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O político é amado, não o filósofo

Mariângela está comigo faz pouco tempo. Ela gosta da dinâmica, mas percebeu que é algo duro. Ela me pergunta: “como você aguenta se comprometer em tantos fronts e ainda por cima criar outros? Pois a reação vem de todo lado!” Sim, eu sou uma fonte de criação de problemas. Uma metralhadora giratória de farpas intelectuais.

Ora, de fato, é uma vida nada fácil. Mas eu me acostumei a ela porque ser um filósofo está no meu DNA. Não tenho como não criticar. Ela mesmo diz: “a gente tenta ser crítico, pensa muito para ser, e só consegue de vez em quando, enquanto que em você a crítica é um instinto!”. Sim, é mais ou menos isso. Sem a crítica eu não seria eu. Nada seria.

Isso tem um preço. Só com um ego gigante podemos viver assim. Um ego no sentido de saber-se capaz, mas não a falta de humildade burra, aquela própria da chamada “arrogância da ignorância”. Não! Eu sou humilde para aprender, mas nada humilde quando se trata de dizer o que digo – pois não enveredo pelo que não estudei. Uma pessoa assim dificilmente e amada. Os políticos são amados, os intelectuais autênticos não. Um filósofo, jamais.

O filósofo de esquerda faz a crítica da esquerda. Ele faz o que o político não pode fazer, que é a autocrítica. O político se destruiria se cumprisse o dever da autocrítica. A esquerda se critica pelos seus intelectuais. O político inteligente escuta, aprende, e se modifica aos poucos, sem confessar a autocrítica. Então, se mantém amado e angaria votos. O político deve amar o intelectual às escondidas. Mas o político que não tem apreço pelos intelectuais que o criticam, são burros. Estes, não adianta, nunca serão verdadeiramente cuidadores da polis.

Desse modo, o filósofo não é amado por multidões, mas apenas por sua esposa – às vezes! Pode ser admirado pelos seus alunos e/ou pessoas que se consideram como aprendizes a ele ligado. Mas, amor mesmo, é coisa que o político desperta, não o filósofo. Pois a crítica é sempre crítica se for destrutiva. Crítica é negação. A crítica é o questionamento não do banal, mas do profundo. A filosofia é a desbanalização do banal porque faz o banal aparecer, ganhar nova cor, ser de novo visto, notado. O banal, pela filosofia, volta a espantar. E a filosofia, disseram Platão e Aristóteles, começa pelo espanto! Então, a filosofia dá mais passos, critica os fundamentos das posições ideológicas que fizeram o banal se banalizar. Essa atividade irrita. Tira as pessoas do conforto. Por isso, o filósofo não ganha amor. O amor das pessoas é indireto. Às vezes amam o que o político diz, e ele aprendeu aquilo que diz do filósofo que o criticou.

Se não é assim sempre, ao menos deveria ser.

Paulo Ghiraldelli, 63, filósofo



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