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Chegará o dia em que estaremos preparados para sermos pais dos nossos pais?



Deste palco a que chamamos de vida e que não permite quaisquer ensaios, sairá a nossa maior obra de arte. Deveremos encará-la como um filme em que somos os principais autores. Toda a produção cinematográfica está a nosso cargo. Somos os únicos responsáveis por esse filme.

Poder-se-à dizer, que o início desse filme é o fenómeno mais belo da nossa mãe natureza. A chegada de um novo ser, o início de uma nova vida. A alegria dos Pais e de todos os familiares. As famílias cresceram como consequência do amor entre dois seres. Existirá algo mais belo?!

Aí se inicia o desempenho dos papeis dos diferentes actores desse filme. Os pais, enquanto progenitores e cuidadores, terão o papel vital nos primeiros tempos de vida desse ser. Esses primeiros meses, anos de vida, poderão mesmo ser decisivos no futuro adulto. Uma criança muito amada e educada de forma responsável, dará um adulto bem formado e preparado para a vida.

Alguns anos mais tarde, chega o momento em que a cria está pronta a sair do ninho e a levantar voo. Com algum receio, os pais incentivam-no ao seu primeiro voo. Vai, tu consegues! Se caíres, nós ajudamos-te a levantar. Mas vai! E à segunda, terceira tentativa, ele levanta voo em direcção à sua própria vida. A sua base está completa. Os pais deram por concluído o seu papel de educadores. Agora eles apenas querem saber se o filho está bem. Se a base o ajudou na formação da sua própria vida, e se fez dele um adulto feliz.

Esta fase é interessante, no sentido em que são todos adultos na família. O filho já seguiu o seu caminho, e, poder-se-à mesmo dizer que estão todos em pé de igualdade. Discutem-se ideias, temas de interesse comum, confraterniza-se em todos os momentos de reunião familiar. Aqui, no mundo dos adultos, todos assumem o seu papel, respeitando sempre  o espaço de cada um. Esse talvez seja o segredo do sucesso de muitas famílias. Apesar da família de raiz ser para toda a vida, sempre que não se respeita o papel de cada um nessa família, podem haver consequências desagradáveis a nível relacional no grupo. Como em todos os grupos, cada um tem de saber desempenhar o seu papel. Desengane-se, se pensa que pelo nome do grupo ser família, que não haverá regras a seguir e que terá livre arbítrio no mesmo.

Passam os anos e o tempo não pára. Em todo o sentido lato da palavra. O tempo passa pelas pessoas, ou, como prefiro dizer, as pessoas passam pelo tempo. Permitir que o tempo passe por nós, soa-me a uma vida que voa ao sabor do bando que a circunda, permitindo o tempo passar, de forma passiva. Já uma pessoa que passe pelo tempo, faz o seu voo de forma activa, escolhendo o canal de voo, tendo sempre em consideração que o tempo não pára e que esse voo tem de valer a pena, pois não tenciona repeti-lo. Começa aqui a inversão dos papeis. O filho bem formado, já conseguiu fortalecer as suas asas e já não precisa da ajuda dos pais. Por sua vez, pela ordem natural da vida, os pais vão enfraquecendo. Já não são o que eram. Já não são aquelas figuras de protecção a que se tinha acostumado. Agora são eles que começam a precisar de ajuda. Os pais apoiaram o seu primeiro voo, agora, o filho torna-se necessário para supervisionar os voos rasteiro dos pais. Pois a força está Cada Vez Mais fraca e a saúde começa a escassear.

Começa aquela sensação de procura pela figura forte, que nos ensinou os primeiros passos. Mas agora é essa figura que começa a deixar de conseguir andar. A inversão dos papeis continua.

Eis que chega o momento em que eles precisam de todos os cuidados. Eles, aqueles seres que nos trouxeram ao mundo. Que nos ensinaram tanta coisa, que nos acarinharam, que fizeram tudo pela nossa felicidade, estão completamente dependentes de tudo e de todos. Tal como nós tivemos quando chegamos a este mundo. Mas agora no sentido inverso. Nós vimos a seguir à introdução do livro, mas eles já estão nas referências bibliográficas.

Passa-nos um misto de sentimentos no coração, passa-nos um misto de pensamentos na mente. Um rol infindável deles. Em poucos momentos a vida deles passa-nos pela mente, como que um filme em modo rápido, com todas as emoções inerentes a cada um desses momentos. Tudo começa a ter um cheiro de despedida. Sim, existe esse cheiro. Um aroma estranho que tem o poder de nos secar a boca, esvaziar o olhar e apertar o coração.

E ali estamos nós com os nossos pais que agora voltaram a ser bebés. Mas são uns bebés muito especiais. Eles não acabaram de chegar. Eles estão a preparar a partida. Seja lá para onde for, será uma partida. E nós? Nós estaremos preparados para este papel que também faz parte do palco da nossa vida? Ser pais dos nossos pais? Estamos?

Não, não estamos. Não existe curso algum, por mais intensivo que seja, nem em lugar algum da terra que nos prepare para isso. Somos nós quem tem de saber encarar a situação. Uma situação delicada, mas muito, muito especial. Não é o retribuir do que recebemos. É muito, mas muito além disso. É dar o nosso amor incondicional. Sob as mais variadas formas. Seja em carinho ou o assegurar que nada lhes vai faltar. A memória pode-lhes já falhar, podem já nem reconhecer o filho que geraram, mas esse filho assegurar-se-à que receberão muito amor, mesmo que para eles este não passe de um estranho.

Nos tempos de hoje este papel é desempenhado cada vez mais cedo. Pois os filhos chegam cada vez mais tarde. Apesar de na minha geração ainda não ser bem assim, já fui chamada a esse papel no palco da vida.

Não é uma obrigação, é um compromisso para comigo. O amor incondicional que lhe tenho não permite que exista qualquer outra forma de encarar a situação. Pode já não me reconhecer. Pode já se ter esquecido de tudo que passámos juntas. Mas farei questão de lhe recordar que a amo. Que a amo incondicionalmente. Pode esquecer no segundo seguinte, mas naquele segundo, percebeu, e esboçou um sorriso. E esse sorriso, encheu-me a alma e o coração. E isso basta-me.

Sem medos. Acredito que as forças superiores, sejam elas quem forem, se encarregarão de colocar tudo no sítio certo, na hora exacta. Tudo faz parte desta nossa obra de arte. E nesta obra, não há acasos nem coincidências. Tudo tem uma razão de ser. E se assim é, a nossa função é aceitar, apesar de nos poder causar a maior revolta. Deveremos lutar sempre por aquilo em que acreditamos. No pior cenário, há sempre algo pelo que lutar. No desfecho dessa peça no palco da vida, temos de sair tranquilos, por ter lutado pelo que acreditávamos, e de coração cheio, porque o fizemos com amor.

Temos de ser racionais. Por maior que seja o nosso amor, temos de apelar à racionalidade. Sem melodrama. Por maior que seja essa dor, o amor tem de suplantar tudo.

Mãe, apesar de já teres realizado uma longa caminhada, quero que saibas que vamos continuar a percorrê-la juntas, de cabeça erguida e com toda a dignidade merecida. Continuando a festejar cada momento, cada dia, cada tua pequena grande vitória. Sim, és uma guerreira! Nunca duvidei disso, e tens dado a cada dia que passa, mais provas disso mesmo.

Admiro a tua força de viver!
Vamos honrar essa força!
Vamos festejar a tua vida!
Vamos celebrar o nosso amor!

Margarida


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