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TRF4. PREVIDENCIÁRIO. TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL. AVERBAÇÃO. SENTENÇA ULTRA PETITA. NULIDADE PARCIAL.

Ementa para citação:

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. TEMPO DE SERVIÇO Especial. AVERBAÇÃO. SENTENÇA ULTRA PETITA. NULIDADE PARCIAL.
1. Deve ser declarada a nulidade parcial da sentença que viola os artigos 141, 490 e 492 do NCPC e contém julgamento divorciado da pretensão formulada pela parte ou aquém do pedido.
2. Não obstante o Decreto nº 2.172/97 não tenha incluído em seu rol de agentes nocivos a eletricidade, é possível o enquadramento da atividade como especial no período posterior a 05/03/1997, se comprovado através de perícia que o trabalhador estava exposto a tensões superiores a 250 volts. Interpretação conjugada do Decreto nº 53.831/64 (Código 1.1.8 do Quadro Anexo) com a Súmula nº 198 do TFR. Orientação assentada no julgamento do Recurso Especial Repetitivo nº 1.306.113. Cabe ainda destacar que o tempo de exposição ao risco eletricidade não é necessariamente fator condicionante para que ocorra um acidente ou choque elétrico. Assim, por mais que a exposição do segurado ao agente nocivo eletricidade acima de 250 volts (alta tensão) não perdure por todas as horas trabalhadas, trata-se de risco potencial, cuja sujeição não depende da exposição habitual e permanente. A exposição do segurado ao agente periculoso eletricidade sempre caracteriza a atividade como especial, independentemente da utilização ou não de EPI ou de menção, em laudo pericial, à neutralização de seus efeitos nocivos.
3. As disposições da Lei nº 7.369/85, revogada pela Lei nº 12.740/12, por versar sobre matéria de natureza trabalhista, não se aplicam para fins de concessão de aposentadoria especial.
(TRF4, AC 5010478-87.2016.4.04.7205, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SC, Relator PAULO AFONSO BRUM VAZ, juntado aos autos em 08/10/2018)


INTEIRO TEOR

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5010478-87.2016.4.04.7205/SC

RELATOR: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ

APELANTE: ALEXANDRE COSTA (AUTOR)

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS (RÉU)

APELADO: OS MESMOS

RELATÓRIO

Trata-se de apelação cível interposta contra sentença, publicada em 05/06/2017, que julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados pela parte autora na inicial, nos seguintes termos (evento 17):

 

a) reconhecer o exercício de atividade especial, pela parte autora, no período de 06.03.1997 a 06.07.2015;

b) condenar o INSS a:

b.1) conceder o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição ao autor (NB 174.534.104-5), com fulcro no art. 57 da Lei n.º 8.213/91, desde a data do requerimento administrativo (01 SET 2015), com RMI equivalente a 100% (cem por cento) do salário-de-benefício, tendo em vista a apuração de 38 anos, 3 meses e 22 dias de tempo decontribuição na DER, ocasião em que já preenchia os requisitos legais para a concessão do benefício; ou, se mais vantajoso, conceder o benefício de aposentadoria especial tendo em vista que apurados 27 anos, 3 meses e 3 dias de tempo de atividade especial até a DER (01 SET 2015).

b.2) pagar à parte autora as diferenças vencidas entre a data de entrada do requerimento e a data do trânsito em julgado desta sentença, corrigidas monetariamente e acrescidas de juros de mora nos termos da fundamentação.

Custas isentas. Condeno o réu ao pagamento de honorários advocatícios do patrono da parte autora, os quais fixo no percentual mínimo previsto nos incisos I a V do § 3º do art. 85 do CPC sobre o valor da condenação, consideradas as parcelas vencidas do benefício até a prolação da sentença (Súmula 111 do STJ), devendo a parte fazer o devido enquadramento após apurar o montante devido, nos termos do art. 85, § 4º, II e IV, e § 5º, do CPC.

 

Em suas razões recursais, a parte autora alega que é ultra petita o julgado, porquanto o pedido formulado na inicial limitou-se ao reconhecimento do tempo de serviço prestado em condiçõs especiais e sua consequente averbação pela autarquia, para fins de futura aposentadoria, não tendo sido requerida a concessão de nenhum benefício. Assim, pretende apenas a averbação dos intervalos cuja especialidade foi declarada no decisum, com a possibilidade de conversão, em tempo comum, pelo fator multiplicador 1,40 (evento 21).

