, pedindo auxílio para que enfim eu pudesse ser reparado se reparassem naquilo que eu não digo? Mas as pessoas sequer param, por qual motivo re-parariam? Parariam duas vezes para ver o mesmo truque? Creio que não. Muitas vezes é só que eu creio: no não.
Não há abaixo assinado no supracitado. Não há citações que venham de baixo. Não há baixeza que se possa citar. Assina-se em baixo, para pouco se reparar no sujeito, que preferia ser oculto, mas esquece quando vem a narcísica rubrica.
Tome-se a mim como exemplo, ainda que seja mau exemplo, há por mim tantas rubricas em todas as minhas páginas de tantas gentes que me assinaram sem ler, que me ass-a-sinaram sem ver, que tenho lá meus motivos para não ser um digno livro, plasticamente moldado na mão de criterioso editor, mas de conservar a ignóbil originalidade de um rascunho.
Tudo o que tenho escrito ao longo deste tempo é sobre como minhas folhas foram confundidas com guardanapos, sobre como gentes diversas apenas limparam suas bocas em mim, quando deveriam inscrever-se em mim. É por isso que coleciono no corpo tantas lembranças de impressões digitais quanto santo de romaria. Todo mundo beijou, sim. Todo mundo passou a mão, sim. Mas por não ser eu estátua de caráter intocável, não me chamam de santo, me chamam de promíscuo.
A minha boca é suja sim! É suja, mas é doce. O meu estabelecimento é bagunçado sim, mas tem gerência! No entanto, por ser assim, fornecedor de amor com patentes de domínio público, confundiu-se que, logo, não pertenço a ninguém. Enganou-se. Pertenço-me a mim. Sou propriedade de mim. Esse coração de autarquia ainda responde aos ministérios das minhas próprias escolhas. Quando escolhi não dizer, fui esquecido.
Não sei o que dizer se não sei a quem digo, dito isso, dito pelo não dito, vai mais um dia que qual um balão a tarde se esvazia, perfurado pelos cílios de quem fecha o livro, adormece, porém antes, suspira.
Revisão: Maiara Miranda