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A maturidade enjoa

Tags: maturidade

“Tenho medo de crescer.” – ouvi essa semana de uma adolescente, em um dos meus trabalhos. Quando tentei aprofundar seu raciocínio questionando o que exatamente a amedrontava no crescimento, respondeu-me sem pestanejar: “Quanto mais a gente cresce, mais temos experiências.”. Segundo ela, as experiências nos deixam maduros e precavidos para não sofrermos novamente o que já sofremos um dia, quando isso é possível, claro. Ela percebia a cautela como um malefício, uma vez que nos impedia de viver o novo despretensiosamente. “A gente vai ficando com cicatrizes do que vivemos”.

A princípio, discordei mentalmente da lógica. Sempre acreditei na ideia de que quanto mais experiências vivemos, mais maduros nos tornamos, e isso em nada é ruim. Pelo contrário, tornamo-nos cada vez mais racionais e preparados para o que está por vir. A ideia principal é aprender a lidar com as situações de forma mais madura e administrar bem a imprevisibilidade inerente à vida. “Ideal!”, pensei. Mas, depois de horas, o raciocínio dela ainda estava em minha cabeça.

Comecei a trazer para a realidade aquela lógica, para mim ilógica até então, e pensei que talvez ela tivesse razão. Muita razão. A Maturidade na maioria das vezes é providencial, principalmente quando nossas atitudes para com os outros são apropriadas e quando conseguimos conduzir situações difíceis com lucidez. A maturidade faz com que sigamos o caminho mais sábio, mais adequado. Mas até que ponto vale a pena perseguir tanta sapiência e adequação?

A maturidade acaba com a inocência! Talvez isso influencie a nossa espontaneidade e disponibilidade para o novo (e para o outro)… Fiquei pensando que talvez, em alguns momentos, a experiência impeça que a essência dos sentimentos seja exposta em sua forma mais genuína. Por mais racionais e maduros que sejamos, antes de tudo somos humanos e temos, além da razão, impulsos e sentimentos desprovidos de polidez. A maturidade traz serenidade e nos ajuda a controlar os impulsos. A meu ver, essas são duas de suas principais funções.

De forma geral, o amadurecimento emocional faz com que sigamos as nossas vidas independentemente do que aconteça e de quem apareça. Ele nos faz acreditar que, apesar das dores, dos sofrimentos e das frustrações que inevitavelmente ocorrem na vida, é preciso ter paciência. Sentimos que somos capazes de sobreviver a tudo isso. O caminho mais coerente é aceitar os infortúnios da vida e aprender a lidar com eles. Que venham as dores, perdas e frustrações. Diante delas, é melhor focar nos nossos planos, nas nossas vidas, nos nossos próprios desejos. Tudo passa, menos nós. Então, é preciso nos apaixonarmos por nós mesmos, pensarmos primeiramente em nós. Assim, mais maduros, somos mais bem resolvidos conosco e muito mais felizes e independentes.

Entretanto, nem tudo são flores. A maturidade impede aquele telefonema no meio da noite, aquele choro entalado que não saiu na hora ou na frente de quem devia presenciar. Impede também aquele “eu te amo” que nunca foi dito, não dá espaço para as paixões impulsivas, para as loucuras no meio da tarde de uma quarta-feira ou para uma declaração de amor depois de três garrafas de vinho. A maturidade impede ainda as bebedeiras, os namoros escondidos ou as brigas sem sentido por um ciúme pueril. Vergonhas, ressacas, dores de amor sem tamanho. Viagens não programadas, amnésias alcoólicas, histórias para contar aos netos depois que eles fizerem 18 anos. A maturidade impede tudo isso e muito mais, pois atitudes impulsivas e impensadas não fazem parte das vidas serenas de pessoas bem maduras.

Talvez minha sábia adolescente protagonista do tema de hoje tenha mesmo razão. Que chato aprender a se proteger! Quantas coisas deixamos de viver por falta de disponibilidade para sentir. Quantas vezes deixamos de nos envolver porque nossa experiência mostra que “não vai dar certo”. Que chato esse receio da intensidade dos sentimentos novos e imprevisíveis. Que cansativa essa sede de independência e excesso de amor próprio. Que insuportável essa febre de individualidade e egoísmo de um mundo que gira em torno de umbigos cheios de si.

Tenho certeza que não faltarão defensores da maturidade, alegando que ela é mais benéfica do que maléfica e que tudo tem seu tempo na vida. Talvez amanhã volte a pensar assim também… Afinal, não é de um dia para outro que se altera a construção subjetiva de uma vida. Mas hoje, pouco importa! Assim como as licenças poéticas, hoje escrevi por uma “licença psicológica”. Férias para o equilíbrio. Férias para a coerência. Férias para a serenidade. Um brinde à espontaneidade pueril. Um brinde à dose de infantilidade que todos nós podemos ter. Um brinde aos amores essencialmente adolescentes, passionais. Um brinde às relações com pitadas de dependência e de ciúmes impensados. Um brinde aos jovens, que reacendem em nós a intensidade dos desejos e pensamentos destemidos da juventude. Sem marcas, sem cicatrizes e com o coração aberto para viver a vida.

Ok! Fim de papo. Hoje eu só quero uma dose de whisky, um ar de incoerência e um suspiro de imaturidade, por favor.

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