 

Por sua vez, o órgão previdenciário investe contra o deferimento do benefício à parte autora, sob os seguintes argumentos: (a) após o advento do Decreto nº 2.172/97 não é possível o enquadramento da atividade como especial pela sujeição do trabalhador à eletricidade; (b) a atividade periculosa não configura risco à integridade física ou à saúde do trabalhador, de forma que não enseja a concessão da aposentadoria especial; (c) a nocividade do labor foi neutralizada pela utilização de EPIs eficazes; e (d) a Lei nº 7.369/85 foi revogada pela Lei nº 12.740/12, de modo que não se admite o cômputo do tempo especial em razão da eletricidade após 08/12/2012. Requer, para fins de incidência de correção monetária e juros de mora, a adoção da sistemática prevista no art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/09. Prequestiona afronta à matéria (evento 22).

 

Com contrarrazões (evento 28), foram os autos remetidos a esta Corte para julgamento do recurso.

 

É o relatório.

VOTO

Julgamento ultra petita

 

Na inicial, o autor requereu a procedência do pedido a fim de que fosse reconhecido o exercício da atividades nocivas no lapso de 06/03/1997 a 06/07/2015.

 

Todavia, o magistrado singular, ao julgar parcialmente procedente a pretensão da parte autora, além de reputar comprovado o exercício de atividades nocivas no período visado, por estarem, efetivamente, preenchidos os requisitos legais, reconheceu o seu direito à concessão tanto da aposentadoria por tempo de contribuição integral como da aposentadoria especial, em qualquer caso, a contar da DER (01/09/2015), condenando a autarquia, ainda, a pagar os valores em atraso desde então, acrescidos de correção monetária e juros de mora. Tal postulação, de fato, não estava abrangida na exordial, de natureza meramente declaratória.

 

Assim, incorreu o sentenciante em julgamento ultra petita, por afronta ao princípio do dispositivo, consubstanciado nos artigos 141, 490 e 492 do NCPC, que caracteriza questão de ordem pública, a ser reconhecida de ofício, implicando nulidade da sentença, por vício in procedendo, com a determinação de que outra seja proferida.

 

Em caso análogo, esta Corte já decidiu que É nula a sentença que viola os artigos 141, 490 e 492 do NCPC e contém julgamento divorciado da pretensão formulada pela parte ou aquém do pedido. (TRF4 nº 5003388-26.2010.404.7112, Relator Des. Federal Paulo Afonso Brum Vaz, Quinta Turma, juntado aos autos em 21/06/2016). Com efeito, Os decisórios proferidos em desacordo com o princípio do dispositivo – vale dizer, citra, extra ou ultra petita – traduzem error in procedendo, constituindo questão de ordem pública, sanável em qualquer instância processual, passível, portanto, de anulação da sentença. (TRF4 5005800-62.2012.404.7110, Relator Des. Federal João Batista Pinto Silveira, Sexta Turma, juntado aos autos em 02/06/2016).

 

A este respeito, assentou-se na jurisprudência pátria a orientação de que se trata, porém, de nulidade parcial, e não absoluta, cabendo ao Tribunal, quando possível, no caso da sentença ultra petita, reformá-la para aparar a parte em que extrapolou os limites da lide, ainda que a parte prejudicada não o tenha requerido.

 

Dito isso, a questão controvertida nos autos cinge-se à nocividade do labor prestado pela parte autora no intervalo de 06/03/1997 a 06/07/2015, devendo ser anulada a sentença no tópico referente ao deferimento da aposentadoria, prejudicado, portanto, o recurso do INSS no que diz respeito aos consectários.

 

Atividade urbana especial

 

Trata-se de demanda previdenciária destinada ao reconhecimento do tempo de serviço prestado sob condições especiais, com a consequente concessão de APOSENTADORIA ESPECIAL, regulamentada no artigo 57 da Lei nº 8.213/91, ou, mediante a conversão daquele(s) interregno(s) para comum, com a concessão de APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO, prevista nos artigos 52 e 53, I e II, da Lei de Benefícios e artigo 9º, § 1º, I, “a” e “b”, da Emenda Constitucional nº 20, de 1998.

