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Não sou negro, mas não sou cego

Fevereiro é o Mês da História Negra nos Estados Unidos e no Canadá. A data foi proposta em 1926 pelo historiador negro Carter G. Woodson. Desde o final do século XIX, os negros comemoravam o aniversário de Abraham Lincoln (12 de fevereiro), o presidente que os liberou do cativeiro da escravidão, e do líder abolicionista Frederick Douglass (14 de fevereiro). Assim sendo, Woodson propôs que a segunda ou a terceira semana de fevereiro fosse comemorada como Semana da História Negra. Em 1976, o Mês da História Negra foi oficialmente reconhecido pelo então presidente Gerald Ford e, desde então, várias atividades são realizadas no país para homenagear a contribuição dos negros para a sociedade norte-americana, sobretudo nas escolas.

Acho louvável a proposta. Não possuo ascendência negra — não que eu saiba —, mas julgo ser de extrema importância conhecer a história e, sobretudo, as lutas do povo negro. É o conhecimento que evita que eu seja mais um ignorante repetidor de chavões. Mesmo que a história negra não seja a minha história, busco conhecê-la para entender como opera o racismo em nossa sociedade e a quem ele favorece. E também para questionar minha própria posição nessa sociedade dividida por raças e como a cor da minha pele me favorece em detrimento a outras pessoas, pelo simples fator biológico de que elas possuem mais melanina em seus organismos. Mesmo que eu não seja um branco puro, fui favorecido na loteria biológica e isso faz toda a diferença num país como o Brasil.

Não hesito em dizer que o Brasil é a sociedade mais racista do Hemisfério Ocidental. Os negros são caçados como animais nas favelas e, embora tenhamos uma população negra imensamente superior àquela dos EUA, jamais tivemos aqui pessoas da expressão de Barack Obama ou Oprah Winfrey. A classe média negra no Brasil é imensamente inferior àquela dos EUA. E se os marxistas brasileiros criticam a Beyoncé por oferecer uma resposta de classe média ao problema do racismo, sequer temos Beyoncés por aqui. O racismo no Brasil não é casual. Não começou ontem e não é um fenômeno difundido entre os menos instruídos. Desde 1526, quando os portugueses começaram a trazer negros à força para cá, o racismo favorece às mesmas pessoas que mandavam na sociedade brasileira naquela época.

Isto é algo que deveria ser dito sempre, toda vez que um negro sem passagens pela polícia fosse assassinado pela PM. Mas não é. Porque afirmar que o racismo é a pedra fundamental sobre a qual nossa sociedade foi fundada é como tornar o Brasil menos Brasil. Mas o conhecimento traz à tona a verdade, derrubando os mitos da democracia racial ou de que o Brasil é menos racista do que os EUA. A segregação aqui nunca foi legalizada, mas ela é visível. Os prédios possuem elevadores de "serviço" e babás negras são obrigadas a vestir uniformes. O Brasil acha que não precisa de um Mês da História Negra porque julga não possuir um problema racial, embora em muitos aspectos o racismo à brasileira seja ainda mais sentido e evidente do que o racismo à americana. Negar os problemas não os fará sumir. Conscientizar-se sobre eles, por outro lado, talvez nos ajude a entendê-los e propor soluções para os mesmos. Não sou negro, mas também não sou cego.


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