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Kaidan da Kitsune Ruiva

Tags: anata dake
Sora wo umeru hana no iro
Utsuri ni kerina waga koi
Yagate subete ga sugi saru ato mo
Anata dake wo omou

Itsuka haru no yuumagure
Hajimete kuchiduke shita
Maboroshi no you na kaori no naka de
Anata dake wo omou

Motome atta kanashi sa yo
Furi shikiri tsutsunde yo
Mae mo miezu, iki mo dekizu
Anata dake wo omou

Hakanai haru no katami ni wa
Ichiban kirei na watashi wo
Anata dake ni, anata dake ni
Todometai to omou

Mai odoru hana no utage
Tsuki wa tomatta mama
Mou osore mo tomadoi mo naku
Nagare yuku mama

Anata no mune ni kono mi wo makase
Watashi wa shinde yukou

Mae mo miezu, iki mo dekizu
Anata dake wo omou

Yagate subete ga sugi saru ato mo
Anata dake wo omou

Aa kono koe ga kikoe masu ka
Anata wo omou koe ga
Caminhando pela trilha dos suicidas em Aokigahara3, decidido a morrer de uma vez ou aprender de uma forma circunstancial a valorizar a vida enquanto observo os cadáveres e os esqueletos dependurados nas árvores, dezenas, centenas, eu montei acampamento em uma clareira ao final da tarde.

Ao meu redor, podia ouvir o vento balançando os corpos de forma gentil. Talvez o vento ainda tivesse toda aquela esperança do final das tardes. “Hey, acorde, viva!” dizia o vento nos ouvidos dos corpos que apodreciam. Pobre vento! Será que ele não sabe que o destino não permite o arrependimento?

Estava em uma clareira, e sim, eu ouvia o vento e os corpos balançarem, a despeito disso, podia ouvir o silêncio. Podia ouvir o meu próprio silêncio gritando. Será que eu ainda possuia uma alma para entregar aos espíritos da floresta? Será o que o vento viria balançar meu corpo? Será que o vento teria pena de mim? Será que ele choraria entre os galhos sacudindo com toda sua gentileza meu corpo apodrecido? Eu pensava nestas coisas.
O dia finalmente se foi. Os corpos foram ocultados da minha visão, mas não da minha memória. O vento também se cansou e se foi. A lua resolveu me fazer companhia. Ela brilhava indecentemente sobre as copas, e de uma compaixão quase cristã iluminava especialmente o tronco sob o qual eu estava sentado. A minha respiração emitia vapores, mas eu não sentia frio. Muito longe ouvia um riacho, mas não sentia sede. Nem um pássaro, nem uma cobra, nem o barulho de uma aranha tecendo teia. Não havia nada ali além de minerais, vegetais, e, a única coisa com sangue quente e ainda pulsando era eu.

Meu coração quase em coma, quase com vergonha de bater, acordou. Senti seus batimentos cada vez mais fortes. Na cadência de um taiko4 solitário, outros taikos solidários vieram a se somar. Seria o eco dos corações daqueles que aqui atravessaram para o submundo? Submundo pelo qual eu vim decidido a conhecer, a me apaixonar, e a adentrar sem volta? Eu deveria estar apavorado, mas eu sentia uma espectral saudação oculta entre a escuridão das folhas que me cercavam.

A lua, então, cansada, dividiu sem protestos a claridade com a fogueira que acendi. Arrumei as madeiras coletadas e com alguma umidade no centro da clareira. O rum que trouxera para entorpecer os sentidos antes de me lançar para outro mundo, usei embeber uma parte de um pano qualquer que rasguei da blusa. Risquei pedras, logo o fogo se fez. Como quem acorda de um sono de uma forma violenta, a madeira lentamente começou a estalar. Logo, a fumaça perfumada do carvão que se formava subia aos céus embaçando a minha vista da lua.

Esta floresta estava cercada de objetos de metal, de plástico, objetos trazidos aqui por pessoas que jamais retornariam às suas casas, que jamais retornariam para àqueles que as amavam. Quem sabe ainda estejam figurando em caixas de leite como desaparecidas. Pensei em quanto tempo a natureza absorveria os espólios humanos sob as raízes de tão belas árvores, testemunhas de tantos sentimentos tristes.

