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Sofia e o pior dia do mundo

Tags: sofia

Quando Sofia tinha sete anos queria ser bailarina. Aos dez queria ser atriz. Aos 15 queria ser modelo. Aos 17 queria um namorado. Com 27 anos, Sofia coloca suas coisas em uma caixa. Ela está de mudança. Nessa caixa estão muitos objetos que ela nem se lembra o porquê de tê-los guardado.

Em meio a poeira, uma fita K7, papeis de bala e bombom, um ingresso de cinema, uma pena cor de rosa, chaveiro, um guardanapo que certamente tinha algumas palavras escritas, mas o tempo, assim como fez Sofia esquecer o motivo de tê-lo colocado na caixa, fez com que restasse nele apenas borrões. Eram muitas coisas guardadas.

Naquela caixa, Sofia encontrou lembranças dos sonhos que ao longo da vida foi se desfazendo. E diante desses "des-sonhos", ela que nunca teve problemas de auto-estima - não mais do que qualquer mulher naturalmente possui -, ao se deparar com o passado não vivido, como os sonhos não realizados, Sofia se entristeceu dela mesma.

- Não me tornei bailarina, não me tornei atriz. Nem se quer entrei na aula de teatro. Modelo então... puts! Tristeza. Ainda arrumei um bosta de namorado, que me largou pra ficar com minha amiga. Mas que vida merda... Não fiz nada. Não me tornei nada! Eu não sou nada!

Movida por um misto ímpeto de revolta e decisão, Sofia se levantou e jogou a caixa no chão, olhou-se no espelho e afirmou: “Vou entrar na aula de dança hoje!”. Respirou fundo, sentou-se na cama novamente. “Dançar é chato, não gosto de dançar!”.

Num repente levantou-se novamente e começou a tirar todas as roupas que tinha no armário. Vestidos, saias, uma blusa que não se lembrava que existia, uma calça que pegou emprestado da ex-amiga que agora está com seu ex-namorado. Sofia resolveu experimentar a calça. Tentou, prendeu a respiração, puxou, puxou e não conseguiu. A maldita calça não fechava por nada.  E do alto dos seus 1,65 e 59kg, concluiu: “Eu sou uma gorda imensa! Claro que ele iria me trocar por ela. VACA!”.

Então, antes mesmo de se decidir por retomar o sonho de ser modelo, ela já desistiu.  
Ainda com a calça semi vestida, deitou-se na cama, no meio de todas as roupas que havia tirado do armário. Ficou olhando para ventilador de teto que girava. E ali ficou uns dez minutos, deitada, apenas pensando. Quanto mais ela pensava mais profundamente deprimida ficava.

- Nossa! Preciso me matar urgentemente, minha vida é uma droga!

E com a calça semi-aberta da sua ex-amiga, atual namorada do eu ex-namorado, ela se levantou e voltou a arrumar suas coisas. Mas dessa vez muito, mas muito, desanimadamente, como se não tivesse mais sentido em nada, nem em arrumar as próprias coisas.

Não havia pior momento para o telefone tocar; e ele tocou. Era um rapaz que estava gostando dela e sabendo que estava solteira, passou a investir. De todas as abordagens do universo, ele resolveu fazer uso da mais inapropriada para o momento. 

- Tudo bem com você, minha linda?

- Não está nada bem! Está tudo horrível. Tudo péssimo. E não me chama de linda. Sou horrível! E mais, que disse que sou sua... você está maluco? Palhaçada!!!! Tenho que desligar. Tchau!

- Mas Sofia ...

Ela desligou e ficou pensando como ele era chato e inconveniente. E durante esse momento de reflexão sobre a chatice alheia, ela recebe uma mensagem em seu celular. Era do tal rapaz: “Desculpa se te liguei em um momento ruim. Só queria que soubesse que para mim você é a garota mais linda do mundo!”.

- Nossa como ele um fofo. Como eu o tratei mal. Eu sou um monstro sem alma. Por isso aquele idiota me largou para ficar com aquela vaca!

Sofia começou a chorar copiosamente escondendo o rosto no travesseiro.

De repente, um grande incômodo tomou conta dela. Era algo que vinha de dentro. Uma dor que parecia tomar conta de todo seu ser, no entanto, ela já conhecia aquela dor, já havia sentido aquilo antes. Sofia se levantou da cama e, entre lágrimas, foi até sua mesinha, abriu a gaveta e pegou o seu remédio para placar a dor das suas terríveis cólicas menstruais.


Bruno Nasser 


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