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O Fim do Mundo

Por Daniel da Silva

Voltei do trabalho muito tarde. Era madrugada dessas bem frias, caía uma garoa bem fraquinha, mas que facilmente encharca as roupas. Naquela hora, já não se via mais ninguém no trajeto até minha casa e ao longe ecoava o som da velha motocicleta do segurança do bairro. Não vale muita coisa, mas dá um toque de conforto e me lembra que não estou de todo sozinho.


Na casa de dois andares vivemos eu, minha mãe e três gatos. Estes bichinhos foram abandonados na nossa porta duas ou três noites antes. Agora, eles fazem minha mãe lembrar como é bom ter crianças em casa.


Adentrei pelo portão e, enquanto o trancava, observava os locais escuros e iluminados da rua. Por um instante divaguei olhando a luz do poste que fazia brilhar a cascata da garoa que agora passa a engrossar. O vento gelado vinha com a chuva e, ao entrar, agradeci em silêncio por ter um lar para voltar. Eram 4h45 da manhã, inverno, e a ausência de ruídos em minha casa foi invadida pela batida abafada, ritmada ao som de algo como uma corda sendo puxada com força. Onde estavam os gatos?

Subi as escadas com cuidado. A madeira dela rangia muito em noites frias como esta. O andar de cima estava mais escuro que o normal e o cheiro forte de urina, mesclado a algo que não consigo precisar, chegava a queimar minhas narinas. A chuva castigava o mundo lá fora e eu aqui dentro relutei em entrar no quarto de minha mãe. Onde ela estava, que não sente este cheiro?

Girei a maçaneta e meus dedos procuravam desesperadamente o interruptor. Queria poder não acender a luz.

O som de ossos e carne sendo partidos, devorados e rasgados me fez gelar até a alma. Aquilo sentado no chão do quarto não podia ser humano. Havia traços de gente e restos de roupas, mas...

A criatura virou-se lentamente para mim. Seu rosto, cheio de sangue dos pobres gatos, estava destruído, como que devorado. Mas foi o que o monstro disse que me derrubou no chão.

- O fim do mundo está vindo por você!

Junto com o relâmpago, a aberração, ainda com uma cabeça de gato entre os dedos, pulou através da janela. Eu não fui atrás. O cheiro do lugar ou em qual lugar estaria minha mãe, nada disso me importava. O fim do mundo viria e eu seria o culpado. 

Ali mesmo fiquei sentado. O dia surgiu e a chuva já se fazia mansa quando escutei o som de passos em direção ao quarto. Era um homem vestindo um velho sobretudo surrado. Sua mão estava enfaixada, talvez tenha se machucado não faz muito tempo. Ele dizia que seu nome era Pedro e que era detetive. Enquanto conversava comigo, percebi uma mocinha loura que veio com ele. Ela não falava nada, mas parecia interessada nas marcas de sangue no chão. Parecia reconhecer algo.

- Pedro, vamos, o mensageiro não está mais aqui.

Eles estavam saindo, quando eu agarro o casaco de Pedro. O detetive me atira um cartão.

- Quando quiser falar, me procure.

Os dias passaram. Faz uma semana que não durmo. Estou diante de um prédio de quatro andares, parece velho, ele sabia que eu viria lhe falar.




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