Foquei o olhar sob a chama que ardia, com uma violência sexual que consumia a madeira. A fumaça agora embaçava não só a visão, mas como meus sentidos. Bebi o rum, quem sabe algo incendiasse dentro de mim.

Devo ter alucinado, pois algo se movia entre as folhas. Pude ver uma cauda, depois outra. Só o que me faltava era ser atacado por um casal de raposas. Mas não era um casal. Lentamente, do outro lado da fogueira, pude ver primeiro duas caudas, mas em seguida apenas um animal. A raposa se sentou do outro lado da fogueira me encarando.

Senti-me pesado, as pálplebras fechando, não pude resistir. De um sobressalto tal raposa estava do meu lado, sentada com suas caudas pousadas em meu ombro lambendo uma das patas. Um uivo. Só pude enxergar a fogueira que ardia à minha frente.

Senti mãos, e não patas, sobre meus ombros, à minha frente deslizou de kimono festivo uma moça branca, tão branca, de cabelos arrumados e com tiaras douradas. Nunca havia visto japonesas ruivas. Estava uma à minha frente. Foi então que ela disse, e eu só pude ouvir:

“Gaijin-san, então não são curiosas estas fogueiras? E não tentas nem ocultar teus sentimentos mais escuros que estas noites? Eu sei que o que vai aí, em ti. Eu sei o que fazes aqui. Oh, Gaijin-san, as coisas não precisam ser dessa maneira. Já não bastam todas as lágrimas que escorreram? Até lágrimas apagam o fogo mais ardente com teu sal, e sem cerimônia. Deixe-me que lhe conte uma história Gaijin-san.”

Eu não poderia responder, eu não senti meus lábios. Eu não sabia nem mais onde estava.

“Tu não sabes mais o que restou de ti em ti mesmo, e o que de ti, como madeira nobre, más mãos artesãs te esculpiram, de onde tua seiva sangrou. Tu tinhas nervos, e eles foram esquecidos por quem lhe talhou os sentimentos. Oh, eu sei como tu sofres. Assim sofrem todos os mortais. Pois todas as coisas naturais amam, todas as coisas naturais se apaixonam, umas pelas outras, se consomem e então se transformam em algo. Ainda que em memórias.

Olhe tua fogueira. Olhe o amor do fogo com a madeira. O que delas se originará? Ora, enquanto tu te distraías com os pequenos tótens no caminho, não vias que atravessavas fronteiras sem caminho de volta. Pobre Gaijin-san. Por que não acendestes fogueiras em si? Deixastes o mofo incorporar lentamente as paredes de teu castelo, amigo. Esse mofo que sem ruído corrói teus metais, desfaz o cal de tuas paredes, consome o cimento de tuas fundações.

Eu sei que tudo o que tu amas, te machucou. E tu te sentes tão somente como esta fogueira, criada para lhe proteger de um frio que vem de si, e não do clima. As vezes uma brisa é capaz de lhe avivar algo, mas tão somente a brisa se vai, tu te afogas em teus próprios vapores negros de ciúmes, de esquecimento, de tédio e de revolta. Pobre Gaijin-san.

Fogueiras ardem em todas as coisas vivas, amigo. Tão somente a claridade queima, e ainda que machuca, aquece, mas tu agora não podes ver. Eu bem sei. Mas verás caro Gaijin-san, verás.

Note que esta madeira perfumada que colhestes neste chão ensaguentado de uma floresta tão testemunha de dores como a tua, e que serve como combustivel para este fogo que arde, é a mesma madeira que gera o fumo necessário para abafar e apagar esta claridade. Pois não é a fumaça das próprias fogueiras que as assassina?

Esta madeira é consumida pelo fogo que a alimenta, usando-o de seu amor. Veja que o ar, note que o ar, tão somente o ar, é apaixonado pela chama que o convida com teu brilho, e depois o mata.

A chama, uma vez que é apaixonada pela madeira, com ela gera um filho, esta fumaça que vislumbra pelos teus olhos. A fumaça, negra como o espírito das trevas, é parricida. A fumaça, louca de ciúmes pela madeira, que considera como mãe, assassina o que considera como pai, a própria chama, antes tão lasciva. Sufocando o próprio pai, a fumaça então sobre aos céus denunciando o crime. Condenada a esvair-se, como um ronin em fuga, para que não reste sequer memórias de si. Desfigurou-se em nada.