 

A natureza da atividade é qualificada pela lei vigente à época da prestação do serviço, sem aplicação retroativa de norma ulterior que nesse sentido não haja disposto (RE nº 174.150-3/RJ, Relator Ministro Octávio Gallotti, DJ 18/08/2000). Também por força do princípio tempus regit actum, o modo de comprovação da atividade especial é orientado pela lei vigente ao tempo da prestação do serviço. A partir dessa premissa geral, articulam-se as seguintes diretrizes para o presente julgado:

 

a) Para as atividades exercidas até 28/04/1995, véspera da vigência da Lei nº 9.032/95, é possível o reconhecimento do tempo de atividade especial pelo pertencimento à determinada categoria profissional ou pela exposição aos agentes nocivos, nos termos previstos pelos decretos regulamentares. Por outro lado, em razão do caráter protetivo ao trabalhador, é de ser reconhecida a natureza qualificada da atividade ainda que as condições que prejudicam sua saúde ou integridade física não se encontrem expressas em determinado regulamento (inteligência da Súmula nº 198 do extinto TFR).

b) Após a vigência da Lei nº 9.032/95, em 29/04/1995, a concessão da aposentadoria especial pressupõe a comprovação, pelo segurado, do tempo de trabalho permanente, não ocasional nem intermitente, em condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física (Lei nº 8.213/91, art. 57, § 3º). Sem embargo, para a caracterização da especialidade não se reclama exposição às condições insalubres durante todos os momentos da prática laboral, sendo suficiente que o trabalhador, em cada dia de labor, esteja exposto a agentes nocivos em período razoável da jornada (salvo exceções, v.g., periculosidade) (TRF4, EINF nº 0010314-72.2009.404.7200, Terceira Seção, Relator Des. Federal Celso Kipper, D.E. 07/11/2011).

c) Para as atividades desempenhadas a partir de 06/03/1997, com a vigência do Decreto nº 2.172, a comprovação da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos se dá mediante formulário, emitido pela empresa ou seu preposto, com base em laudo técnico de condições ambientais do trabalho, expedido por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho (Lei nº 8.213/91, art. 58, § 1º) (TRF4, AC nº 2002.71.07.001611-3, Quinta Turma, Relator Des. Federal Celso Kipper, D.E. 07/07/2008).

d) Em relação aos agentes nocivos físicos ruído, frio e calor, é necessária a apresentação de laudo técnico independentemente do período de prestação da atividade, dada a necessidade de medição da intensidade desses agentes nocivos. De qualquer modo, a partir de 01/01/2004, é suficiente a apresentação de Perfil Profissiográfico Previdenciário – PPP, elaborado conforme as exigências legais (TRF4, EINF nº 0010314-72.2009.404.7200, Terceira Seção, Relator Des. Federal Celso Kipper, D.E. 07/11/2011).

e) A extemporaneidade do laudo pericial não lhe retira a força probatória, em face da presunção de conservação do anterior estado de coisas, que deve operar desde que não evidenciada a alteração das condições de trabalho. A rigor, dada a evolução das normas de proteção ao trabalhador e em face das inovações tecnológicas, é plausível a tese de que, à época da prestação do serviço, as condições ambientais eram ainda mais ofensivas à saúde do trabalhador (TRF4, EINF 0031711-50.2005.404.7000, Terceira Seção, Relator Des. Federal Luiz Carlos de Castro Lugon, D.E. 08/08/2013).

f) O limite de tolerância para ruído é de 80 dB(A) até 05/03/1997; 90 dB(A) de 06/03/1997 a 18/11/2003; e 85 dB(A) a partir de 19/11/2003 (STJ, RESP nº 1.398.260/PR, Relator Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, j. 14/05/2014, DJe 05/12/2014, julgamento proferido de acordo com a sistemática de representativo de controvérsia – CPC, art. 543-C).

