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O Massacre do Carandiru

   Na última segunda-feira (02), se fez lembrar o aniversário de 31 anos de um dos mais sangrentos acontecimentos da história prisional mundial:  O Massacre da penitenciária Carandiru.

  O ocorrido deixou em evidência o rumo das políticas de segurança pública e o surgimento de relevantes facções criminosas.


  Para contextualizar, o que era o Carandiru?
  Carandiru nada mais era que uma penitenciária masculina, localizada no bairro de mesmo nome, em São Paulo, e chegou a ser considerada a maior casa de detenção da América Latina, sendo vista até como um modelo de ressocialização por outros países.
  Com o decorrer dos anos, a qualidade de vida na prisão foi se esvaindo. Fatores como péssimas condições de higiene e superlotação se tornaram característicos do local e contribuíram para o Massacre do Carandiru.


  A rebelião e o massacre
  Até hoje não se sabe em exatos detalhes o que ocorreu no bárbaro episódio do dia 2 de outubro de 1992. No entanto, há relatos que podem te ajudar a entender.

  A prisão, que tinha a capacidade para cerca de 4 mil Detentos, no momento abrigava quase o dobro disso. E diante do contexto de superlotação, carência de recursos e de atenção adequada, um desentendimento começou na quadra do pavilhão 9, durante uma partida de futebol. Uma discussão entre dois prisioneiros de grupos rivais desencadeou uma briga generalizada, que foi tida como rebelião pelos funcionários.
  Nos depoimentos de militares, foi relatado que a rebelião tomou grande proporção, com construção de barricadas, queima de documentos, destruição das celas e assassinato de detentos por gangues rivais.
  No entanto, não é dessa forma que a história é contada pelos presos. Detentos negam e questionam essa versão: "Não tínhamos nenhum refém, então, como poderia estar ocorrendo qualquer tipo de negociação com a polícia? Por que tacar fogo nas celas onde ficavam os nossos pertences? Os registros nem ao menos ficavam no Pavilhão 9, como os detentos os teriam incendiado?”. 
  A rebelião chegou às principais autoridades do Estado. E, de acordo com elas, não havia chance de negociação. Já na versão dos prisioneiros, houve negociação e rendição. 
  Porém, o que é certo, é que após ordens do coronel Ubiratan, o local foi invadido por cerca de 330 policiais armados e com cães, que deveriam reagir "ao mesmo nível" dos presidiários. 
  Os detentos do Carandiru foram vítimas do maior massacre carcerário da história do país, repleto de cenas de brutalidade e violência extrema, contabilizando 111 corpos na divulgação oficial. Mas há relatos de presos que simplesmente desapareceram após o fatídico dia.
  Durante uma manifestação em 2 de outubro de 2015, o sobrevivente José Aguiar declarou "estamos cansados de saber que foram mais de 300 pessoas".

  Os relatos da violência
  Presos relatam que os homens do GATE (Grupo de Ações Táticas Especiais da Polícia Militar do Estado de São Paulo, a PMSP), metralhavam seus colegas já rendidos dentro das celas e que policiais militares riam enquanto matavam os detentos com tiros e facadas. 
  Sobreviventes contam que policiais colocaram um grupo pelado e de bruços no chão de um pátio e chamavam dois por vez para serem mortos a punhaladas diante dos outros. Já os feridos, eram jogados no buraco do elevador para morrerem com o impacto da queda.
  Após a chacina, prisioneiros sobreviventes expõem que foram obrigados a alterar as cenas do crime. Eles apanharam e carregaram os corpos de seus ex-companheiros de cela. Alguns desses homens foram mortos por PMs enquanto faziam o trabalho ou foram trancados em celas e dilacerados por cães da polícia.
  Toda a ação durou em torno de 15 a 20 minutos. No fim, os corredores do Pavilhão 9 se transformaram em rios vermelhos após a água dos tubos de encanamento se misturar com o sangue das vítimas.
Ex-detentos consideram ter sobrevivido a um holocausto.


  Após o massacre
  Cinco meses depois, o Ministério Público acusou 120 policiais militares de homicídio, tentativa de assassinatos e lesão corporal de 111 detentos. Ubiratan, o coronel mandante da invasão, foi condenado a 632 anos de prisão pela morte de 102 dos 111 prisioneiros do complexo penitenciário. Ele recorreu da sentença e a sentença ela foi revertida, sendo anulada pelo Tribunal de Justiça de São Paulo em 2006. Porém, no mesmo ano, o Ubiratan foi encontrado morto. 
  Menos da metade dos militares foram condenados, e grande parte das vítimas faleceu e não tiveram seus algozes punidos.
  Houve uma denuncia na Comissão Interamericana de Direitos Humanos, que aponta que “a ação da polícia foi efetuada com absoluto desprezo pela vida dos detentos, demonstrando-se uma atitude retaliativa e punitiva”. Para o órgão, o Estado brasileiro falhou com seus cidadãos. A entidade recomendou que se adotassem medidas de indenização e amparo às vítimas e suas famílias e que se estabelecessem programas de reabilitação e reinserção social.
  Em 2002, a Casa de Detenção foi fechada e se transformou na famosa Praça da Juventude, a Biblioteca de São Paulo e duas instituições de ensino, a ETEC das Artes e a ETEC Parque da Juventude.
  Consequências
  Para alguns, a chacina teria sido pontapé para a formação das facções prisionais, como o Primeiro Comando da Capital (PCC), em São Paulo. Até porque, a princípio a facção foi fundada justamente por sobreviventes do massacre que buscavam criar uma associação que garantisse seus direitos básicos em frente à impotência jurídica, imprensa e principalmente das forças de segurança que atuavam nas cadeias. Eles buscavam proteger os detentos da administração prisional, prometendo que um massacre como o do Carandiru não voltaria a acontecer.


  O Massacre do Carandiru é muito das vezes associado ao modelo de militarização que produz e reproduz medo e violência. O pensamento fundamentado no lema "bandido bom é bandido morto" desumaniza todo o sistema carcerário e o coloca em um cenário de tendências punitivistas e belicosas.
  Jogar histórias como a do Carandiru para debaixo do tapete faz com que a sociedade brasileira feche os olhos para acontecimentos de tamanha crueldade e que crimes como esse fiquem impunes.
  Mas memórias das vítimas do Massacre do Carandiru, as vozes silenciadas ecoam como um apelo à justiça e à reforma prisional.

Repórter: Letícia Vieira
Redatora: Nathália Messias


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