 O frio, então, acuado pelo calor que emanava do amor da madeira e da chama, não estando comovido, acabado de assistir a tudo como um kaubuki5 antigo, de um kwaidan perdido, volta a envolver cada limite de qual fora expulso, e agora se apropria sem misericórdia. Mas o frio também respeita os mortos. E é o frio quem apaga, por compaixão emprestada, as últimas chamas. É o frio, portanto, quem faz o funeral da extinta paixão. A escuridão, esposa do frio, vem gentil e sem se proununciar, cobrir com seu sudário aveludado de esquecimento, as memórias, então, finadas.

Oh, Gaijin-san, a sorte dos amores após sua função de iluminar os caminhos solitários, é a extinção de si, e após, sofrer o golpe de misericórdia das friezas, e o funeral do esquecimento. Deixe a dor ser enterrada, e esquecida.”


Subitamente abri os olhos, sem não ter notado que em algum momento eu os havia fechado. A fogueira havia se apagado. Por todo o chão patinhas estavam carimbadas na terra úmida.
Notas:

1) Kwaidan ou Kaidan (怪談, história de fantasma) é um substantivo japonês formado por dois kanji: 怪 (kai, estranho, misterioso, raro ou aparição fantasmagórica) e 談 (dan, “conversa” ou “narrativa oral”?). Em sentido amplo, kaidan refere-se a qualquer história de terror ou de fantasma, mas possui uma halo de obsolescência, que carrega a conotação de contos populares do período Edo. O termo não é mais largamente usado em japonês. Livros e filmes de j-horror, tais como Ju-on e Ringu são melhor rotulados como horā (ホラー, "horror"?) ou kowai hanashi (怖い話, "história de terror"?). Kaidan somente é usado quando um autor/diretor deseja especificamente dar um ar démodé à sua história.


2) Kitsune (狐) é a palavra japonesa para raposa. Raposas são um assunto comum no Folclore Japonês; kitsune refere-se geralmente neste contexto. Histórias as descrevem como seres inteligentes e com capacidades mágicas que aumentam com a sua idade e sabedoria. Entre estes poderes mágicos, tem a habilidade de assumir a forma humana — normalmente aparecem na forma de uma mulher bonita, uma jovem ou uma velha. Enquanto algumas histórias falam que as kitsunes usam essa habilidade apenas para enganar as pessoas — como muitas vezes fazem em folclores — outras histórias as retratam como guardiãs fiéis, amigas, amantes e esposas. Além da habilidade de assumir a forma humana, elas possuem os poderes de possessão, conseguem gerar fogo das suas caudas e da sua boca, o poder de aparecer nos sonhos e o de criar ilusões.


3)
Aokigahara (青木ヶ原), também conhecida como Mar de Árvores (樹海), é uma floresta de 35km situada na base noroeste do monte Fuji, no Japão. A floresta contém um grande número de rochas e cavernas de gelo, alguns dos quais são pontos turísticos populares. Devido à densidade das árvores, que bloqueiam o vento, e à ausência de vida selvagem, Aokigahara é conhecida por ser estranhamente silenciosa. Contam-se muitas lendas acerca da floresta. Algumas delas a relacionam com demônios e espíritos malignos característicos da mitologia japonesa e é conhecida por ser um local comum de suicídios. No ano de 2010, 54 pessoas completaram o ato na floresta, apesar de numerosas mensagens, em japonês e inglês, para que as pessoas reconsiderassem suas ações. Em média, são encontrados cem corpos por ano, alguns em avançado estado de putrefação ou até mesmo somente seus esqueletos.

4) A palavra Taiko (太鼓) significa "tambor" em Japonês. Fora do Japão a palavra é usada frequentemente para referir-se a alguns dos vários tambores japoneses (和太鼓, 'wa-daiko', "Tambor Japonês", em Japonês.

5) Kabuki (歌舞伎) é uma forma de teatro japonês, conhecida pela estilização do drama e pela elaborada maquilhagem usada por seus atores.

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