g) Quanto aos efeitos da utilização do equipamento de proteção individual, se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade não haverá respaldo constitucional à aposentadoria especial. Todavia, na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual – EPI, não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria (ARE nº 664.335, Relator Ministro Luiz Fux, Tribunal Pleno, j. 04/12/2014, DJ 12/02/2015). Deve-se observar, contudo, que a adoção de EPI não deve ser considerada para fins de caracterização da atividade especial em tempo anterior a 03/12/1998, visto que esta exigência apenas foi disposta pela MP nº 1.729/98, convertida na Lei nº 9.732/89 (IN INSS/PRES nº 77/2015, art. 279, §6º).

h) A lei vigente por ocasião da aposentadoria é a aplicável ao direito à conversão entre tempos de serviço especial e comum, independentemente do regime jurídico vigente à época da prestação do serviço (STJ, EDcl no RESP nº 1.310.034/PR, Relator Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, j. 26/11/2014, DJ 02/02/2015, julgamento proferido de acordo com a sistemática de representativo de controvérsia – CPC, art. 543-C). Dessa forma, é possível a conversão do tempo especial em comum mesmo para as atividades exercidas anteriormente à vigência da Lei nº 6.887/80, ao passo que a conversão do tempo comum em especial é apenas possível para o segurado que cumpriu os requisitos para aposentadoria especial até a vigência da Lei nº 9.032/95. O Egrégio STJ firmou entendimento, em recurso repetitivo representativo de controvérsia (RESP nº 1.151.363), que é possível a conversão de tempo de serviço especial em comum mesmo após 1998, já que a última reedição da MP nº 1.663, parcialmente convertida na Lei nº 9.711/98, suprimiu a parte do texto das edições anteriores que revogava o § 5º do art. 57 da Lei nº 8.213/91.

i) Segundo pacífica jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (ED no RE 567360, Rel. Ministro Celso de Mello, Segunda Turma, DJe de 06-08-2009; RE nº 262082, Rel. Ministro Sepúlveda Pertence, Primeira Turma, DJ de 18-05-2001), em matéria previdenciária, para a análise das condições da inativação, a lei de regência é aquela vigente no tempo em que implementados os requisitos legais para a concessão do benefício, consoante o princípio tempus regit actum. Assim, nos casos em que os requisitos para a aposentadoria se perfectibilizaram sob a égide da legislação anterior, quando vigia o Decreto 83.080, de 24-01-1979, o fator de conversão a ser aplicado é 1,2. No entanto, quando os requisitos da aposentadoria forem implementados durante a vigência da Lei nº 8.213, de 24-07-1991, que prevê o fator de conversão 1,4, este é o fator a ser aplicado em todo o período laboral.

 

Exame do tempo especial no caso concreto

 

Na espécie, estas são as condições da prestação de serviço do autor:

 

Período: 06/03/1997 a 06/07/2015

Empresa: Celesc Distribuição S.A.

Atividade(s)/função(ões): engenheiro eletricista

Agente nocivo: eletricidade com tensões acima de 250 volts

Enquadramento legal: Código 1.1.8 do Quadro Anexo ao Decreto nº 53.831/64 conjugado com a Súmula nº 198 do TRF e NR nº 16 do MTB, anexo IV.

Provas: formulário PPP (evento 01, PROCADM4, pp. 26-28) e LTCAT (evento 01, PROCADM4, pp. 29-31).

Conclusão: mantida a sentença, pois possível reconhecer a periculosidade do labor no período acima indicado, conforme a legislação aplicável à espécie, em virtude do risco decorrente da exposição da parte autora ao agente físico eletricidade.

 

O Recorrente insurge-se contra o deferimento do benefício à parte autora ao argumento de que, com o advento do Decreto nº 2.172/97, a periculosidade e a penosidade deixaram de figurar no rol de agentes nocivos a justificar a concessão de aposentadoria especial.

 

A atividade do eletricitário constava como perigosa no Código 1.1.8 do Quadro Anexo do Decreto nº 53.831/64, envolvendo as operações em locais com eletricidade em condições de perigo de vida; trabalhos permanentes em instalações ou equipamentos elétricos com risco de acidentes, pelos eletricistas, cabistas, montadores, dentre outros, cuja jornada normal ou especial fixada em lei para os serviços expostos a tensão superior a 250 volts, caracterizando, assim, a especialidade do trabalho.

