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T.S. Eliot – Poesia – Versos na tarde – 26/05/2017

A Terra Desolada², 1922
T.S Eliot¹

O Enterro dos Mortos I

Abril é o mais cruel dos meses, germina
Lilases da terra morta, mistura
Memória e desejo, aviva
Agônicas raízes com a chuva da primavera.
O inverno nos agasalhava, envolvendo
A terra em neve deslembrada, nutrindo
Com secos tubérculos o que ainda restava de vida.
O verão nos surpreendeu, caindo do Starnbergersee
Com um aguaceiro. Paramos junto aos pórticos
E ao sol caminhamos pelas aléias do Hofgarten,
Tomamos café, e por uma hora conversamos.
Bin gar keine Russin, stamm’ aus Litauen, echt deutsch.
Quando éramos crianças, na casa do arquiduque,
Meu primo, ele convidou-me a passear de trenó.
E eu tive medo. Disse-me ele, Maria,
Maria, agarra-te firme. E encosta abaixo deslizamos.
Nas montanhas, lá, onde livre te sentes.
Leio muito à noite, e viajo para o sul durante o inverno.

Que raízes são essas que se arraigam, que ramos se esgalham
Nessa imundície pedregosa? Filho do homem
Não podes dizer, ou sequer estimas, porque apenas conheces
Um feixe de imagens fraturadas, batidas pelo sol,
E as árvores mortas já não mais te abrigam, nem te consola o
canto dos grilos,
E nenhum rumor de água a latejar na pedra seca. Apenas
Uma sombra medra sob esta rocha escarlate.
(Chega-te à sombra desta rocha escarlate),
E vou mostrar-te algo distinto
De tua sombra a caminhar atrás de ti quando amanhece
Ou de tua sombra vespertina ao teu encontro se elevando;
Vou revelar-te o que é o medo num punhado de pó.

Tradução: Ivan Junqueira

¹Thomas Stearns Eliot
* Nuneaton, Reino Unido – 22 de novembro de 1819
+ Chelsea, Londres, Reino Unido – 22 de dezembro de 1880

²A Terra Inútil ou A Terra sem vida, ou a Terra Desolada –  The West Land –  é um poema modernista publicado por T. S. Eliot em 1922. Já foi apelidado de “um dos mais importantes poemas do século XX”.

Do ponto de vista formal, Eliot recorre a versos longos, textos igualmente grandes, mais próximos da prosa que propriamente da poesia. Lembra Junqueira, na introdução de sua tradução a The Waste Land, alguns aspectos da poesia eliotiana:

– o combate às palavras eleitas. Para Eliot, a meta da poesia é atingir ocorrelato objetivo da emoção e não há uma ou outra palavra específica para este fim. Todo o conjunto da linguagem deve se prestar a este papel.

– A fragmentação

– A atualização de toda a herança literária e cultural de gerações passadas, através de citações e de um processo que foi chamado de “eliotização” – modificar ou inserir as citações de tal maneira em seu trabalho que tornem-se “eliotianos”.

– a preocupação com o cotidiano e com a transcendência divina

– a aversão aos dogmas religiosos mas paradoxalmente de caráter nitidamente cristão

– momentos de alta tensão lírica ao lado de passagens intencionalmente prosaicas (uma conseqüência dos textos longos). A este propósito, o próprio Eliot diz que “no poema de qualquer duração, deve haver transição entre passagens de maior e menor intensidade, para dar um ritmo de flutuação emocional essencial para a estrutura musical do todo”, texto que nos leva a mais um item desta lista:

– a musicalidade

Todos estes elementos – uns mais, outros menos – vão estar presentes no poema The Waste Land, um longo texto dividido em cinco partes, que começaremos a analisar agora (se considerarmos que esta breve introdução não faz parte da análise). O poema vai trazer temas como o desrespeito com que o homem moderno trata o legado histórico (o vazio espiritual), a falta de espiritualidade e a necessidade, no mundo Ocidental de uma bússula para esta crise espiritual. Por se tratar de um poema extremamente complexo e longo,  a idéia é fazer uma análise, nesta apresentação, mais detalhada da primeira sessão e um apanhado geral das sessões seguintes.

