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As contradições de Neymar

Nas últimas semanas, Neymar voltou a ser manchete e, como ocorre com frequência, não apenas pelo excelente futebol mas também pelos problemas na justiça. Ele, que passará à história como um craque desse mundo e não de outro, diferente de Messi e Cristiano Ronaldo, desperta amor e ódio por onde passa. Neymar é um fenômeno, um fenômeno social. Mais do que um atacante habilidoso sobre o qual repousa a escangalhada esperança do torcedor brasileiro, é também o retrato de uma sociedade adoecida e de um futebol pobre de espírito e de personalidade – embora muitas vezes essa encarada no espelho não seja tão desejável. Mas, como é mais que um jogo de bola, o futebol também é suscetível a justificações que escapam das quatro linhas da cancha e ingressam na dialética de vícios e virtudes da convivência social. 

Por isso, é preciso explicar Neymar mais do que qualquer outro jogador. Porque ele, que é imposto goela abaixo como um ídolo, é, ao Mesmo tempo, um exemplo de sucesso e de idiotice. Neymar é isso: condenado pela Receita Federal a pagar R$180 milhões por sonegação de impostos, exibe nas redes sociais um iate, um jatinho, uma Ferrari e um pedido simplório de “um Brasil mais justo, mais seguro, mais saudável e mais HONESTO”. Isso mesmo, Neymar é essa figura folclórica que, condenada por sonegação de impostos e fraude, exige, em letras maiúsculas, um Brasil mais honesto. 

Neymar é o jogador que ao final de 2015 pretendia sair da Espanha por falta de “tranquilidade tributária” no país e, dois meses depois, almejava retirar seus negócios do Brasil pelo mesmo motivo. Não satisfeito em procurar um país no qual sua ganância seja tolerada sem limites, um país no qual a segurança, a educação e a saúde sejam sustentadas por todos os cidadãos menos por ele, Neymar também gostaria, como pediu seu pai durante a negociação com o Paris Saint-Germain, que outros pagassem suas multas pelos crimes de sonegação de imposto, fraude e conluio – pedido que o presidente do PSG considerou obsceno. E não existe melhor adjetivo para descrever a situação. 

Mas existe uma diferença abissal entre Neymar e a vala comum da moral de cuecas - na qual estão políticos como aqueles que votaram a favor do impeachment de Dilma em nome da honestidade e em seguida foram presos por corrupção: Neymar é o xodó da Globo. A Globo, mais do que ninguém, o mimou e alimentou a deplorável imagem de um moleque irresponsável. O rugido leonino contra a corrupção, que leva seus repórteres à Guaxupé atrás de R$70 mil desviados por vereadores, se transformou num ronronar afetuoso com Neymar. No mesmo dia em que o jornal “O Globo” publica um editorial intitulado “contra a impunidade” vociferando contra a corrupção “lulopetista” o site da Globo destaca que “Neymar postou uma foto bem fofinha em seu Instagram”.

É surpreendente que a mesma emissora que procura corrupção em cidadezinhas como Dionísio Cerqueira, Prudentópolis e Itaberaba não emita nenhum tipo de condenação moral contra um sujeito acusado de sonegar R$100 milhões em impostos. Difícil, mas necessário, entender essa morosidade com alguém cujo patrimônio está sob constante suspeita e contra quem pesa um pedido formal de prisão por parte da Audiência Nacional da Espanha. O jogador aproveita esse privilégio. Como todo filho mimado, não admite ser corrigido – Dorival que o diga. Reclama volumosamente dentro de campo dos árbitros e dos adversários; fora de campo, da justiça, da imprensa, da política e do Estado. É aborrecedor vê-lo, ano após ano, dentro e fora de campo, com o mesmo desequilíbrio emocional daquele menino da Vila Belmiro. 

Neymar é essa figura luxuosa que encarna a ganância, a ostentação e a degradação ética da sociedade burguesa livre de correções normativas ao mesmo tempo em que se posta convenientemente como um pregador evangélico, “100% Jesus”. Na sua forma narcisista, é ousadia arrogante e alegria desrespeitosa. E também é um capital fictício, o jogador mais caro do mundo mesmo que nunca tenha sido o melhor; é a promessa prometida desde 2010 e que nunca se realiza, o melhor do mundo apenas para nós e para Gabão, Macau, Samoa Americana, Bermudas e Ilhas Turcas. O “novo Pelé” que nunca esteve entre os melhores da liga espanhola, que nunca foi o melhor atacante, o artilheiro ou o líder em assistência, que nunca esteve entre os três melhores da Europa segundo a UEFA. Neymar é o ídolo que se tornou um dos maiores goleadores da seleção brasileira com 70% de gols marcados em amistosos. 

Neymar é craque, mas não pode ser ídolo porque é um “júnior”. Se alguma vez coube, agora, aos 25 anos, não lhe cabe mais a pecha de moleque, nem a de promessa. Neymar é um epicentro de contradições e disso o bom futebol não pode salvá-lo, porque o futebol, dizem com razão, “não é só futebol”. Quem explicar suas contradições, explica o futebol brasileiro e, de quebra, a sociedade.


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