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T.S. Eliot – Versos na tarde – 16/04/2017

Rapsódia de uma noite de vento
T.S.Eliot ¹

Doze horas.
Pelos caminhos da rua
Preso em síntese lunar
A sussurrar encantos lunares
Dissolvem-se os assoalhos da memória
E suas relações claras
Divisões e precisões,
Todo poste que passo
Bate como um tambor fatalista,
E pelos espaços do escuro
A meia-noite chacoalha a memória
Como um louco chacoalha um gerânio morto.

Uma e meia,
A luz do poste gagueja,
A luz do poste rumoreja,
A luz do poste diz, “Veja aquela mulher
Que hesita na tua direção à luz da porta
Que se abre a ela como uma bocarra.
Vê-se que a barra do vestido
Está rota e suja de areia,
E que o canto do olho dela
Se retorce como um alfinete”.

A memória vomita alta e seca
Uma turba de coisas tortas;
Um galho retorcido sobre a praia
Carcomido, liso, polido
Como se o mundo entregasse
O segredo de seu esqueleto
Branco e rijo.
Uma mola quebrada numa fábrica,
Ferrugem que se prende à forma que a força abandonara
Dura e tesa e prestes a estourar.

Duas e meia,
A luz do poste diz,
“Note o gato à sarjeta, como se aconchega,
Mostra a língua
E devora um rançoso naco de manteiga”.
Então a mão da criança, automática,
Saiu e embolsou um brinquedo que corria pela pedreira.
Não pude ver nada por trás do olhar daquela criança.
Vi olhos na rua
Tentando espiar pelas cortinas acesas,
E um siri à tarde numa poça,
Um siri velho com cracas nas costas;
Prendendo a ponta do graveto que estendi pra ele.

Três e meia,
A luz do poste gagueja,
A luz do poste rumoreja no escuro.

A luz entoou:
“Veja a lua,
La lune ne garde aucune rancune,
Ela pisca um olho flébil
Ela sorri nas esquinas.
Alisa o cabelo da relva
A lua perdeu a memória.
Uma varíola lavada racha-lhe o rosto,
Sua mão retorce uma rosa de papel,
Com cheiro d’água de colônia velha e pó
Ela está só
Com todos os cheiros noturnos
Que cruzam e cruzam os cruzamentos de seu cérebro.
A reminiscência vem
De gerânios secos sem sol
E poeira nos cantos,
Cheiros de castanhas nas ruas,
E cheiros de mulher em quartos cortinados,
E cigarros nos corredores
E cheiros de coquetéis nos bares”.

A luz diz,
“Quatro horas,
Eis o número na porta.
Memória!
Você tem a chave,
A luz espalha um círculo na escada,
Suba.
A cama aberta; a escova de dente pendurada,
Sapato à porta, durma, a vida o aguarda”.

A torção final da facada.

(tradução de Adriano Scandolara)

¹ Thomas Stearns Eliot – Prêmio Nobel de Literatura de 1948
* St. Louis, Missouri, EUA – 26 de setembro de 1888
+Kensington, Londres, Reino Unido – 4 de janeiro de 1965

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