 

De fato, os Decretos nºs 83.080/79 (Anexo II), 2.172/97 (Anexo IV) e 3.048/99 (Anexo IV) não contemplaram tal descrição. Ocorre que, além das hipóteses de enquadramento dos agentes nocivos conforme previsão nos decretos regulamentares, sempre possível também a verificação da especialidade da atividade no caso concreto, através de perícia técnica confirmatória da condição insalutífera, por força da Súmula nº 198 do extinto Tribunal Federal de Recursos.

 

Acerca da celeuma, o Superior Tribunal de Justiça, em recurso repetitivo, reconheceu a possibilidade de reconhecimento, como especial, do tempo de serviço em que o segurado esteve exposto à tensão elétrica superior a 250 volts, por entender que, À luz da interpretação sistemática, as normas regulamentadoras que estabelecem os casos de agentes e atividades nocivos à saúde do trabalhador são exemplificativas, podendo ser tido como distinto o labor que a técnica médica e a legislação correlata considerarem como prejudiciais ao obreiro, desde que o trabalho seja permanente, não ocasional, nem intermitente, em condições especiais (art. 57, § 3º, da Lei 8.213/1991) (RESP nº 1.306.113, Relator Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, DJE 07/03/2013).

 

Logo, a exposição do trabalhador à tensão média superior a 250 volts, após 05/03/1997, autoriza a caracterização da atividade como especial.

 

A nocividade do trabalho não foi neutralizada pelo uso de EPIs. A um, porque a utilização de equipamentos de proteção individual é irrelevante para o reconhecimento das condições especiais, prejudiciais à saúde ou à integridade física do trabalhador, da atividade exercida no período anterior a 03 de dezembro de 1998, conforme já referido. A dois, porque o Supremo Tribunal Federal, em regime de repercussão geral, deixou assentado que O direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo à sua saúde, de modo que, se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade não haverá respaldo constitucional à aposentadoria especial (ARE nº 664.335, Tribunal Pleno, Relator Ministro Luiz Fux, DJE 12/02/2015). Todavia, o simples fornecimento do EPI pelo empregador não exclui a hipótese de exposição do trabalhador aos agentes nocivos à saúde. É preciso que, no caso concreto, estejam demonstradas a existência de controle e peridiocidade do fornecimento dos equipamentos, a sua real eficácia na neutralização da insalubridade ou, ainda, que o respectivo uso era, de fato, obrigatório e continuamente fiscalizado pelo empregador. Tal interpetração, aliás, encontra respaldo no próprio regramento administrativo do INSS, conforme se infere da leitura do art. 279, § 6º, da Instrução Normativa nº 77/2015, mantida, neste item, pela subsequente IN nº 85/2016, in verbis:

 

Art. 279. Os procedimentos técnicos de levantamento ambiental, ressalvadas as disposições em contrário, deverão considerar:

(…)

§ 6º Somente será considerada a adoção de Equipamento de Proteção Individual – EPI em demonstrações ambientais emitidas a partir de 3 de dezembro de 1998, data da publicação da MP nº 1.729, de 2 de dezembro de 1998, convertida na Lei nº 9.732, de 11 de dezembro de 1998, e desde que comprovadamente elimine ou neutralize a nocividade e seja respeitado o disposto na NR-06 do MTE, havendo ainda necessidade de que seja assegurada e devidamente registrada pela empresa, no PPP, a observância:

I – da hierarquia estabelecida no item 9.3.5.4 da NR-09 do MTE, ou seja, medidas de proteção coletiva, medidas de caráter administrativo ou de organização do trabalho e utilização de EPI, nesta ordem, admitindo-se a utilização de EPI somente em situações de inviabilidade técnica, insuficiência ou interinidade à implementação do EPC ou, ainda, em caráter complementar ou emergencial;

II – das condições de funcionamento e do uso ininterrupto do EPI ao longo do tempo, conforme especificação técnica do fabricante, ajustada às condições de campo;

III – do prazo de validade, conforme Certificado de Aprovação do MTE;

IV – da periodicidade de troca definida pelos programas ambientais, comprovada mediante recibo assinado pelo usuário em época própria; e

V – da higienização.

