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A CARTA

Ela, incrédula, olhava o envelope em suas mãos.
Tão fora de moda receber cartas!
Sentou-se na poltrona e ficou a alisar aquele papel.
Não sabia o que pensar,
Mil coisas lhe surgiam e logo fugiam.
Abrir e ler, ou rasgar deixando só a imaginação saber
Virava-a de um lado para o outro.
Como cara ou coroa
Ora via seu nome, ora via o outro.
Suas pernas já adormecidas pelo tempo ali sentada
Fizeram-lhe acordar daquele estado catatônico.
Ergue-a contra a luz que vinha da janela
Certificando-se que Havia só um pedaço de papel.
Nada além de um pedaço de papel
Com alguns rabiscos em forma de letras.
Vagarosamente, rasgou a lateral
E, ainda em dúvida, não sabia o que fazer.
Ainda havia tempo para picá-la e jogar no lixo.
Ainda havia tempo para deixá-la esquecida ao lado
Ainda havia tempo para desvendar o desconhecido.
Enfim, encheu-se de coragem e retirou as folhas
Eram duas. Não manuscritas.
Que paradoxo, mandar carta, escrita no computador!
Deu vontade de rir, mas pareceria irônico de sua parte.
As folhas cuidadosamente dobradas em três,
Foram abertas e olhadas sem que visse as palavras.
Deitou-as em seu colo,
Jogou a cabeça para trás
Reviveu tempos já esquecidos
Turvou seus olhos impedindo todo tipo de lembrança.
Depois se lembrou da promessa que fizera a si mesma:
De nunca mais permitir-se ser magoada.
De nunca mais deixar de lutar com garra
Pelas suas verdades, suas convicções.
Ergueu a carta e começou a lê-la.
Era um desabafo.
Tanto ódio, tanto rancor, tantas mentiras
Por que havia perdido tempo para escrever-lhe aquilo?
Deu-lhe pena!
Alguém há quilômetros de distância,
Perdera, talvez horas, para escrever-lhe
Coisas ignóbeis, coisas cheias de maledicências.
Seria uma Necessidade visceral de atingi-la?
Uma necessidade de livrar-se do mal que lhe envolvia
Desde o dia em que a humilhou, maltratou, magoou
Sem que nenhum motivo real houvesse.
Seria essa culpa que lhe fizera ditar aquelas palavras?
Teve piedade, onde um dia houvera amor.
Já não a atingia mais.
Enquanto ele vivia o inferno do remorso
Ela, agora, vivia a luz da paz de espírito.
Não se culpava mais, não procurava erros não cometidos,
Por muito tempo chorou a injustiça sofrida.
As mentiras ditas e repetidas.
A dor, de tantos anos de verdades virarem pó.
A necessidade, invejosa, de destruí-la.
Passou por tudo isso.
Caiu e levantou-se inúmeras vezes.
Soltou gritos assustadores, em completo silencio.
Brigou com Deus.
Amaldiçoou.
Passeava entre a raiva e a ira.
Mas tudo já passara.
Fora feliz.
Fora invejada.
Fora injuriada.
Fora massacrada.
Mas tudo, fora.
Assim essa carta inesperada,
Só lhe lembrava que vencera.
Quem a lhe escrevera ainda sentia a necessidade de feri-la.
Mas já não era capaz.
Perdera toda a sua força
No momento em que duvidara
Do seu amor, seu companheirismo
Das suas verdades, para crer em outras verdades
Que na verdade, não eram verdades.
Assim como uma bola de ar
Explodiu com a agulha da ingratidão.
E nunca mais poderia encher-se de ar.
Com pesar, amassou as folhas
Levantou-se da poltrona
E jogou a no lixo, junto com outros restos.


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