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Cooperifa - Bar do seu Zé Batidão

Sérgio Vaz e as Pessoas que fazem parte de um dos mais importantes movimentos da periferia paulista.

Seu Zé e a gata Menina

Após subir uma ladeira longa e íngreme, nos deparamos com um sobrado branco, ao lado da porta uma daquelas plaquinhas de cerveja e um pequeno felino brincando pela sarjeta. O Bar do Seu Zé Batidão é muito conhecido e bem freqüentado por pessoas que valorizam o conhecimento, especificamente, uma cultura sem maquiagens e cortes durante as filmagens da vida, a cultura e a ação da periferia.

Ao entrarmos vemos pessoas sentadas, já assistindo ao primeiro documentário da noite, “Segurando as Pontas”, com direito a pipoca e refrigerante grátis, telão e um senhor devidamente vestido de lanterninha. A cada quinze dias, sempre nas segundas-feiras, é dia de Cinema na Laje, o que não aconteceu durante nossa visita, choveu e todos foram obrigados a curtir ao cinema dentro do bar.

Tudo muito característico dos botecos, não fossem a estante repleta de livros, troféus, prêmios e esculturas, como as de Dom Quixote e Sancho Pança e uma mesa de som e vídeo profissionais, em um canto a direita de quem entra.

As pessoas daquele lugar variavam entre as faixas etárias, mas eram todas da periferia, mesmo que não fossem daquele bairro, é o tipo de coisa que se percebe em sua atitude, uma pessoa engajada e consciente ou no mínimo, em busca dessas qualidades. “Hoje vem gente de tudo quanto é lugar, mas a maioria é da periferia” confirma Sérgio Vaz, fundador do Projeto Cooperifa. Todos vão até lá em busca de algo.

O Lanterninha é incorporado pelo Sr. Henrique Costa, 84 anos, efeito nostalgia do Cinema na Laje há pouco mais de três meses, recém viúvo e vizinho do Seu Zé. O Sr. Henrique, por exemplo, busca ainda ser útil e se distrair um pouco, para superar a perda.

Recebidas pelo proprietário, Seu Zé se mostrou simpático e cordial, quase acostumado às entrevistas! Este senhor também buscava algo, por que todos os eventos culturais e sociais começaram com ele. Retirando alguns garotos das ruas, para jogar futebol e formar o time Sete Velas Caveirão, donos dos troféus na estante. Ele também gosta de animais, prova disso é a gata siamesa Menina, manhosa e dócil, que já apareceu até em uma revista de grande credibilidade e circulação.

Enquanto conversávamos com as pessoas, no tom mais baixo possível, a platéia assistia a mais um documentário, sobre os 25 anos do MST, com a participação de um ativista de 101 anos de idade, o Sr. Luiz Beltrame, que nos recitou sua poesia, retratos de sua luta centenária.

Em sua décima marcha pelo MST, o Sr. Luiz declarou em prosa sua crença no poder de pressionar o Governo, por uma vida melhor, usando como armas suas idéias e até mesmo sua idade. Sendo um exemplo de dedicação e quebra de barreiras, principalmente, para quem participa das marchas, pois são na sua maioria, jovens.

Sr. Luiz Beltrame

“Eu sou brasileiro, eu sou!/ Nessa marcha eu vou/ O homem e mulher/ Então vamos a São Paulo na Praça da Sé/ Eu sou brasileiro, eu sou!/ Nessa marcha eu tô/ Com um século de vida / Acompanhado é muito divertida/ Então vamos a Praça da Sé/ Para nós declarar como é a nossa vida!” (sic)

Sérgio é o militante da palavra, o “camelô das letras”, é como se define. “O Sarau é nosso carro chefe, saraus nas escolas da região, lançamentos de livros de poetas da comunidade, Poesia no Ar - quando soltamos poemas em bexigas - , Cinema na Laje, Chuva de Livros, Ajoelhaço, o Prêmio Cooperifa, saraus na Fundação Casa e a Mostra Cultural que acontece em outubro, envolvendo quase trezentos artistas”.

O projeto comemora oito anos, em todas as suas atividades percebemos amor a palavra, escrita ou falada, são atos emocionantes e intensos, como o Ajoelhaço, onde os homens se ajoelham diante das mulheres e pedem perdão, criando “momentos inesquecíveis como o Poesia no Ar, que já rendeu textos maravilhosos” para Vaz.