 

Na situação em apreço, nenhuma das condições acima referidas restou devidamente comprovada, ressaltando-se que foi juntado aos autos laudo pericial da empresa, no qual, embora haja menção sobre o fornecimento de EPIs e EPCs aos trabalhadores, o expert foi categórico ao reconhecer a periculosidade da atividade, do que se infere que não foram eficazes para neutralizar a nocividade do labor (evento 01, PROCADM4, pp. 29-31). O perito foi categórico ao afirmar que:

 

Os equipamentos de proteção individual (EPI) não eliminam os riscos de choque elétrico, face à possibilidade de contato acidental de outras partes do corpo com pontos energizados, bem como, de descargas elétricas provocadas pela alta tensão. Estes atenuam os riscos de acidente elétrico pelo isolamento do empregados as partes vivas.”

 

Ademais, esta Corte já decidiu que a exposição do segurado ao agente periculoso eletricidade sempre caracteriza a atividade como especial, independentemente da utilização ou não de EPI ou de menção, em laudo pericial, à neutralização de seus efeitos nocivos. (APELREEX nº 5003826-50.2013.404.7208, Relator Des. Federal João Batista Pinto Silveira, Sexta Turma, D.E. 10/07/2015).

 

Ao contrário do que alega o Recorrente, as disposições da Lei nº 7.369/85, revogada pela Lei nº 12.740/12, por versar sobre matéria de natureza trabalhista, não se aplicam ao caso em tela. Em caso análogo, este Regional já se manifestou no sentido de que O enquadramento em atividade especial, para fins previdenciários, não coincide com os requisitos para a concessão de adicionais trabalhistas (insalubridade, periculosidade). A legislação previdenciária tem requisitos próprios, os quais não se confundem com os exigidos pela legislação trabalhista. (APELREEX nº 5064235-59.2012.404.7100, Sexta Turma, Relatora Des. Federal Salise Monteiro Sanchotene, juntado aos autos em 20/10/2016).

 

De mais a mais, cumpre esclarecer que a Lei nº 12.740/12, ao alterar a redação do art. 193 da CLT, não deixou de prever a exposição à energia elétrica como agente danoso à saúde do trabalhador, in verbis:

 

“Art. 193. São consideradas atividades ou operações perigosas, na forma da regulamentação aprovada pelo Ministério do Trabalho e Emprego, aquelas que, por sua natureza ou métodos de trabalho, impliquem risco acentuado em virtude de exposição permanente do trabalhador a:

I – inflamáveis, explosivos ou energia elétrica;

II – roubos ou outras espécies de violência física nas atividades profissionais de segurança pessoal ou patrimonial.”

 

Na verdade, a Lei nº 12.740/12, além de incluir no rol de atividades perigosas aquela empreendida por profissionais de segurança patrimonial e vigilância, alterou a base de cálculo do adicional devido aos trabalhadores expostos aos riscos de energia elétrica. Com a revogação expressa da Lei nº 7.369/85 também foi revogado o Decreto nº 93.412/86 que a regulamentava, passando, assim, a CLT a disciplinar a periculosidade diante do risco de energia elétrica.

 

E, ao elencar apenas a “energia elétrica” (inciso I), a nova redação do art. 193 da CLT ampliou a abrangência de profissionais que têm direito à percepção do adicional de periculosidade em decorrência dessa exposição, encontrando-se a matéria disciplinada pelo Anexo IV da NR 16 do MTB, aprovado pela Portaria nº 1.078, de 16/07/2014.

 

Da suposta ausência de contribuição adicional como óbice ao reconhecimento da atividade especial. A inexistência de correlação com o princípio da precedência do custeio (CF/88, art. 195, §5º)

 

É absolutamente inadequado aferir-se a existência de um direito previdenciário a partir da forma como resta formalizada determinada obrigação fiscal por parte da empresa empregadora. Pouco importa, em verdade, se a empresa entendeu ou não caracterizada determinada atividade como especial. A realidade precede à forma. Se os elementos técnicos contidos nos autos demonstram a natureza especial da atividade, não guardam relevância a informação da atividade na GFIP ou a ausência de recolhimento da contribuição adicional por parte da empresa empregadora.

