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Anavitória aposta em um som mais experimental no 3º disco autoral da carreira

O poder que só o encerramento de um ciclo carrega. O novo álbum do duo Anavitória, “Cor”, não por acaso tem 3 letras. E não à toa também se consolida como o terceiro álbum autoral das cantoras de Tocantins. Na espiritualidade, o número 3 é considerado como a união entre o corpo, o espírito e a mente, que muito tem a ver com a sensação de completude.

O conceito amarradinho se imprime em todas as 14 faixas do seu mais novo trabalho, estrategicamente lançado no primeiro dia do ano. Em um momento de encerramento de ciclos, de deixar espaço para o novo entrar, Anavitória pincela novas texturas, numa tentativa de imprimir uma nova identidade sonora que dialoga com suas raízes, com o povo brasileiro, com a tradição regional e, enfim, com sua origem. 

Lançado sem aviso prévio, como já de praxe, “Cor” tem como primeira faixa um hino de resistência, de afirmação e, de certa forma, de centralidade. “É que eu sou de um lugar onde o céu molha o chão, céu e chão gruda o pé.  Amarelo, azul e branco”, cores que remetem à bandeira de Tocantins.  “O norte é a minha seta, o meu eixo, a minha raiz”, escreve Ana Caetano, ao lado de sua parceira, Vitória Falcão, que também assina a composição da faixa que abre o Disco.

Um dos retratos mais sensíveis da dupla, a canção não aborda temas românticos que muito orbitam o repertório de Anavitória. O terceiro álbum autoral da dupla possui uma variedade temática, não muito explorada nos álbuns anteriores, que resulta em uma liberdade artística nunca antes vista. Trata-se do primeiro disco independente sem o selo e o aval da Universal Music. 

Reprodução/Instagram @Anavitoria

“Ao meu passado, eu devo o meu saber e a minha ignorância. As minhas necessidades e as minhas relações. A minha cultura e o meu corpo. Que espaço o meu passado deixa para a minha liberdade hoje? Não sou escrava dele, versos recitados por ninguém menos do que Rita Lee, em “Amarelo, azul e branco”, como um prenúncio do que estava por vir. Na faixa sobressai ainda a marcação dos tambores, que pulsam durante boa parte da música, além das diversas camadas sonoras que ela evoca.

“Cor” conta com produção de Tó Brandileone, da banda “5 a Seco”, que se divide em algumas canções com Ana Caetano. A cantora, vale lembrar, já embarca no universo da produção desde “N”, disco da dupla dedicado ao cancioneiro Nando Reis. Assim como em “N”, a elegância dos arranjos de corda e sopro são pontos altos do álbum

“Cor” é extremamente cinematográfico, não só pelas imagens de fácil associação que as canções evocam, mas também porque o disco ganhou todo um trabalho visual, que pode ser visto no Youtube. Não podem ser considerados clipes e, sim, visualizers, uma tendência do mercado do streaming. 

O álbum é uma conexão com a nossa ancestralidade, nossa língua, entre tantos outros elementos tradicionais do nosso país, numa roupagem pop que se distancia dos arranjos habituais do gênero. Porém, não se engane. Há ainda muitas canções sobre o amor e talvez o que mais resgate esse sentimento, já tão marcado e presente no DNA das canções de Anavitória, é a música “Explodir”.

Nesta canção, Ana Caetano escreve “Para você eu me desmonto. Eu quero que minha voz cante no teu ouvido. Você me lembra que não há nenhum perigo num quarto escuro para dormir”, num resgate que dialoga com a prosa romântica muito presente no primeiro disco homônimo da dupla. “Cigarra” também tem um pouco desse toque afetuoso, marca registrada da composição das meninas, num arranjo que sintetiza a delicadeza da canção, embalada pelo ukelele de Tó Brandileone e com a sutil percussão de Felipe Roseno. 

“Selva”, composição assinada por Ana Caetano e Tó Brandileone, é talvez a melhor composição do disco, a mais completa, que muito remete à música “A gente junto”, do álbum “O Tempo é Agora”, lançado em 2018. A canção é sedutora não só pelo tema que aborda, mas também pela engenhosidade das rimas feitas com palavras proparoxítonas. 

O interlude “Dia 34” (Tó Brandileone e Fábio Sá) desemboca em Ainda é tempo”, numa sensação de continuidade, sem interrupções, como se fosse uma música só. O eixo temático do amor perdura também na faixa, que possui belas sequências harmônicas embaladas no piano numa densidade que ressoa também em faixas como “Abril”, talvez a mais melancólica do disco. “Eu sei quem é você” fala sobre rupturas, encerramento de ciclos e o amadurecimento que esse período de desconexão impõe, além de desbravar novos caminhos após o reconhecimento de que os lugares ocupados perderam o sentido. “Equívoco te ouvir cantar o amor tão bem, você o desconhece. Me assusta ver a multidão te aplaudir de pé, você nem mesmo se conhece”. 

Reprodução/Instagram @Anavitória

Apesar do arranjo mais simples, “Te procuro” aborda com vigor o peso de se desconectar de alguém, mas de alguma forma, ainda manter certos vínculos afetivos. “Terra” sinaliza em uma bela metáfora um amor que resiste, não importam as adversidades impostas a todo tempo: a concretude e o pilar que são construídos e corroídos simultaneamente. A faixa possui diversas camadas sonoras: além da bateria marcando as transições e ditando o ritmo da canção, ela se encerra com um sinuoso arranjo de sopro.

“Carvoeiro” é uma das canções mais pop do disco e também uma das mais animadas, com percussão e riffs de guitarra que muito remetem ao samba reggae. “Lisboa”, faixa que encerra o disco, é de um lirismo que impressiona. A música, que tem participação especial de Lenine, empresta ao álbum um resgate do pertencimento. “Fica na minha sombra, eu posso ser teu rastro”, elas cantam numa tentativa de acolher o passado, sem deixar escapar o futuro. Se antes o tempo era agora, Anavitória chega, enfim, a um lugar em que os tempos se entrelaçam, deixando espaço para a liberdade de se permitir.



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