Sérgio Vaz, poeta

Encontramos com algumas pessoas que fizeram parte dessa trajetória, figuras pertencentes a algo que se pode chamar Família e Paco é um moreno sorridente, de opinião forte e dono da Pacos Produções de áudio e vídeo, em São Paulo, firmou parceria no Cinema da Laje há um ano. Mas sua história junto de Sérgio Vaz, o poeta, vem desde as palestras nas escolas. Sua participação é voluntária, o que mais lhe importa é o fato de mostrar a sociedade nua e crua, sem máscaras, sem rodeios. Com aparelhos e conteúdo de qualidade, ele fala sobre o trabalho dos documentários e o fato de serem todos amadores, feitos pelos moradores, mas com empenho profissional. Preocupados com a formação de opinião da comunidade, por outros meios de informação, além da TV.

Paco, dono de uma produtora de som e vídeo

Durante nossa conversa, Paco lembrou de uma palestra marcante, quando Simoninha, filho de Wilson Simonal, levou uma cópia original do filme sobre o pai, antes mesmo do lançamento, retratando a injustiça sofrida pelo cantor, na época da ditadura.

Nos últimos tempos, o projeto vem progredindo e sendo cada vez mais reconhecido, tendo patrocínio de entidades em alguns eventos pontuais, como o Itaú Cultural, no projeto do CD Cooperifa.

Há oito anos, dez artistas inspirados por uma idéia parecida com a Semana de Arte Moderna, se reuniram em uma fábrica abandona em Taboão da Serra para o primeiro Sarau. Não satisfeito com tamanha originalidade, o sarau não tinha características convencionais, Sérgio diz que o diferencial era associar literatura à alegria, com cara da comunidade.

Sobre a importância do projeto para a comunidade, Sérgio diz: “Dignidade. Há muitos anos a gente tinha que mentir nosso endereço para conseguir emprego. Hoje, as pessoas fazem questão de dizer que moram onde rola o sarau da Cooperifa” – a verdade, é que o os jovens não passaram por essa fase, mas imagino, se algum dia fosse obrigado a mentir sobre o local de minha moradia, é sentir-se à margem e sem opção. Isso não acontece mais, e os mais velhos, que lutaram por isso, se orgulham. É algo que se vê nos olhos de pessoas como as que se encontram no Bar do Zé Batidão.

Durante todo esse tempo, situações no mínimo curiosas se formaram, “Devido às nossas publicações com poetas da quebrada, muita gente que leu seu primeiro livro, foi justamente o livro que escreveu”. Com esse comentário de Sérgio, pensamos nas emoções distintas, que são ler o primeiro e escrever o primeiro livro, sendo experimentadas de uma só vez. Refletimos em como coisas banais para uns, podem ser marcantes para outros.

A agitação ronda o projeto, agraciado com o Prêmio Ação Campo Limpo, Sérgio foi convidado a participar do Londrix 2009 – Festival Literário de Londrina, falou sobre o seu trabalho no IV Fórum da Diversidade ASPF e representou o Cooperifa no II Encontro Cultural do CEU Vila Rubi. Com tudo isso acontecendo, nos perguntamos, o que passa em sua cabeça, o que ele pensa sobre a mídia e seu assédio? Obviamente, é um reconhecimento de seu trabalho, mas e o homem? Não resistimos e questionamos. Recebemos a resposta tranqüila da experiência, “A mídia até certo ponto é muito importante, pois devido à divulgação, muitos saraus surgiram em outros lugares, cidades e estados, inspirados no Cooperifa, mas não é uma coisa que me preocupa. Já tivemos problemas, hoje sabemos tratar melhor com isso”

E no final de tudo, a maioria volta para suas casas, enquanto umas poucas pessoas permanecem nas mesas, mas todas refletindo, questionando e discutindo, sobre o que foi visto naquela noite fria e chuvosa. Se fosse preciso definir uma moral da história, seria esta: O importante é manter o coração quente de ideais e a mente cheia de convicções.

Por Arelli Matos de Araújo(Sou eu, Diaba) e Jaqueline Souza Santos (Vulgo, P+)



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