 

O que importa é que a atividade é, na realidade, especial. Abre-se ao Fisco, diante de tal identificação, a adoção das providências relativas à arrecadação das contribuições que entender devidas. O raciocínio é análogo às situações de trabalho informal pelo segurado empregado (sem anotação em carteira ou sem recolhimento das contribuições previdenciárias). A discrepância entre a realidade e o fiel cumprimento das obrigações fiscais não implicará, jamais, a negação da realidade, mas um ponto de partida para os procedimentos de arrecadação fiscal e imposição de penalidades correspondentes.

 

De outro lado, consubstancia grave equívoco hermenêutico condicionar-se o reconhecimento de um direito previdenciário à existência de uma específica contribuição previdenciária. Mais precisamente, inadequada é a compreensão que condiciona o reconhecimento da atividade especial às hipóteses que fazem incidir previsão normativa específica de recolhimento de contribuição adicional (art. 57, §§ 6º e 7º, da Lei nº 8.213/91). E a ausência de contribuição específica não guarda relação alguma com o princípio da precedência do custeio (CF/88, art. 195, §5º).

 

Note-se, quanto ao particular, que a contribuição adicional apenas foi instituída pela Lei 9.732/98, quase quatro décadas após a instituição da aposentadoria especial pela Lei 3.807/60. Além disso, as empresas submetidas ao regime simplificado de tributação (SIMPLES), como se sabe, não estão sujeitas ao recolhimento da contribuição adicional e essa condição não propicia sequer cogitação de que seus empregados não façam jus à proteção previdenciária diferenciada ou de que a concessão de aposentadoria especial a eles violaria o princípio constitucional da precedência do custeio. E isso pelo simples motivo de que ela decorre, dita proteção à saúde do trabalhador, da realidade das coisas vis a vis a legislação protetiva – compreendida desde uma perspectiva constitucional atenta à eficácia vinculante dos direitos fundamentais sociais. O que faz disparar a proteção previdenciária é a realidade de ofensa à saúde do trabalhador, verificada no caso concreto, e não a existência de uma determinada regra de custeio. Deve-se, aqui também, prestigiar a realidade e a necessidade da proteção social correlata, de modo que a suposta omissão ou inércia do legislador, quanto à necessidade de uma contribuição específica, não implica a conclusão de que a proteção social, plenamente justificável, estaria a violar o princípio da precedência do custeio.

 

Conclusão quanto ao tempo de atividade especial

 

Possível o reconhecimento da nocividade do labor prestado no período de 06/03/1997 a 06/07/2015.

 

Conforme os pedidos formulados na inicial e nas razões recursais, não obstante preenchidos os requisitos para a concessão da aposentadoria por tempo de contribuição e para a aposentadoria especial, nos exatos termos da sentença, o período reconhecido nos autos deverá ser averbado pelo INSS como tempo de serviço especial, com a possibilidade de conversão em tempo comum, para fins de futuro deferimento de benefício previdenciário à parte autora.

 

Honorários advocatícios recursais

 

Incide, no caso, a sistemática de fixação de honorários advocatícios prevista no art. 85 do NCPC, porquanto a sentença foi proferida após 18/03/2016 (data da vigência do NCPC definida pelo Pleno do STJ em 02/04/2016).

 

Aplica-se, portanto, em razão da atuação do advogado da parte em sede de apelação, o comando do §11 do referido artigo, que determina a majoração dos honorários fixados anteriormente, pelo trabalho adicional realizado em grau recursal, observando, conforme o caso, o disposto nos §§ 2º a 6º e os limites estabelecidos nos §§ 2º e 3º do art. 85.

 

Confirmada a sentença no mérito, majoro a verba honorária, elevando-a de 10% para 15% (quinze por cento) sobre o valor da causa, considerando as variáveis dos incisos I a IV do § 2º do artigo 85 do NCPC.

 

Custas processuais: O INSS é isento do pagamento das custas no Foro Federal (art. 4º, I, da Lei nº 9.289/96) e responde por metade do valor no Estado de Santa Catarina (art. 33, parágrafo único, da Lei Complementar estadual 156/97).

 

Conclusão

Sentença ultra petita. Anulada no tópico referente à concessão do benefício, não requerida na inicial. Recurso da parte autora provido.