PARTE 1

A epígrafe do poema é retirada de Satyricon, de Petrônio: “com meus próprios olhos vi em Cuma a Sibila, suspensa dentro de uma ampola.E quando as crianças lhe perguntavam: ‘o que queres?’, ela dizia: ‘morrer’”. Sibila de Cuma era uma oráculo que foi presenteada por Apolo com a longevidade, mas se esqueceu de pedir também a juventude. Diante de sua própria decrepitude, a Sibila deseja apenas que sua vida termine.

O ENTERRO DOS MORTOS

“O enterro dos mortos”, que trata justamente do tema da morte, o desejo de acabar com a vida tal como ela é. É preciso enterrar os mortos para germinar a terra; o enterro é esta renovação da vida, encerrando um ciclo, como se vê no conjunto de versos iniciais:

Abril é o mais cruel dos meses, germina

Lilases da terra morta, mistura

Memória e desejo, aviva

Agônicas raízes com a chuva da primavera.

O inverno nos agasalhava, envolvendo

A terra em neve deslembrada, nutrindo

Com secos tubérculos o que ainda restava de vida.

O primeiro verso é apontado como uma referência aos Contos de Canterbury (Chaucer). Abril é o mês da renascença para os europeus. E o cenário é europeu (mais precisamente um lago e um bosque em Munique, onde o poeta viu pórticos):

O verão nos surpreendeu, caindo do Starnbergersee

Com um aguaceiro. Paramos junto aos pórticos

E ao sol caminhamos pelas aléias do Hofgarten,

Tomamos café, e por uma hora conversamos.

Bin gar keine Russin, stamm’ aus Litauen, echt deutsch.

Quando éramos crianças, na casa do arquiduque,

Meu primo, ele convidou-me a passear de trenó.

E eu tive medo. Disse-me ele, Maria,

Maria, agarra-te firme. E encosta abaixo deslizamos.

Nas montanhas, lá, onde livre te sentes.

Leio muito à noite, e viajo para o sul durante o inverno.

Deste cenário familiar, passamos para um dos trechos mais terríveis do poema, com alusão do Livro de Ezequiel (que trata da perda da fé e da necessidade de purificação) e ao Eclesiastes (que começa recomendando: “lembra-te de teu Criador nos dias da mocidade antes que cheguem os maus dias e com eles a velhice”). A terra é vista como um árido deserto, com raízes que se esgalham por uma imundície pedregosa. Também aqui está o verso “vou revelar-te o que é medo num punhado de pó”, uma referência ao próprio homem (pó):

Que raízes são essas que se arraigam, que ramos se esgalham

Nessa imundície pedregosa? Filho do homem

Não podes dizer, ou sequer estimas, porque apenas conheces

Um feixe de imagens fraturadas, batidas pelo sol,

E as árvores mortas já não mais te abrigam, nem te consola o

       canto dos grilos,

E nenhum rumor de água a latejar na pedra seca. Apenas

Uma sombra medra sob esta rocha escarlate.

(Chega-te à sombra desta rocha escarlate),

E vou mostrar-te algo distinto

De tua sombra a caminhar atrás de ti quando amanhece

Ou de tua sombra vespertina ao teu encontro se elevando;

Vou revelar-te o que é o medo num punhado de pó.

O trecho seguinte tem duas citação de Tristão e Isolda, de Richard Wagner e o tema das menina dos Jacintos, recorrente na poesia de Eliot. Alguns estudiosos lembram que jacinto é um símbolo masculino, o que cria uma tensão entre os dois elementos (masculino e feminino) em “menina dos jacintos”.

Frisch weht der Wind

Der Heimat zu

Mein Irisch Kind,

Wo weilest du?

“Um ano faz agora que os primeiros jacintos me deste;

Chamavam-me a menina dos jacintos.”

– Mas ao voltarmos, tarde, do Jardim dos Jacintos,

Teus braços cheios de jacintos e teus cabelos úmidos, não pude

Falar, e meus olhos se enevoaram, eu não sabia

Se vivo ou morto estava, e tudo ignorava

Perplexo ante o coração da luz, o silêncio.

Oed’ und leer das Meer.

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