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O Olhar do Menino

Foi o Olhar do menino, claro que foi. Porque ele estava ali parado no canto, impedido. E eu estava aqui, do outro lado, o de dentro, com o coração agitado e o cérebro em prantos enquanto a multidão corria entre eu e o menino, apressados, brancos e ricos, sem olhar pro lado, pro fantasma negro vestido de vermelho.
Foi o olhar do menino, com certeza. Porque me fez pensar, por alguns segundos, em todas as Vezes em que ele se sentiu humilhado, à margem, em todas as vezes em que o Garoto sentiu na pele a diferença que a cor da sua própria pele causa nas outras pessoas. Então pensei no pobre se arrumando em casa, na possível animação, na vontade, no sentimento de ansiedade misturado com o de euforia, na melhor roupa, boné e tênis, talvez suados para comprar. Pensei na mãe o abençoando, pedindo para tomar cuidado, não voltar tarde, e ao mesmo tempo, indaguei a mim mesma: será que o garoto teve mesmo a preocupação real da mãe ou será que foi tudo coisa da minha cabeça inventiva e já compadecida? Sozinho, sem nenhum amigo - mas talvez assim, a humilhação e decepção do impedimento sejam menores e a vergonha diante dos desconhecidos seja irrelevante.
Mas foi o olhar do menino, definitivamente. Porque parecia um filhotinho perdido, assustado e amedrontado pela massa branca que o engolia e ele - diferente - assumia papel de mero figurante no ensaio da vida real. Queria Ter feito mais, mas não podia - estava submissa. Fiquei olhando pra ele, enquanto aqueles olhos tristes me consumiam, me faziam pequena e medíocre, parada, sem reação. Me deparei com o garoto algumas vezes depois disso tudo, sempre com algo de comer nas mãos, no final, ele não faria mal algum a ninguém, ele só comia - vai saber como é dentro de casa - e dançava, no meio dos outros brancos, ele dançava sozinho, se igualava e parecia esquecer de tudo a sua volta. Eu queria ter lhe dito que o mundo é pequeno e que ele é grande, mas não tenho certeza de que ele acreditaria em mim. Segue em paz, garoto, faz sua dança, se diverte, promove sua própria farra e esquece daqueles que fazem questão de te esquecer.




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