Deve ser computado como tempo de serviço especial o período de 06/03/1997 a 06/07/2015.

Não obstante a parte autora preencha os requisitos para a concessão tanto da aposentadoria por tempo de contribuição, como para a aposentadoria especial, nos termos do limite do pedido formulado na exordial, deverá o INSS proceder à averbação do tempo de serviço especial reconhecido para fins de futura concessão de benefício previdenciário. 

Recurso do INSS prejudicado quanto aos consectários e improvido no mérito. Possibilidade de enquadramento da atividade como especial pela sua periculosidade, mesmo após o advento do Decreto nº 2.172/97. A ausência de recolhimento de contribuição adicional a que se refere o art. 57, §§ 6º e 7º, da Lei nº 8.213/91 não se constitui em óbice à concessão da aposentadoria especial. As disposições da Lei nº 7.369/85, revogada pela Lei nº 12.740/12, por versar sobre matéria de natureza trabalhista, não se aplicam para fins de aposentadoria especial.

 

DISPOSITIVO

Pelo exposto, voto por julgar prejudicado, em parte, o recurso do INSS e, nesta extensão, negar-lhe provimento, dar provimento à apelação da parte autora, para declarar a nulidade parcial da sentença ultra petita, a teor dos arts. 141, 490 e 492 do NCPC.


Documento eletrônico assinado por PAULO AFONSO BRUM VAZ, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40000636688v6 e do código CRC e69c47d8.

Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): PAULO AFONSO BRUM VAZ
Data e Hora: 8/10/2018, às 18:57:1

 


5010478-87.2016.4.04.7205
40000636688
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Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5010478-87.2016.4.04.7205/SC

RELATOR: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ

APELANTE: ALEXANDRE COSTA (AUTOR)

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS (RÉU)

APELADO: OS MESMOS

EMENTA

PREVIDENCIÁRIO. tempo de serviço especial. averbação. SENTENÇA ULTRA PETITA. NULIDADE PARCIAL.

1. Deve ser declarada a nulidade parcial da sentença que viola os artigos 141, 490 e 492 do NCPC e contém julgamento divorciado da pretensão formulada pela parte ou aquém do pedido.

2. Não obstante o Decreto nº 2.172/97 não tenha incluído em seu rol de agentes nocivos a eletricidade, é possível o enquadramento da atividade como especial no período posterior a 05/03/1997, se comprovado através de perícia que o trabalhador estava exposto a tensões superiores a 250 volts. Interpretação conjugada do Decreto nº 53.831/64 (Código 1.1.8 do Quadro Anexo) com a Súmula nº 198 do TFR. Orientação assentada no julgamento do Recurso Especial Repetitivo nº 1.306.113. Cabe ainda destacar que o tempo de exposição ao risco eletricidade não é necessariamente fator condicionante para que ocorra um acidente ou choque elétrico. Assim, por mais que a exposição do segurado ao agente nocivo eletricidade acima de 250 volts (alta tensão) não perdure por todas as horas trabalhadas, trata-se de risco potencial, cuja sujeição não depende da exposição habitual e permanente. A exposição do segurado ao agente periculoso eletricidade sempre caracteriza a atividade como especial, independentemente da utilização ou não de EPI ou de menção, em laudo pericial, à neutralização de seus efeitos nocivos.

3. As disposições da Lei nº 7.369/85, revogada pela Lei nº 12.740/12, por versar sobre matéria de natureza trabalhista, não se aplicam para fins de concessão de aposentadoria especial.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia Turma Regional Suplementar de Santa Catarina do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, decidiu julgar prejudicado, em parte, o recurso do INSS e, nesta extensão, negar-lhe provimento, dar provimento à apelação da parte autora, para declarar a nulidade parcial da sentença ultra petita, a teor dos arts. 141, 490 e 492 do NCPC, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Florianópolis, 03 de outubro de 2018.


Documento eletrônico assinado por PAULO AFONSO BRUM VAZ, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40000636689v3 e do código CRC 0b926232.

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TRF4. PREVIDENCIÁRIO. TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL. AVERBAÇÃO. SENTENÇA ULTRA PETITA. NULIDADE PARCIAL.

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